6:49À guisa de um náufrago

por Nilson Monteiro

O poder é triste. Fecha as portas no sábado e domingo, e assiste Faustão com as bênçãos dos deuses.

Junta um enxame de interesses dos mais diversos de segunda a sexta e fecha a vida a seu redor nos finais de semana.

Já o disse Leminski, o poder é o sexo dos velhos. Deve ser, se for, de segunda a sexta. Murcha no sábado e domingo, com apetite sexual ou não.

O que eu quero te dizer é que perto de casa, nas beiradas das casas judiciária, legislativa e executiva etc., o brasileiro, aquele que gosta de umbigo no balcão, paga pecados. Não há um só bar, boteco com alma, onde se discuta futebol, mulher dos outros, resultado da loteria e se toma cerveja, pinga, conhaque, comendo coxinhas engorduradas, amendoim torrado, carne-de-onça, arrebitando o fígado em nome do que cada um bem entender.

Não há. Procure com lupa, escafandro, binóculo, não há.

Vá pra Mateus Leme, vá pra onde você bem quiser ou tua sede te guiar. Não há.

Não há mistura, não há convivência, não há trocas, não há a diversidade preconizada pelo Lerner. Nécas.

Aliás, se as tuas inspirações não forem etílicas, mas simplesmente a fome por pães, como na Divina Ceia, esqueça: por aqui, também não há panificadoras aos sábados e domingos.

Vizinho de onde moro, na Mauá com a Marechal Hermes, há o Jaboti, que, apesar do nome sugestivo, não é bar: é um híbrido de mercearia, cujo dono, o simpático Laércio e seu bigodinho caipira, fecha as portas muito cedo nos dias de semana (antes do Jornal Nacional) e na hora do almoço aos sábados. Justifica-se: é fã de novelas e abre todo dia ao nascer do sol. Trocando em miúdos: sua cerveja atende no sacrossanto expediente comercial. Aos sábados à tarde e aos domingos, nem sonhar.

Próximo há o restaurante Açores. Não é bar, mas uma mistura de. Passaria no teste se o ambiente fosse menos acolhedor a famílias, crianças e outros seres pouco comuns ao boteco e de ouvidos menos sensíveis a descalabros pertinentes aos ares botequeiros. O português é desbocado, como todos, mas o encanto do lugar, que existe, parece viver às margens do Tejo. Sei lá, um dia ainda me acostumo e esta terra ainda vai tornar-se um imenso Portugal às margens do Couto Pereira.

Há o bar do MON. Só pode ser brincadeira. É raffiné demais. Fala francês, cerveja cara, com trajes finos e andar delicado, tem lá o seu glamour, mas não tem alma, não tem espírito, nem um sopro, de boteco.

Os bares de rua próximos ao Museu servem com toda aceleração a moçadinha louquinha até sexta à noite, com tudo a quem direito ou não, incomodando a deus e ao diabo na terra sem sol com seus sons enlouquecidos, como se não existe amanhã. Nem sábado e nem domingo.

Vou embora pro Xaxim, Abranches ou Cajuru. Lá, no Bar do Padre, tenho a cerveja que quero na mesa que escolherei.

 

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