21:15HORÓSCOPO

por Zé da Silva

Capricórnio

Leu o livro de uma sentada e ficou tão alucinado que o carregava para todos os lugares. Tinha medo de perder o que lhe invadira e cravara os dentes na alma. O caráter do detetive era a personificação de como deveriam ser todos os homens da Terra. Além de honesto, e com todas as dúvidas do ser humano, a percepção do que o cercava, dos detalhes dos lugares, da paisagem, dos cheiros, dos olhares, do que uma roupa dizia sobre quem estava dentro dela, tudo ficou marcado de uma forma tão forte que, numa tarde de chuva, caminhando pela praia, ele teve o delírio. Primeiro jogou as sandálias no mar oferecendo-as a Iemanjá. Depois, com o livro apertado embaixo da camisa, olhou para o céu, recebeu os pingos da chuva – e agradeceu em voz alta, várias vezes. Queria que as palavras furassem o chumbo do céu e chegassem lá, em qualquer lugar, talvez a um escritório com porta de vidro onde estaria escrito o nome do durão, talvez a um beco de São Francisco onde havia marcas de um crime, ou na casa de praia onde quem deveria ouvir acompanhava a mulher Lillian Hellman no sofrimento e na solidão do ato de escrever. Enfim, ele não sabia se seria ouvido. Apenas tinha certeza de que aquilo era uma declaração de amor a Dashiell Hammet e a Sam Spade.

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