10:29MEMÓRIA DO CÁRCERE

Rogério Distéfano

MUITO DIFÍCIL a primeira noite na prisão. A cela gelada, a cama dura – uma enxerga, como se usava nos romances antigos -, o cobertor leve, se é que se podia chamar de cobertor, o silêncio apenas interrompido pela vinda dos guardas a conferir os presos. E a saudade, a dolorosa e funda saudade da mulher, amor de sua vida, cúmplice de tantas confidências. O pior era a dúvida, por que me prenderam, quem me acusa, que crimes cometi? Não bastasse, acusador e juiz impiedosos, cruéis.

A cela, isolada do restante da prisão, ele excluído ao convívio de outros detentos. Na confusão dos pensamentos não sabia se o isolamento vinha ditada pela sua segurança, para poupá-lo da fúria dos demais ou para quebrar sua resistência, fazê-lo confessar crimes que não cometera e dos quais – invocava Deus como testemunha – sabia-se inocente. Se culpado, até então o que fizera não estava detalhado como crime na lei da terra. Sentia-se o cordeiro levado ao sacrifício para purgar culpa de outros.

Mas sacrifício de que, para quem? Na segunda noite sua angústia e solidão foram interrompidas pelos dois toques na parede, seguidos de outros dois, um longo, outro curto. Da cela vizinha o contato, código Morse: Quem é você? Que crime e que pena? O vizinho perdera a noção do tempo, também acusado injustamente, sem pena ou culpa formadas. Lembra ter sido intermediário entre homens de poder. Colhido pela virada da fortuna, apodrecia no cárcere. Queria notícias do mundo exterior.

Ali inicia a intensa, fraterna, enriquecedora amizade. Talvez suas vidas – ou a vida de um deles – renda sagas no cinema, teatro e televisão. Será imortalizado como paradigma da vingança, concebida e servida com frieza, requinte e riqueza de detalhes. Quem são eles? Edmond Dantès, o conde de Monte Cristo, e o Abade Faria, personagens de Alexandre Dumas, uma dezena de versões no cinema, o livro em centenas de edições. Ou vocês pensaram em Eduardo Cunha e Antonio Palocci, também vizinhos de cárcere?

 

 

 

 

conde de Monte Cristo, e o Abade Faria, personagens de Alexandre Dumas, uma dezena de versões no cinema, o livro em centenas de edições. Ou vocês pensaram em Eduardo Cunha e Antonio Palocci, também vizinhos de cárcere?

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