19:05HORÓSCOPO

por Zé da Silva

Libra

O filho da puta começou a distribuir bilhetes anônimos por baixo das portas das casas daquela rua que pacata e onde ninguém tinha o hábito de olhar para a vida alheia. Cada um cuidava da própria sobrevivência, carregava o fardo natural, mas também mantinha o bom humor de uma existência normal. O pulha, não. Era um solitário, mau humorado e culpava o mundo por ter nascido e vivido longe do que imaginava ser o ideal, ou seja, rico, nem que para isso tivesse de vender a própria mãe. Seus bilhetes eram mais do que escrotos. Inventava traições, achincalhava a maneira de se vestir, de se comportar, ressaltava aquilo que achava defeito de aparência, xingava as crianças, amaldiçoava os animais. Ele só não contava com a amizade da maioria das pessoas daquelas pessoas. Os moradores começaram a falar a respeito e descobriram o óbvio: só o morador daquela casa, aquele que não conversava com ninguém, só ele, enfim, se mantinha à parte de tudo. Pegaram o cancro numa sábado à noite. Cagão, ele confessou tudo enquanto melava os fundilhos da calça e se mijava todo. Jurou que nunca mais faria aquilo. Não adiantou. Tiraram toda a roupa dele e o fizeram desfilar pela rua, com o povo olhando em silêncio. Depois daquele dia ele sumiu. Mas não aprendeu a lição. Agora escreve desaforos na internet e se esconde sob pseudônimos. Seu maior prazer é quando quem ataca responde. É que finalmente ele conseguiu o que sempre buscou: prazer – coisa que não acontecia quando começou a ser um filho da puta a escrever bilhetes anônimos.

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