por Claudio Henrique de Castro*
A palavra corrupção vem do latim. “Corrumpo, is, upi, uptum, umpere” significa destruir, estragar, arruinar, deitar a perder (1).
O que pode corromper o homem? A resposta pode estar no provérbio popular de Sêneca: “Dize-me com quem andas e dir-te-ei as manhas que tens”, ou ainda no “quem anda com lobos aprende a uivar”. do italiano “Chi va col lupo impara a ululare”(2).
Onde está a semente histórica da corrupção no Brasil? Certamente na traumática experiência histórica da colonização. Na convivência da cordialidade e do banditismo, no “se dar bem”, no “tirar vantagem”, no desprezo pelo trabalho e na incapacidade da renúncia em nome do coletivo (3). Em resumo: de colher os frutos sem ter plantado a árvore, de se aproveitar da situação, na ética do colonizador corsário, patriarcal e escravocrata.
Para sustentar este estado de coisas existem os intelectuais do verbo fácil, das palavras comoventes e vazias – em síntese, os bacharéis (4).
A atualização disso tudo se dá pela legislação atrasada e de difícil aplicação, da baixa preocupação legislativa que as leis e a Constituição realmente funcionem e sejam aplicadas.
Do foro privilegiado para a maior parte dos cargos e funções da República, aquele que afasta o julgamento do juízo comum, de primeiro grau, e direciona as ações para os tribunais superiores, sempre atarefados, sem tempo de julgar – e também muitíssimos cautelosos e zelosos pela presunção de inocência, que resulta muitas vezes em salvo conduto para os corruptos. Em essência, da desigualdade da lei, da diferença dos que detém o poder e “os outros”, da vida comum, sem rosto, sem sobrenome ou sem cargo.
O que motivaria os corruptos? Carros importados, residências do alto padrão, contas no exterior, viagens e gastos em hotéis de luxo, roupas, joias e relógios de grifes, ingresso em clubes da elite, colunas sociais, iates, barcos, aviões e jatinhos, imóveis para os filhos, dinheiros aplicados em contas no exterior, segurança financeira eterna, festas com prostitutas famosas, a sensação de poder, fazendas com milhares de cabeças de gado, vinhos importados de rótulos caros, reeleições, votos, ervanário para as campanhas eleitorais, para o partido, dólares, euros, prata, ouro, pau Brasil, sesmarias, capitanias.
Em uma palavra: ganância.
É de Machado de Assis o conto da “Igreja do diabo”, no qual ele, o diabo, define a fraude.Chama-a de o braço esquerdo do homem – e que a venalidade é um exercício de um direito superior a todos os direitos. Ao circundar a Terra, viu a maldade em estado bruto, um ladrão de camelos que tapava o rosto e ia à mesquita, outro que furtava ao jogo e dava gorjetas aos criados. Aturdido e desorientado, subiu ao céu e foi ter com Deus que, depois de ouvir pacientemente o pobre coitado, finalizou: “Que queres tu? É a eterna contradição humana!” (5)
O país atravessa grande crise econômica, num estado bruto de corrupção, onde os jornais noticiam escândalos dos altos dirigentes do país, sem que algo de concreto seja efetivamente realizado traz a desesperança e o desalento coletivo.
Temos que enfrentar a contradição de termos dirigentes encharcados chafurdados na lama, mas com postura cínica de inocentes.
Assistimos nos países civilizados um tratamento exemplar aos corruptos: prisões cautelares e afastamentos imediatos ao menor sinal de desvio. No Brasil os corruptos são tratados por “excelência”, têm amplos direitos de usufruir do nosso passado histórico de privilégios e desmandos dos colonizadores, estado de coisas que não nos deixaram nenhuma saudade.
A legislação tem que ser urgentemente modificada para deixarmos o Brasil colonial e escravocrata enterrado no passado, mas sempre lembrado, para se evitar a repetição do erro.
Cidadãos não são escravos, nem servos da corrupção.
É tempo de uma mudança histórica.
*Claudio Henrique de Castro é advogado e professor de Direito
Notas:
1.SARAIVA, F.R. dos Santos. Dicionário Latino-Português: Etimológico, prosódico, histórico, geográfico, mitológico, biográfico, etc. Redigido segundo o plano de L. Quicherat, 12º, Livraria Garnier, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, 2006.
2.TOSI, Renzo. Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas. Trad. Ivone Castilho Benedetti. Editora Martins Fontes: São Paulo, 1996.
3.VELOSO, Mariza e MADEIRA, Angélica. Leituras brasileiras: itinerários no pensamento social e na literatura. 2ª ed. Paz e Terra: São Paulo, 2000, p. 168 e ss.
4.VELOSO, Mariza e MADEIRA, Angélica. Leituras brasileiras: itinerários no pensamento social e na literatura. 2ª ed. Paz e Terra: São Paulo, 2000, p. 174 e ss.
5. ASSIS, Machado de. Historia sem data. V. 15. São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, W.M. Jackson Inc Editores, s.d., p. 7.
É isso aí, Claudio Castro.
Causa-me intensa perplexidade, para não dizer desolação, olhar em volta e ver os poderes constituídos – todos – no âmbito federal (também nos âmbitos estadual e municipal), enredados quase todo dia em artigos de corrupção e malfeitos, mais afeitos a aparecer nas colunas policiais do que no diário oficial.
E a sociedade assiste a esse quadro insossa, esperando pelo próximo capitulo como quase acostumada a aguardar dia após dia o seguimento da novela das oito.
Não é capaz de se aperceber que o perigo nos ronda voraz e sanguinolento.
Aqui nesse país, cada “Corte” tem sua máfiazinha. Em volta de principezinhos “anões morais” está organizado todo um séquito preparado para fazer negócio com o poder do nobre. O príncipezinho de repartição não se expõe ao vil exercício da arrecadação. Sempre tem um que faz o trabalho sujo para ele, aquele que arrecada, que solicita os favores, que oferece a troca, enfim: o que negocia. Esse é o que vai preso quando as caminhonetes pretas amanhecem em frente do apartamento. Esse é o que assume tudo sozinho e faz questão de dizer que o pequeno príncipe “não tem nada a ver com isso”. É a máfia meu caro, é a máfia. Uma máfia jacu e caipira, que mal sabe interpretar um texto, mas sabe o caminho do dinheiro público fácil. Como um açougueiro da coisa pública, eles sabem onde está o melhor pedaço escondido da carne do boi-estado. Da boca para fora são senhores comentaristas da moralidade e da honestidade, da porta dos gabinetes pra dentro são ágeis na arte da permuta e da pixulecagem.
Ah essa gente…Não perdem por esperar. Já nem dormem tranquilos…
Obrigado pelos comentários, para aprofundar o tema indico, respeitosamente, o livro sobre O Jeitinho no Direito Administrativo Brasileiro: http://issuu.com/claudiohenriquedecastro/docs/jeitinho_no_direito_administrativo_
Abraço a todos ! CHC