8:42ANDERSON CLAYTON

margarina

Rogério Distéfano

JOÃO DA SILVA FALECEU no dia 8 passado, sepultado em S. José dos Pinhais. Detalhes, no econômico obituário: 80 anos, filho de Salustiano e Maria Roza; funcionário municipal aposentado. Nada sobre viúva e descendentes. Se sérios os estudos sobre casados viverem mais, João deixou viúva ou morreu logo em seguida, de solidão. É o que nos basta saber de João da Silva. Mas há nele algo que me desperta particular simpatia: o nome. Advirto que nenhum nome tem virtudes ou defeitos de per si. Assim fosse, que seriam dos jogadores de futebol?

Os nomes dizem – óbvio – sobre os pais. Confiram neles a profusão de consoantes, simples ou dobradas, os ipsilones, a transiliteração de nomes de artistas de cinema. De frequente denunciam a ânsia de ascensão social, indicada na letra com supostas propriedades heráldicas: é a mãe a insistir que seu filho Noah, a filha Mariah, são Noá ou Maráia, esquecida que em nosso Lácio o ‘h’ só funciona no meio da sílaba. Não me conformo com as Paôlas, pimponas Brasil afora. Mas arrasto vagões pela calipígia Paolla Oliveira,  da bela boca em arco de Cupido.

Como esquecer Edilamar, par ímpar no escurinho do cinema? Lembro Maicourunei, amigo desde criança. João da Silva não mereceu justiça dos pais Salustiano e Maria Roza. Logo Salustiano, nome forte, de presidente do México; Roza com ‘z’, é tão antigo quanto chique na grafia. Então, o que custava pespegar um ‘Júnior’, um ‘Filho’, ao ainda não João? Ou, sendo João, de permeio um Melquisedeque? Conheci dois na escola adventista, que portavam o nome como estandarte da fé. Nada no geral e no particular contra João, santo luminoso; ou os Silva, extenso e tradicional clã luso-brasileiro.

Ser ‘João, sem acompanhamento, ou melhor, seguido da partícula ora neutra, ora pobre, ora nobre, ‘de’ a ligá-lo ao ‘Silva’,  impõe ao portador um tormentoso anonimato e gera inesgotáveis problemas. Nem os Silva do ABC deram-se por satisfeitos e logo apuseram-se o ‘Lula’. Grite João da Silva na fila do INSS, no ponto de ônibus, em comício e sentirá o que é bom para a tosse. Quantos deles não foram presos sem culpa, só pela culpa do João da Silva malaco?  Nem CPF nem RG facilitam a vida dos joões da silva (revisor, é assim mesmo). Mesmo João Ninguém está melhor que João da Silva.

Tive um desses como cliente, na aurora ilusória da advocacia. Ele odiava o nome e não sossegou até mudá-lo. Perguntei-lhe que nome queria incluir entre João e Silva. Vinha do boteco, conhaque rebatido no pão com mistura, “ponha aí João Anderson Clayton da Silva”. De onde tirou, perguntei. “Da lata de margarina”, a resposta – confiram a ilustração. Dia desses cruzamos por acaso. Gasto pela vida me contou, irritado, da imensa comunidade no Orkut: a dos Anderson Clayton. Maicourunei morreu Maicourunei. Para mim, sempre o querido Mickey Rooney.

 

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