17:34Cavaleiro da triste figura

por Ivan Schmidt 

Breve rescaldo sobre o resultado da eleição de domingo para o governo estadual, mostra de cara a persona política gravemente esturricada do senador Roberto Requião, cujo adeus somente deixou de ser sacramentado de uma vez por todas, porque ainda tem quatro anos de mandato no Senado.

Egresso da eleição muito menor do que ao arrebatar no peito e na raça o diretório estadual do PMDB do suposto controle exercido pela bancada de deputados estaduais (que também naufragou quase por inteiro), e quando se proclamou mais uma vez candidato ao governo surfando uma onda que virou marola, Requião paga o preço da incapacidade de calcular nos mínimos detalhes o respaldo logístico indispensável para enfrentar um desafio desgastante como foi a campanha recém-encerrada. Então, a derrota veio de forma fragorosa.

Desde o início, o candidato do PMDB respondia de modo evasivo quando perguntado sobre seu projeto de governo, argumentando que para convencer a maioria bastava historiar o que fizera nos dois mandatos anteriores. Meu currículo, repetia com visível ar de enfado, é o que fiz como governador. Contudo, a rebarbativa repetição de coisas que ficaram no passado não produziu o resultado esperado pelo cavaleiro da triste figura e seu reduzido grupo de parentes e escudeiros.

Quando precisou encarar a guerra propriamente dita, ou seja, trabalhar pela conquista dos votos da maioria em todas as regiões do Estado, percebeu que sua armada não tinha comando e, muito menos militantes motivados a colocar a cara a tapa em defesa de um candidato que, a princípio, parecia estar impulsionado pelo vento da vitória, mas em poucos dias acabou mostrando melancólica fragilidade.

Sem o apoio de um único prefeito de município importante, ou seja, sem base para operar no interior, a campanha de Requião se restringiu aos poucos minutos disponíveis no horário eleitoral gratuito, com algumas invasões do espaço dedicado aos candidatos a deputado estadual e federal (o que rendeu punições da parte da Justiça Eleitoral).

Mas, a escassez de propostas reais para os próximos quatro anos e nenhuma alusão ao Paraná do futuro — traço comum entre os demais candidatos – substituída pela melopéia do congelamento por quatro anos das tarifas da Sanepar, a luz fraterna, o leite das crianças, os 44 hospitais construídos e abandonados pelo atual governo, o projeto Povo e um sistema educacional que não encontra rival em nenhum país do globo, resultou na deserção do tradicional eleitorado do ex-governador.

Aliás, esse fenômeno típico da fadiga dos materiais já havia sido visto na carreira de Requião ao eleger-se para o terceiro mandato, quando ganhou de Osmar Dias pela vantagem de 10 mil votos. O fato se repetiu na eleição seguinte para o Senado, quando Gustavo Fruet também por escasso número de votos deixou de conquistar, ao lado de Gleisi Hoffmann a segunda vaga disponível.

Portanto, a amarga experiência vivida pelo senador Roberto Requião – ele também havia sido derrotado por Jaime Lerner numa eleição para o governo – deverá ser a derradeira em sua experiência, diga-se de passagem, de relevância reconhecida na história da política estadual. Ao concluir o mandato de senador, aos 77 anos de idade, terá contra si o inexorável vaticínio de um eleitor que dificilmente se engana. O tal de Gregório, inventor do nosso calendário.

Como lembrou um cientista político, a grande vitória de Requião foi eleger o filho Maurício para a Assembleia Legislativa, curiosamente onde começou em 1983, elegendo-se em meio a uma farândola de peemedebistas, dentre os quais resistiram até agora Caíto Quintana e Waldir Pugliesi, aposentados no último domingo pela indiferença dos eleitores. A desculpa é que foi assim no país inteiro, especialmente com os eleitores jovens, para quem alguns atores do espetáculo da política pouco mais representam que peças de museu.

Requião seguiu a lógica e plantou a semente familiar na política paranaense (seu sobrinho João Arruda vai continuar na Câmara dos Deputados), e seu herdeiro estreará na Assembleia em fevereiro próximo. O sintomático é que Maurício adotou a alcunha de Requião Filho, mesmo que seu registro de nascimento declare a quem interessar possa que seu sobrenome é Quarengui de Mello e Silva.  Assim, bem melhor teria sido nomear-se Filho do Requião, ou, não fosse o pecadilho atroz, Filho do Homem.

Afinal, mais uma aberrante evidência de que as eleições desse ano passaram a ser anexadas à relação de bens de raiz das famílias privilegiadas. Na antiguidade bíblica, o exemplo é bom, a herança dos pais para os filhos eram os rebanhos de bodes e carneiros. Hoje, os pais mais abonados, além das posses e investimentos passados para os herdeiros, consignam também mandatos eletivos. É como se para alguns privilegiados ainda estivesse em voga a viciada eleição a bico de pena.

Por outro lado, a convincente vitória de Beto Richa e sua consagração como líder político (Aécio ganhou aqui com folga), deverão enfrentar os obstáculos naturais da fase de organização do segundo governo. Afinal, o governador terá de administrar o pesado ônus da quantidade de partidos aliados à coligação puxada pelo PSDB. Cada um deles pleiteará seu espaço na gestão, pois essa é a moeda de troca mais valorizada na esfera pública.

Nas quebradas se comenta que o deputado Ratinho Junior, o campeão de votos no Paraná, no mínimo, faz a conta de três secretarias estaduais. Eleito para a Câmara dos Deputados, Valdir Rossoni não abre mão da chefia da Casa Civil, de onde poderá controlar o governo e a extensa bancada governista. Contudo, montando um petiço que se mostrou bom de carreira o deputado Eduardo Sciarra, coordenador da campanha de Beto, é pule de dez para quaisquer cargos na cúpula do futuro governo, a começar pela Casa Civil.

A verdade é que por sua extraordinária votação, o governador viu patenteada a prerrogativa de organizar um governo à altura das exigências de uma unidade da Federação, que pela dimensão de seu tributo para a formação da riqueza nacional, não pode ficar à mercê de decisões ditadas pela mediocridade e revanchismo.

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Uma ideia sobre “Cavaleiro da triste figura

  1. Zangado

    Enquanto Requião conseguiu um zero à esquerda, Beto Richa tem a oportunidade de acrescentar um zero à direita, mas para isso precisa acrescentar números ao zero de seu primeiro mandato. Ou não?

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