6:33A onda virou marola?

Por Ivan Schmidt 

A flagrante disparidade entre as pesquisas Datafolha e Ibope medindo as intenções de voto nos candidatos ao governo do Paraná, pode ser compreendida a partir da metodologia aplicada pelos citados institutos, que forçosamente tem algumas diferenças entre si. O problema é que a distância entre Beto e Requião – primeiro e segundo colocados na disputa – ficou exageradamente a favor do atual governador na pesquisa Ibope, enquanto no Datafolha fora bem menor.

Insisto na tese de que cada instituto adota metodologia própria, muito embora seja também aceitável supor que para apurar resultado confiável em pesquisa de opinião, qualquer que seja, os métodos usados podem divergir em pormenores, mas jamais a ponto de por em risco a inflexibilidade da ciência estatística. Aí se caracteriza a fraude.

Para descontrair lembro pesquisa feita anos atrás em pequena cidade do interior dos Estados Unidos, na qual se descobriu que 50% dos alfaiates eram portadores de câncer. Só mais tarde é que se soube que na cidade havia apenas dois moradores que se dedicavam a essa profissão e um deles estava doente.

Beto foi citado por 43% dos eleitores que responderam ao questionário do Ibope, Requião por 26% e Gleisi Hoffmann por 14%. É de convir que a diferença entre Beto e Requião (17 pontos percentuais) foi desnorteante para o candidato do PMDB, que iniciou a corrida eleitoral com a aura rejuvenescida pelo êxito da manobra de profissional da política que lhe garantiu a candidatura ao governo, quando a cúpula da executiva regional optava pelo apoio à reeleição do governador.

Surpreendente é verificar que não houve nesse curto período nenhuma ação espetaculosa da administração estadual, precedida de anúncio de projeto de impacto evidente sobre a sociedade, que pudesse elevar de modo tão mercurial a preferência pelo seu nome.

A soma do percentual de votos em Requião e Gleisi (40%), caso a eleição fosse hoje, levaria a disputa para o segundo turno, cuja projeção não foi prospectada ou revelada pelo Ibope. Pelo cenário atual que poderá se alterar nas próximas pesquisas é previsível que a luta pela maioria exigirá dos contendores uma competência acima da média. Coisa que até esse momento nenhum dos candidatos foi capaz de exibir.

A exposição acima é factível, tendo em vista a tradição de apoios mútuos entre PMDB e PT. Diante do sofrível desempenho da petista Gleisi Hoffmann, sobre quem tiveram efeito destruidor os estilhaços das sandices cometidas por nomes importantes de seu partido, somente um milagre poderá fazê-la avançar para o segundo lugar e postar-se como alternativa para o embate final. O mais provável é que Requião seja o adversário de Beto na segunda rodada e, nessa condição, venha a ser favorecido pelos votos do eleitor cativo do PT, cujo perfil ideológico está mais afastado das propostas de Beto do que a lua da terra.

Outra constatação obrigatória advinda de análise superficial da idiossincrasia do eleitor paranaense, extremamente conservadora, é que a preferência pela manutenção do atual governador no Palácio Iguaçu decorre também do fato de que o PSDB arvora a bandeira da social-democracia apenas no nome, embora sua prática usual esteja claramente pautada pelo neoliberalismo. O PT, no entanto, por princípio um partido de esquerda, acabou preferindo o abrigo do centrão.

A primeira pesquisa Ibope foi também madrasta para Requião e Gleisi, que tiveram o desprazer de constatar os maiores índices de rejeição, 30% e 20% respectivamente, configurando um quadro surreal de mais rejeição do que votos. Brancos, nulos e indecisos somam 15% dos eleitores, percentual a ser levado seriamente em conta na estratégia de campanha desses candidatos, pois lá na frente ele poderá ser determinante na contagem dos votos. Basta lembrar a vitória de Requião sobre Osmar Dias por escassos 10 mil votos, na conquista do terceiro mandato.

Teria se diluído a alardeada “onda Requião”, detectada por muitos ainda na fase da pré-campanha? A velha flama demonstrada pelo senador desafiado pelas circunstâncias a encarar e derrotar os vendilhões de seu próprio partido, com os quais está às turras até hoje, teria perdido o embalo?

É natural que o clima de desavença criado pelo estilo trator de Requião na obtenção do direito de ser cabeça de chapa do PMDB ao governo, esteja agora cobrando um preço alto do ex-governador. Um dos graves efeitos colaterais é a disputa na Justiça Eleitoral para saber qual é a facção que efetivamente comanda o diretório estadual. E, por quanto tempo. Aliás, os chaveiros da área próxima à sede do partido, na Vicente Machado, constituem a profissão mais valorizada de momento.

No alentado currículo de Requião há um capítulo reservado a ex-amigos e apoiadores, uma lista apreciável. O primeiro nome é o de José Richa, que no início de seu governo se licenciou para mergulhar na campanha dos candidatos do PMDB às prefeituras dos municípios da faixa de fronteira e de Curitiba (Requião). O partido elegeu os prefeitos dos 12 municípios tidos como de segurança nacional e da capital. Richa pai argumentava no seu proverbial bom humor, que “havia dado zebra”, valendo-se do bordão usado no Fantástico ao se referir aos resultados inesperados nos jogos da loteria esportiva.

Quando veio a sucessão do governador Álvaro Dias, o PMDB lançou Roberto Requião e este passou todo o primeiro turno atacando e caluniando José Richa, a quem invectivava de marajá das aposentadorias.

Depois vieram o próprio Álvaro, que foi um gigante na campanha, seu irmão Osmar e mais recentemente o ex-governador Orlando Pessuti, o fiel escudeiro Doático Santos e os deputados Caíto Quintana, Luiz Cláudio Romanelli e Alexandre Curi, entre tantos outros.

Ao que se sabe Requião está praticamente isolado em seu partido e, como conseqüência, na campanha. Nos grandes e médios municípios o partido já não consegue eleger o prefeito há décadas, fazendo com que os apoios se desvaneçam. Restam os grotões, como dizia Tancredo Neves justificando a infindável fieira de vitórias da antiga Arena (mais viva do que nunca), mas nem aí há garantia de votos porque prefeito de pequeno município não tem como resistir ao poder de sedução do governo.

Há pouco mais de um mês para virar o jogo e garantir o segundo turno, considerado o caminho preferencial do estímulo ao voto consciente e comprometido com o futuro do Paraná. Nesse contexto duvido que a oposição tenha tal capacidade.

Compartilhe

Uma ideia sobre “A onda virou marola?

  1. Dinarte

    Análise perfeita. Lúcida, racional, destemperada com qualquer ranço ou viés partidário. Mas Requião não sabe perder, por isso devemos esperar alguma iniciativa dele. Não sei se existe sorte, macumba, oportunismo, ajuda divina, ajuda do tinhoso… seja lá o que for. A trajetória de RR já foi brilhantemente descrita pela Ivan Schmidt. Podemos acrescentar que no segundo e terceiro mandatos, pegou carona com Lula. Embora, depois de eleito, passasse a criticar o então presidente. Foi ajudado por Richa Pai, por Álvaro Dias, pelo FERREIRINHA (que destruiu o favorito Martinez), por Lula e pelo destino, ao ganhar de Osmar Dias pelos ínfimos 10.000 votos. Ah, sim, ele, Requião, que gosta de criticar pesquisa, foi, de certa forma, beneficiado por ela na última eleição para o Senado, quando se elegeu com vantagem inferior a 2% em relação a Fruet. A pesquisa mostrava vantagem superior a 20%. Enfim, RR é um predestinado! Não poderia ter construído a carreira que construiu no Paraná, mas democracia com grotões é isso mesmo.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.