19:14A técnica, o passe e o drible

por Tostão

O futebol, sem saber quando isso começou, tornou-se, progressivamente, mais científico, estratégico, coletivo, físico (pela velocidade e intensidade, e não pelo contato corporal), mais técnico e menos habilidoso. O jogo coletivo é também bonito.

O talento é a soma, a síntese, da habilidade, da técnica, da criatividade e de adequadas condições funcionais e emocionais, em proporções variáveis para cada jogador. A técnica é hoje a base de tudo. Não existem craques sem excepcional técnica, mesmo se forem extremamente habilidosos.

No passado, predominava a habilidade. Agora, é a técnica, individual e coletiva, de fazer as escolhas corretas durante a partida e de executar, com precisão, o que foi planejado. Existe um chavão de que o jogador brasileiro é diferente, pela habilidade, fantasia e improvisação. Mas temos formado menos jogadores habilidosos e, principalmente, menos técnicos. A técnica pode ser aprendida e/ou aprimorada. O que os garotos treinam nas categorias de base? Aprendem a ganhar dinheiro?

O Corinthians é um time mais técnico, e o São Paulo, mais habilidoso. Prevaleceu a técnica. Na quarta-feira (18), o São Paulo foi anárquico. O Corinthians repetiu a estratégia das grandes equipes do mundo e da época em que foi campeão mundial, ao alternar a pressão em quem está com a bola com o recuo para formar duas rígidas linhas de quatro, de dar inveja aos ingleses, para, depois, contra-atacar.

Lucas Silva, volante essencialmente técnico, estreou, como titular do Real Madrid, contra Schalke 04. Foi uma atuação correta. Ele não foi brilhante, mas se posicionou muito bem e não errou passe. Não tentou dar passes impossíveis nem para o companheiro marcado. Isso também é importante. Os grandes meio-campistas esperam, às vezes, durante toda uma partida, uma chance de dar um passe decisivo. Quando isso não ocorre, trocam passes, para não perder a posse de bola.

Lucas Silva terá de aprender, com Kroos a seu lado, a tocar mais rápido, às vezes, para frente, com os dois pés, sem precisar dominar a bola. Isso evita que o adversário volte para marcar.

O drible é também essencial, mas, nas grandes equipes, são reservados aos excepcionais atacantes, próximos da área. Assim como o drible é símbolo da habilidade e do talento individual, o passe é símbolo da técnica e do jogo coletivo. A principal razão da queda de nosso futebol foi a desvalorização do passe.

De vez em quando, o jogo, essencialmente técnico, mesmo entre as melhores equipes, se torna monótono, com excesso de passes. Falta o ritmo alucinante de alguns times sul-americanos, quando atuam em casa, empurrados pela torcida.

A técnica é essencial no futebol e em qualquer atividade. Não existe arte sem técnica. O grande pintor abstrato Jackson Pollock era uma exceção, ao jogar a tinta, aleatoriamente, na tela, como se fosse uma explosão do inconsciente. Adoro suas pinturas. Na sexta-feira (20), a Folha publicou um estudo científico que mostrou que não era bem assim. Ele tinha também sua técnica, um guia, um molde, desenhado na tela.

Fiquei decepcionado

*Publicado na Folha de S.Paulo

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