7:12Verão

Fernando Muniz

A luz passa pela cortina; hora de o cavaleiro beijar sua donzela e ganhar o mundo. Embalado pelas promessas de ano novo se posta diante do terraço da estalagem, decidido a mudar de tudo um pouco. Desta vez, vai.

Daquele terraço surge a vila rente ao mar, crianças pontilhando a praia, barcos prenhes com a pesca do dia e moças entregues ao sol, a pino, a reinar onipresente sobre os seus vassalos, impedindo-os de caminhar em linha reta por uma nesga de sombra ou qualquer lufada de brisa.

Tarde que se recusa a causar dor, muito menos tristeza ou sabor amargo, a drenar qualquer estática com seu abraço de preguiça, dissolvendo metas e planos com a cadência das ondas e palmeiras.

O ano novo se esvai pelas calhas do casario, levado por uma chuva relâmpago, e, quanto às promessas, vão-se com a enxurrada, sem que alguém lhes dê falta ou acenda vela. Ao redor da mesa velhos amigos invocam brindes ao calor que os fustiga, embalados pelas lembranças de tudo o de melhor que aconteceu em suas vidas, durante um almoço que não merece ter fim.

Nada mais resta ao cavaleiro senão apear de suas pretensões juvenis. Deixa para trás toda esperança ao cruzar a porta da estalagem, já noite. Volta-se à sua donzela, que o admira sobre a cama em um bronzeado que esconde vergonhas e realça virtudes, belíssima como ninfeta alguma conseguirá ser.

Ali, sem qualquer remorso, despojado de qualquer valentia, reconhece a derrota. E se entrega ao estio.

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