9:09A satanização das cidades

por Ruy Castro

… Depois de alguns anos de refresco, o Rio volta a ser satanizado. Pelo que se lê, não há como sair à rua sem ser assaltado, esfaqueado ou se ver no meio de um tiroteio. Ao mesmo tempo, se você gosta de música popular, apenas nesta semana já teve ou terá a opção de assistir a shows de Zé Renato, Marina Lima, Erasmo Carlos, Francis Hime, Os Cariocas, Beth Carvalho, Marcos Sacramento, Moyseis Marques, Fafá de Belém, Elba Ramalho, Elza Soares, Marcos Valle, muitos mais. Quem está saindo para assistir a esses artistas?

Os mesmos que lotam a Lapa, a Zona Portuária, as lonas culturais da prefeitura na Zona Norte, os museus, os botequins de mesas na calçada, o calçadão de Copacabana, as praias, os cartões postais e até os churrascos na laje nos morros pacificados –mas, neste caso, tendo de disputar lugares com os turistas alemães.

Enfim, é só para dizer que as cidades se dão umas dentro das outras, no mesmo espaço e ao mesmo tempo, e sempre foi e assim será.

Cidade dentro da cidade

Não paga dez. Se, por algum motivo, falamos ou pensamos em Chicago nos anos 1920, vêm-nos à cabeça Al Capone, Lei Seca, metralhadoras em estojos de violino, limusines pretas, guerras entre gangues e uísque fabricado em banheiras. É como se toda a cidade vivesse do crime, e andar por suas ruas fosse uma temeridade. Mas havia outra Chicago por trás daquela Chicago.

Futuros escritores como James T. Farrell, Meyer Levin, Nelson Algren, Peter De Vries e Saul Bellow eram crianças ou adolescentes nela, e não há muitos gângsteres nos seus romances e contos. Grandes coisas aconteciam em saúde pública, arquitetura e até em direitos dos gays. Museus abriam uns atrás dos outros. Seus repórteres talvez fossem os melhores do mundo. E seus jazzistas estavam criando a “escola de Chicago”, que produziu, entre outros, o trompetista Bix Beiderbecke.

Depois de alguns anos de refresco, o Rio volta a ser satanizado. Pelo que se lê, não há como sair à rua sem ser assaltado, esfaqueado ou se ver no meio de um tiroteio. Ao mesmo tempo, se você gosta de música popular, apenas nesta semana já teve ou terá a opção de assistir a shows de Zé Renato, Marina Lima, Erasmo Carlos, Francis Hime, Os Cariocas, Beth Carvalho, Marcos Sacramento, Moyseis Marques, Fafá de Belém, Elba Ramalho, Elza Soares, Marcos Valle, muitos mais. Quem está saindo para assistir a esses artistas?

Os mesmos que lotam a Lapa, a Zona Portuária, as lonas culturais da prefeitura na Zona Norte, os museus, os botequins de mesas na calçada, o calçadão de Copacabana, as praias, os cartões postais e até os churrascos na laje nos morros pacificados –mas, neste caso, tendo de disputar lugares com os turistas alemães.

Enfim, é só para dizer que as cidades se dão umas dentro das outras, no mesmo espaço e ao mesmo tempo, e sempre foi e assim será.

*Publicado na Folha de S.Paulo

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