12:29Arquitetura, do que é feita?

por Yuri Vasconcelos Silva

A luz que percorre os planos opacos ou transparentes, joga com sombras que dobram, se inclinam, refrescam e aprofundam os espaços. O percurso de fora para dentro e depois para o exterior novamente, com o olhar percebendo a mudança constante de perspectivas, o passo e compasso quase musical criam o ritmo de colunas. O escuro e o claro, os tons de cinza e todos os espectros coloridos de luzes refratadas. A isso dá-se o nome de Tempo em arquitetura.

As medidas construídas giram em torno do homem e da mulher, velhos ou crianças, portadores de especiais necessidades ou atletas natos. Cada dimensão atende um propósito calculado, mas por vezes misteriosos aos sentidos dos leigos. E assim deve ser. Uma catedral leva ao transcendente sob pés direitos que se erguem aos céus e luzes. Uma choupana na floresta traz a segurança e o conforto na exata medida em que a natureza protege e abraça o espaço do homem em um ambiente não civilizado. O museu permite a liberdade para a criação das mentes e seus observadores, em dimensões amplas, claras, silenciosas como a folha em branco é para um escritor. A isso dá-se o nome de Espaço em arquitetura.

Quando de longe se avista uma torre com mil prismas de janelas, que repetem o brilho do sol tal qual um farol, este é uma referência daquele lugar distante. Se próximo a torre é vertiginosa para cima, conecta-se então ao que acontece no mesmo nível dos olhos, no solo. Pórticos grandiosos, fontes em cascatas descendentes em degraus, foyer com dez vezes a altura de um homem. Ao lado, um bar com vez e meia a altura de uma mulher. Elevadores com suas portas polidas como diamantes ou comércios com mezaninos e encantadas vitrines cheias de sedas, cheiros e músicas hipnotizantes. A isso dá-se o nome de Escala em arquitetura.

Após caminhar na umidade densa que cola na pele, no calor que produz moleza no espírito, avista-se um lugar que deleita a visão e faz desejar. Adentrar este edifício especial, sentir o desconforto climático evanescer e a temperatura ideal cobrir sua pele e evaporar o suor. Os pés descalços sentirem um piso veiado de madeira. O cheiro de nós de pinho, dos tecidos de lavanda esvoaçando em janelas escancaradas, produzindo o som do silêncio na natureza, primitivo e tão confortável. Tudo ativa na memória tempos de um passado de alegrias infantis, leves na alma e no sorriso que se esboça. A isso dá-se o nome de Sensações em arquitetura.

A feitura de cada objeto edificado tem na história um acumulado de conhecimentos para cada um dos quatro cantos do planeta, desde a condição climática até a história e manias de cada povo. Seguir na empreitada de erguer ou descer qualquer construção requer o acesso a tais conhecimentos. Da experiência vernacular até o empirismo das tecnologias emergentes, todo aquele que projeta e executa deve acessar o imenso arquivo de saberes locais e universais, pois estes balizam e viabilizam seu ofício. A isso dá-se o nome de Técnica em arquitetura.

Tudo aquilo que ao final daqui escapou por incapacidade de vir a existir na linguagem dos homens, dá-se o nome de Arte.

A este conjunto, define-se a Arquitetura.

*Yuri Vasconcelos Silva é arquiteto

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