10:40Com Trump presidente, um de seus eleitores não teria nascido

por Ruy Castro

Um amigo meu, filho de brasileiros, mas nascido nos EUA em 1948, cidadão americano e residente a vida inteira na Califórnia, vai votar em Donald Trump. Tento convencê-lo de que, se Trump fosse presidente em 1948, seus pais não teriam se conhecido na casa de Carmen Miranda em Los Angeles, muito menos se casado, e ele não existiria. Por uma razão: com as restrições que Trump acha que se deve impor à imigração, os dois, mulatos, brasileiros e pobres, dificilmente teriam entrado nos EUA.

Houvesse um Trump na Casa Branca em algum momento do século 20, muita gente que contribuiu para o poderio americano, inclusive na área de espetáculos, não teria chegado sequer à Ellis Island, porta de entrada dos EUA para milhões de refugiados da fome e da perseguição religiosa na Europa. Eis alguns.

Os meninos Asa Yoelsen e Israel Baline, foragidos dos pogroms da Rússia nos anos 1890, não teriam se estabelecido na América, adotado os nomes de, respectivamente, Al Jolson e Irving Berlin, e inventado a música americana. Aliás, deve-se a Berlin dois hinos caros aos EUA e que Trump vive cantando em cerimônias: o de Natal, “White Christmas”, e o triunfal “God Bless America”.

Instituições como Fred Astaire, os Irmãos Marx, Frank Sinatra, Johnny “Tarzan” Weissmuller, Rita Hayworth, Kirk Douglas, Jerry Lewis, Dean Martin, Tony Bennett, Stanley Kubrick, Natalie Wood, Raquel Welch são ou eram, todos, americanos de primeira geração. Bastava um parágrafo na lei para que seus pais não tivessem saltado do navio e eles nunca aportassem em Hollywood.

Aliás, nem haveria Hollywood – porque foram judeus europeus como Adolph Zukor, Carl Lemmle, William Fox, Samuel Goldwyn, Louis B. Mayer e os irmãos Warner que a inventaram.

Se Trump ganhar e mandar construir um muro em volta do meu amigo, será bem feito.

*Publicado na Folha de S.Paulo

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