10:01Uma hora com João

pelemasculina

Rogério Distéfano

Nunca o vi mais gordo e não o imaginava tão falante – embora a voz mole e os gestos lânguidos não me fossem desconhecidos como atributo tribal. Chegou-se à mesa do restaurante, atraído por Lídia P., artista famosa, sua conhecida. Até então a conversa rolava solta e agradável, graças a Júlio L., marido de Lídia, narrador talentoso das histórias que viveu. Mas Lídia é daquelas mulheres que atraem gregos, troianos, atenienses, espartanos e residentes na ilha de Safo.

Ninguém escapa ao charme de Lídia. Ele se aboletou, culpa dela, que lhe elogiou a pele sem rugas, macia como traseiro de bebê. Foi o gatilho para contar sua idade, para minha irritação e instantânea má vontade, eu igual no tempo e desigual nas rugas. Contou do creme que espalha no rosto e pescoço, esfoliante, com filtro solar. “Não encontra aqui, tem que trazer de Miami”. Diz que indica o tratamento para seus clientes, a maioria do sexo masculino.

“Sou sexólogo”, respondeu sobre sua profissão. Avancei: urologista? “Não. Urologista só cuida do pinto do João. Eu cuido dos dois: fico uma hora com o João e uma hora com o pinto do João”. Como chegou, partiu, a pele louçã e os gestos lânguidos, beijos em Lídia, aperto de mão caloroso em Júlio, para mim o adeus condescendente e superficial. Entre confuso e perplexo, olhei para Júlio – que sentenciou, enigmático: “Acho que ele está perdendo tempo com o João” 

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