6:01O santo é de barro

por Ivan Schmidt 

O Brasil dá continuidade à saga dos vice-presidentes, ao contrariar mais uma vez o dito galhofeiro (vice-presidente é só uma expectativa). O vice volta a sentar na principal cadeira do governo federal, repetindo a crônica mais recente iniciada em 1954.

Com o suicídio de Getúlio Vargas foi o que aconteceu naquele ano. A situação era grave e a crise se estendeu à pessoa do vice-presidente João Café Filho, que também não resistiu e acabou sendo substituído pelo então presidente do Senado, o catarinense Nereu Ramos, cujo único feito maior foi ter dado o nome a um município de seu estado.

O presidente seguinte foi Juscelino Kubitschek de Oliveira, que governou os quatro anos e passou a faixa para o substituto Jânio Quadros, o breve, que em sete meses renunciou. Quem assumiu em seu lugar? Ora, o vice-presidente João Goulart que seria afastado por um golpe tramado pelas “forças vivas da nação”, em aberto conluio com as Forças Armadas (aquilo sim é que foi golpe).

Seguiram-se os quatro generais, sendo que o último (João Figueiredo) não conseguiu impor a designação do quinto presidente do ciclo militar – a rebeldia se estabeleceu porque o então deputado paulista Paulo Maluf impôs sua candidatura aos delegados da Arena e levou no peito e na marra, deixando os milicos falando sozinhos.

Contudo, no colégio eleitoral no qual o direito de voto era exclusivo de deputados federais e senadores, o vitorioso foi o ex-governador das Minas Gerais, Tancredo Neves que correu por fora, a cavaleiro das manifestações massivas pelas Diretas Já.

Mas, houve um senão. No dia da posse, Tancredo foi levado ao hospital e após uma luta ingente contra as moléstias que o acometeram veio a falecer. Quem assumiu? Ora, mais uma vez o vice-presidente, protótipo mais bem acabado do coronel político nordestino, José Sarney, que no imbróglio que antecedeu a formação da Frente Liberal Democrática havia sido presidente da Arena, partido que sempre disse sim aos governos militares.

Falou mais alto o velho conchavo das classes dominantes, e o morubixaba maranhense se tornou o cacique nacional.

Tão esperto foi o “benefactor” que seu fiel séquito se convenceu a aprovar um quinto ano para o mandato presidencial, mesmo que isso tivesse custado uma penca de concessões de rádios FM e emissoras de televisão ao pessoal do Centrão, que na Assembleia Nacional Constituinte, fez das tripas coração para impedir alguns dos avanços políticos e sociais que deveriam entrar na Constituição Cidadã, como a denominaria o saudoso Ulysses Guimarães.

Depois veio Fernando Collor de Melo, a rigor primeiro presidente da República a ser afastado do cargo pelo instituto do impeachment. Na sessão do Senado que aprovou a admissibilidade do início do processo de julgamento político da presidente Dilma Rousseff o alagoano foi um dos 55 senadores a votar a favor. Até poucos dias era um ferrenho apoiador do governo petista.

A chefia do governo caiu nas mãos do vice Itamar Franco, que agiu com admirável descortino e tato políticos preparando o caminho da transição e da recuperação econômica do país, ensejando as condições para o sucesso do Plano Real.

É o que se espera do hoje presidente Michel Temer, que estamos todos lembrados, reconheceu na célebre carta encaminhada a Dilma ter sido até aquele momento “um vice decorativo”.

Pois agora a efetividade da tarefa presidencial lhe é confiada pelas marchas e contramarchas da política brasileira, na verdade, uma cornucópia de surpresas e emoções fortes.

O ministério anunciado pela imprensa tem alguns nomes de alto nível como Henrique Meirelles e José Serra, embora a predominância de parlamentares – os que mais se destacaram na reprodução do discurso pelo impeachment – atribua ao grupo uma certa coloração de gabinete parlamentarista, como opinou um analista.

O cuidado que o presidente Michel Temer deve tomar, e certamente o fará, é observar criteriosamente as falhas da chamada “presidência de coalizão” que acabou derretendo na hora em que mais foi necessária, para que esses fatos não se repitam em seu próprio governo.

Político experiente, profissional do Congresso, como o definiu outro dia Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central, o presidente Michel Temer sabe que ninguém consegue governar sem o apoio dos partidos.

Pelo perfil moderado e conciliador, Temer não será protagonista de gestos e atitudes ousadas nem bombásticas. Aliás, o que parece mais indicado para o momento dramático vivido pela economia – preocupação número um do novo governo – é ir devagar com o andor que o santo é de barro.

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3 ideias sobre “O santo é de barro

  1. Espelho de brasileiro

    Na minha opinião, o que mudou, de fato, foi de quadrilha. É isso que a ” democracia ” do bananão vem fazendo desde que o Mal. Deodoro apunhalou nas costas o Imperador Pedro II.
    À propósito, o governo do JK foi de cinco anos, de 1951 à 1961, o governo do ” cinquenta anos em cinco”; e um dos dois ou três presidentes honestos que conseguimos produzir.

  2. Espelho de brasileiro

    Desculpe, o revisor trabalhou muito nas últimas 48hs. O certo é de 1956 à 1961.

  3. TOLEDO

    Sr. Ivan, pelo amor dos meus filhos, chamar o Serra de ministro de alto nível, é miopia de velho, ou paixão sem critica de um pilantra. Mas tudo bem, quem nasceu coxinha, morre coxinha. Faça a sua parte social, como o Leandro, não use o elevador de serviço, só o social.
    Que vergonha esses curitibocas da republica do Moro!!

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