18:59Refresco

Do blog Cabeça de Pedra

Minha mãe sempre entrava com duas quentes e outra fervendo. Era baixinha, pernas cambaias, boca com os cantos caídos e parecia sempre triste. Parecia. Era mestre no de repente, ou seja, inventar frases, modas, tudo em cima do laço, na hora do acontecimento, como só quem nasce com talento e o desenvolve sabe fazer. Não se sabe onde aprendeu, mas ensinava. Conhecia todo o repertório de palavrões nordestinos – e febre do rato para ela era uma coisa suave. Fi da boba, por exemplo, era comum ela se referir a alguém que tinha feito algo errado. Fi da boba é o diminutivo de Filho da Peste Bubônica. Um dia aprontaram com ela. Foi meu pai. Coisa que nunca tinha acontecido. Não houve consequências, mas ela ficou bem triste de verdade. Uma irmã quis consolá-la, aquele consolo inútil de quem nunca tinha vivido aquela situação e que não sabe que a dor pode até se esconder, mas nunca vai passar. Quando acabou de falar a abobrinha, minha mãe só disse o seguinte para ela: “Fogo no rabo dos outros é refresco”.

Compartilhe

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.