6:37Incidente superado

por Ivan Schmidt 

Em relação aos primórdios do governo interino de Michel Temer, o mínimo que se pode dizer lembra os editoriais de um jornal do interior de Alagoas, nos estertores da Segunda Guerra Mundial, quando estourou a notícia de que Benito Mussolini, o ditador italiano, havia sido preso, torturado e morto por rebeldes juntamente com a amante Clara Petacci, em Milão, onde foram amarrados de cabeça para baixo em praça pública.

A vigilante folha nordestina (foi Graciliano Ramos quem contou a estória) não se fez de rogada e escreveu mais ou menos assim no seu espaço nobre: “Como havíamos advertido tantas e tantas vezes Mussolini quanto às loucuras que vinha cometendo e que elas poderiam ter um fim trágico”… e desandava em lição de moral que malgrado o esforço desinteressado do jornal, não foi levada em consideração pelo fanático líder fascista.

Qualquer cidadão ou cidadã pouquinha coisa versado na política de Pindorama, poderia advertir o presidente (se ele mesmo não soubesse) do risco da nomeação do senador Romero Jucá para o Ministério do Planejamento. Quadro atuante na política há pelo menos 20 anos, Jucá despontou para a vida pública como superintendente da Fundação Nacional do Índio (Funai) e, pouco depois como interventor do território que mais tarde daria lugar ao atual Estado de Roraima.

Eleito senador por Roraima, Jucá não parou mais e basta uma rápida pesquisa para constatar sua vocação para o envolvimento em casos nebulosos que lhe renderam vários processos.

A contumácia do homem em palmilhar caminhos escusos com a desenvoltura de um experimentado ilusionista (foi líder dos governos Sarney, Fernando Henrique, Lula e Dilma Rousseff), acabou desenvolvendo nele um mimetismo poucas vezes visto em outro político brasileiro.

Por mais que se tenha boa vontade é impossível conciliar a ideia de que um político, no caso o senador Romero Jucá, tenha sido brindado por esse inesgotável cabedal de recursos éticos e morais, além de uma práxis política acima de qualquer suspeita, fazendo-o conquistar junto aos pares do Senado da República, a autoridade e o perfeito domínio do fato e, acima de tudo, a segurança regimental para falar em nome de presidentes tão díspares em suas intenções e ações de governança, como foram os citados acima.

Tantas fez o nobre tribuno, de quem jamais se ouviu discurso com algum conteúdo que o aproximasse da aura de estadista, embora fossem recorrentes as notícias sobre conchavos e entendimentos ao pé da orelha, sobretudo no intrincado campo da elaboração e discussão de leis orçamentárias, sua especialidade, que acabou desembarcando na operação Lava Jato, citado que foi mais de uma vez por lobistas, operadores financeiros, ex-diretores da Petrobras ou de empreiteiras contratadas pela maior empresa brasileira para a execução de obras gigantescas, das quais saía o capilé a ser rateado entre figurões do PT, PMDB e demais partidos da aliança governista, como está provado.

Assim sendo, o presidente interino Michel Temer assumiu o risco iminente de ver-se constrangido a substituir um de seus ministros mais próximos (e importantes na formulação do projeto de governo), tendo em vista a obviedade dos ataques que seriam desferidos contra colaborador citado na Lava Jato. E Romero Jucá não foi o único ministro a ostentar essa mancha.

Da mesma forma que o presidente prontamente agiu “exonerando a pedido” o ministro que tem em alta conta, a declaração com que justificou o afastamento foi das mais elogiosas, deveria ter evitado a nomeação de Jucá e dos demais comprometidos, até pela simplória alegação de que governo com a característica da interinidade como é o atual, e nas circunstâncias em que assumiu o poder, não poderia dar-se ao luxo de se expor à tempestade e ao ridículo.

O presidente Temer, na fase de organização da equipe, tinha sim o direito de reunir os colaboradores e determinar que alguns deles não participariam diretamente do governo, até que seus problemas com a Justiça ficassem plenamente resolvidos.

O elemento complicador e irrecusável, de impacto demolidor sobre Jucá, veio na forma da transcrição de uma conversa com Sérgio Machado, ex-senador e ex-presidente da Transpetro, subsidiária da Petrobras para a área de gás natural, colocado no cargo sob a influência da cúpula do PMDB (leia-se Renan Calheiros).

O teor da conversa, presume-se que a mesma foi gravada pelo próprio Sérgio Machado, que dizem ter repetido o gesto com Sarney e Renan, é muito claro. Também citado na Lava Jato, para salvar a pele, Machado estaria em negociação para fazer delação premiada. Observe-se que os interlocutores em momento algum deram pormenores sobre envolvimento pessoal na gestação do virtual golpe para o afastamento de Dilma. Todavia, para bom entender meia palavra basta.

A conversa transcorreu animada por mais de uma hora. Os amigos falaram com tanta ênfase e propriedade sobre o impeachment, que chegaram a exagerar naquela inconsequência leviana dos que acham acima da lei e do bom senso (“Deixa comigo, eu sei do que estou falando, estou em contato com os generais e com os ministros do STF, o negócio é botar o Temer com um grande acordo de todo mundo e estancar a sangria”), além dos disparates de praxe que tornariam meteórica a passagem de Jucá pelo ministério.

O tratamento dispensado pelo presidente Temer ao imbróglio não se fez esperar e tornou-se emblemático para os demais ministros ou ocupantes de cargos importantes na estrutura do governo, porventura comprometidos com desvios de conduta. O indicativo foi dado e o presidente não duvidará em pedir o afastamento.

Afinal, o problema de maior gravidade que o governo começou a equacionar tem natureza econômica, e as primeiras medidas anunciadas pelo ministro Henrique Meirelles foram bem aceitas pelo mercado.

Governo que terá de reunir força suficiente (e votos no Congresso) para reparar os males causados pelo déficit superior a R$ 140 bilhões com o enquadramento rigoroso do gasto público, levar a termo as reformas da previdência e das relações trabalhistas, sem aumentar impostos e preservar os direitos adquiridos – que é apenas o começo da reconstrução – não poderá ver-se enredado na simples substituição de um ministro. Ou mais de um.

A serenidade do presidente ao explanar as primeiras medidas econômicas mostrou que o incidente Jucá foi superado.

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Uma ideia sobre “Incidente superado

  1. Sergio Silvestre

    Incrível como os fatos não deixa os amantes golpistas sonharem que tudo está bem.Nada está bem,primeiro que hoje temos um Supremo enxovalhado,ninguém confia e temos ai um grupo que assaltou o poder que deveriam ser penalizados por prisão perpetua por sabotar o Pais.
    Se o sr é um idiota sr Smith,eu não vou nesse canto da sereia,desde que as urnas abriram e levaram aquele susto,já contando com a vitoria o bandoleiro Aécio e sua caterva não engoliu a derrota e saiu com seus comparsas para tornar o Brasil terra arrasada.
    E com a negativa do Zé Eduardo Cardoso de intervir na lava-jato e com uma presidente que queria ver o estrago até o fim,até por que a governabilidade estava comprometida por esses canalhas.
    Olhem ai os que pensam,olhem o que aconteceu,o bando de ladrões são estes,ou vocês acham que são os senadores petistas ou os deputados do PSOL como Ivan Valente,ou um Jorge Solla.
    Todas listas de corrupção são encabeçadas por essa matilha de deputados que são a favor do Impeachment e o povo parece que não se da conta disso,os grotescos que apoiam chegam enojar o mais calmo como esses sujeitos dos revoltados on line.
    Eu penso que querem urgente que tirem logo essa presidente para nós se livrar,esse é o lema desses bandidos,essa é a meta desse canalhas.

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