9:01Quanto pior

por Janio de Freitas

Decorridos nove meses do ato de sua criação –qualquer semelhança com outro período assim é mera coincidência–, dizem na Presidência que começa o segundo mandato de Dilma Rousseff. Embora não seja a Dilma Rousseff eleita para um segundo mandato. Nem o mandato, no melhor sentido de incumbência e representação, seja o entregue a Dilma Rousseff pela maioria dos eleitores.

A rigor, não se sabe o que será esse mandato. Sabe-se o que não será. Os retalhos que vêm formar um pretenso ministério não têm o mínimo de ideia e de substância. Condicionados, além do mais, ao único objetivo verdadeiro do governo: empobrecer-se e empobrecer a atividade econômica da qual depende a grande maioria da população.

Que conceitos regeram a (de)formação desse governo hipotético? Dilma Rousseff explicou: “O governo de coalizão, como é o caso do meu [sic] e de todos os governos depois da democratização, precisam de apoio no Congresso. Nós vivemos em uma democracia e temos que dialogar com o Congresso eleito pelo povo, em favor da população”.

Sem dúvida. Mas não há como ver no recém-chegado Celso Pansera mais do que um representante de Eduardo Cunha e do clã Picciani, e, ainda bem, não do Congresso. Todos os novos ministros representam apenas os grupos do mercantilismo toma-lá/dá-cá, que enoja o país. E por tal condição é que foram adotados, para aplacar as voracidades ainda não atendidas. Foi aceito como bom para o ministério, portanto, o que devia ser recusado a priori.

O oposto, a negação a associar-se aos grupos da política degenerada, é visto como alternativa irreal. Mas o repudiado pelo país quase todo não é a irrealidade, é a realidade. Contra essa opressão da realidade maldita é que vale a pena batalhar. E é preciso batalhar. Se é para sujeitar-se à realidade por ser realidade, por que, por exemplo, combater a corrupção espraiada pelo país todo, tão fácil e tão rentável? Adotemos o lucrativo tráfico de drogas que é uma realidade de todas as classes.

O que existe no Brasil sob o nome de política é outra coisa. Mas o governante, por melhores que sejam seus propósitos, é forçado a aceitar o jogo, ou não governará. Substituída a política pela grande teia de interesses, ao governante não restam meios operacionais fora dessa cadeia –é a convicção estabelecida.

Mas o que falta aos governantes é, sobretudo, determinação para exigir outras relações com políticos e partidos. Importa-lhes preservar suas perspectivas e as conveniências partidárias, os apoios e os arranjos grupais. A obviedade, porém, é outra: no país em que mesmo um guri oportunista e ignorante convoca massas e é atendido, só por fazê-lo para protestos contra os métodos e consequências da falsa política e do desgoverno, são desnecessárias outras evidências do poder oferecido pela saturação da tolerância pública. Tão disponível, da mesma ou de outras formas, para o guri quanto para o governante que repudiasse “a realidade”.

A solução aceita por Dilma como ruptura do cerco peemedebista faz o seu reencontro com Lula. Dele partiu não só o apoio para os maus enlaces já encaminhados. Mais do que isso, Lula incentivou-a a sujeições ainda mais extremadas. Como a incorporação ao ministério de um representante de Eduardo Cunha. E o atendimento ao velho desejo do PMDB de tirar Aloizio Mercadante da Casa Civil, o que os peemedebistas nem cobravam mais.

Aliás, Dilma já desejava ter Jaques Wagner nas proximidades há muito tempo, pensou até em dar-lhe uma sala na Presidência como ministro da Defesa. Não colou. Agora Jaques Wagner é o novo ministro da Casa Civil, que tem muito trabalho. Mas quem vai trabalhar?

O que importa é estar tudo pronto, enfim: quanto pior, pior.

*Publicado na Folha de S.Paulo

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