6:30O auxilio-moradia incha, o TJ cala e a ninguenzada paga

Da Gazeta do Povo, em reportagem de Amanda Audi

Despesa do TJ-PR com indenizações cresce 270%

Em maio, tribunal destinou R$ 163,9 mil a desembargadores; valor subiu para R$ 607,1 mil após a instituição do auxílio-moradia

Os gastos com indenizações para desembargadores do Tri­­bu­­nal de Justiça do Paraná (TJ-PR) quase quadruplicaram desde a instituição do auxílio-moradia. Em maio, último mês antes do início do pagamento do benefício, o total gasto foi de R$ 163,9 mil. Em setembro, último mês disponível para consulta no Portal de Transparência do órgão, o valor passou para R$ 607,1 mil.

Cada desembargador recebia, em média, R$ 1,4 mil mensais em indenizações. Ao englobar o auxílio-moradia, a partir de junho, a média subiu para R$ 5,1 mil mensais. A categoria de indenizações da folha de pagamento do TJ inclui ganhos como auxílio-alimentação, auxílio-saúde e outros quatro auxílios. Diárias, férias e 13º não entram na conta.

Levantamento da Gazeta do Povo mostra que, entre os 117 desembargadores do TJ, apenas oito não apresentaram o aumento brusco no recebimento de indenizações. Apesar de o tribunal não especificar na folha de pagamento o valor exato do auxílio-moradia recebido por cada magistrado, a diferença entre os valores dos dois meses é compatível com a estimativa de gastos do TJ com o auxílio.

O levantamento levou em conta os magistrados do topo da carreira do TJ, mas os cerca de 700 juízes e juízes substitutos do Paraná também podem receber o benefício.

Além disso, no fim de se­­tembro, o ministro do Supre­­mo Tribunal Federal Luiz Fux concedeu liminar para que todos os magistrados do país passassem a receber a verba no mesmo patamar que um ministro: R$ 4,4 mil mensais. Portanto, o número de beneficiados e o valor podem ter aumentado. A folha salarial do TJ de outubro ainda não foi divulgada.

A estimativa é que os gastos com o pagamento no estado fiquem em torno de R$ 47 milhões por mês. A reportagem procurou o TJ em diversas situações em busca de informações oficiais relacionadas ao auxílio-moradia, mas nunca obteve resposta.

Além da assessoria de imprensa do tribunal, a reportagem também tentou obter respostas, ontem, com diversos setores internos do órgão, que tampouco repassaram dados sobre o auxílio-moradia.

O recém-eleito presidente do tribunal, Paulo Vascon­­celos, disse por telefone que não poderia comentar o assunto porque estaria ocupado durante todo o dia de ontem. Ao ser questionado se recebia o auxílio-moradia, ele pediu para agendar uma entrevista em outro dia e desligou o telefone.

Em entrevista na segunda-feira, quando foi eleito, Vas­­concelos disse que a concessão do benefício era “coisa de momento” e que não cabia a ele julgar a procedência da concessão, uma vez que foi decisão do atual presidente, o desembargador Guilherme Gomes.

Vasconcelos é um dos desembargadores que aumentaram o rendimento em indenizações. Em setembro recebeu R$ 5.424, ante R$ 1.302 em maio. Gomes também: os ganhos passaram de R$ 1.108 para R$ 5.458.

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Tribunal terá de divulgar salários

A ministra Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), deu 15 dias para o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) mudar o sistema de divulgação de salários dos magistrados em seu Portal da Transparência. O TJ deverá retirar a exigência de o usuário ter de informar uma série de dados pessoais para poder ter acesso a cada informação.

A decisão foi tomada a partir de questionamento da reportagem da Gazeta do Povo ao CNJ em setembro deste ano, quando o TJ havia completado três meses sem divulgar salários. A interrupção teve início em maio, quando o TJ instituiu o auxílio-moradia. Os vencimentos de junho seriam os primeiros a virem com o benefício.

As remunerações de junho, julho e agosto só foram divulgadas pelo TJ em setembro, depois que o CNJ intimou a presidência do tribunal a cumprir os prazos. Quando as publicações foram retomadas, o portal do TJ havia sido reformulado com uma mudança de ordem prática: para acessar cada um dos pagamentos, os usuários devem informar nome completo, e-mail e endereço pessoal.

A ministra, que na decisão afirma ter sido surpreendida com a mudança, aponta que a mesma exigência não é imposta a usuários que querem informações sobre a execução do orçamento do TJ e relatórios de gestão, por exemplo.

A justificativa do TJ que consta no Portal de Transparência é que a medida é respaldada pela Lei da Transparência, de 2011. A ministra, porém, afirma que os dados pessoais do solicitante só são necessários em caso de transparência passiva – ou seja, de pedidos de informação sobre assuntos que não foram divulgados espontaneamente. Já a publicação de salários seria um dever do órgão público, que não poderia impor qualquer limitação de acesso às informações.

“Decorre disso que o usuário não deve ser compelido a identificar-se para ter acesso a qualquer informação que o Poder Público já esteja obrigado a prestar espontaneamente”, escreve Frischeisen.

A assessoria de imprensa do TJ informou apenas que o órgão ainda não foi notificado. “Os 15 dias contam a partir da notificação e isso ainda não ocorreu”, disse, por e-mail. A decisão da ministra é de 3 de novembro.

Colaboraram: Angieli Maros e Rogerio Galindo

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Opinião

Aumento não pode vir por subterfúgios

Está claro para quem quiser ver: o chamado auxílio-mo­radia da magistratura tem pouca ou nenhuma relação alguma com o custeio de habitação para juízes que precisam se deslocar de uma cidade para outra. Isso seria perceptível pelo simples fato de o pagamento ser feito a todos os integrantes do Judiciário, independentemente de apresentação de notas ou da necessidade de mudança de sede. No caso dos desembargadores, isso fica ainda mais evidente: moram todos na capital e não têm perspectiva significativa de serem removidos. Se querem discutir seu salário, os juízes precisam fazer isso pelas vias certas, e não por meio de subterfúgios legais. Mais do que isso: é preciso publicar a informação de forma clara e transparente, para que o cidadão saiba o que está pagando e quem está recebendo.

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Sou a Geni da vez, diz juiz que recusou o auxílio-moradia 

De Santa Cruz do Sul (RS), cidade a 150 quilômetros de Porto Alegre, veio a primeira manifestação pública de um magistrado contrário ao auxílio-moradia de que se tem notícia. O juizCelso Fernando Karsburg, do Tribunal Regional do Trabalho da 4.ª Região, abriu mão do benefício de R$ 4,4 mil mensais por considerar o pagamento “imoral” e “antiético”. Depois dele, que publicou artigo em um jornal regional no início de outubro explicando seu ponto de vista, outros dois desembargadores gaúchos também negaram o auxílio.

 

 

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Uma ideia sobre “O auxilio-moradia incha, o TJ cala e a ninguenzada paga

  1. Marcio Nogueira

    Indo na contramão da decisão do CNJ e da lei de transparência, o TC do Paraná a partir de hoje está fazendo as mesmas exigências do cidadão contribuinte para poder ter acesso às remunerações pagas pelo TC. Será que tal medida foi adotada pelo TC para evitar que a imprensa tome conhecimento das indenizações vultuosas que serão pagas pelo órgão aos seus servidores a título de URV?

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