6:04No toga da mironga do kabuletê

Há bandidos de toga? Sim.  Eliana Calmon, corregedora do Conselho Nacional de Justiça, tocou o dedo na ferida ao afirmar isso há alguns anos e foi torpedeada de todas as formas pela classe. Na semana passada foi confirmado o caso a que ela se referia de um juiz de Tribunal de Justiça de São Paulo – e ninguém saiu para aplaudi-la ou pedir desculpas.

Num país injusto como o nosso, desembargadores e juízes parecem ungidos por um dom divino que os fazem pairar acima do bem e do mal como se a capa preta que usam desse esse tipo de poder, quando na verdade deveriam calçar as sandálias da humildade e agradecer pela missão mais que nobre que têm na sociedade.

Bandidos há em qualquer classe, peitos de pombas e queixos apontados para o céu também, mas o que é delegado pela estrutura de uma democracia não deveria servir para que nenhum dos poderes, principalmente este, o da Justiça, servisse de benefício aos integrantes desta classe. Muito ao contrário, o exemplo deveria partir deles.

A concessão do auxílio-benefício requerido pelo Tribunal de Justiça do Paraná, aprovado em março pela maioria dos deputados estaduais e sancionado pelo governador Beto Richa é dessas atitudes que arranham ainda mais a credibilidade de desembargadores, juízes, enfim, da Justiça no Paraná, ela que tem sido abalada constantemente por escândalos como o da construção do prédio anexo e, mais recentemente, pelos fatos que culminaram com a saída do presidente, desembargador Cleyton Camargo, seis meses depois de ele tomar posse. Como se sabe, antes disso, o filho dele, Fabio Camargo, ex-deputado estadual, foi eleito pela Assembleia conselheiro do Tribunal de Contas como fruto de uma pouco explicada manobra que envolveu também o governo do Paraná. Resultado: o conselheiro foi afastado do cargo pelo STF e corre o risco de perder o cargo.

A aprovação e sanção da lei não entrou em vigor. O Tribunal de Justiça demorou quase quatro meses para anunciar, em ato publicado no Diário Oficial, que ele só não será pago a quem mora em residência oficial. Isso quer dizer que a maioria dos desembargadores e juízes receberão 15% limpos de seus vencimentos por essa ajuda de custo que, na verdade, é uma maneira de aumentar o salário sem infringir as normas – mas infringindo as do bom senso.

O custo para os cofres públicos está estimado em R$ 32 milhões por ano. A Associação dos Magistrados rapidamente tentou justificar o injustificável afirmando que o auxilio é dados em vários estados e que os juízes merecem ganhar bem, assim como profissionais liberais. Seria perfeito se não fosse um pequeno detalhe: não é com o dinheiro do contribuinte que se pagam benefícios e salários a profissionais liberais e estes não recebem benefícios através de leis urdidas e aprovadas por conta do compadrio dos poderes que, por acaso, no Paraná, têm suas sedes separadas apenas por alguns metros. Mais: qualquer profissional liberal que trabalhar para empresa privada pode ser demitido se assim o patrão desejar ou se ele cometer alguma falha – coisa difícil de se ver numa classe que, além de pairar sobre as outras, se protege como nunca.

Para completar, o Ministério Público do Paraná, cujos promotores deveriam zelar para defender os interesses da sociedade que também lhes paga os salários, já manifestou o desejo de também receber o tal penduricalho.

O anúncio do Tribunal de Justiça, feito às vésperas do jogo da Seleção Brasileira contra a da Colômbia, sugere que a data foi escolhida para se misturar à expectativa e, depois, comemoração pela classificação às semifinais. A emenda foi pior do que o soneto. Tal ato, condenável, apesar de estar dentro da lei, como se defende a classe, só reforçou a ideia de que, em questão de justiça, os togados entoam a oração do “venha a nós o vosso reino e o resto que se exploda”.

*Publicado no site A Gralha (www.agralha.com.br)

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3 ideias sobre “No toga da mironga do kabuletê

  1. Vinhoski

    Um curso de direito, um concurso público (em alguns casos, desnecessário), um bom padrinho, além da soberba de participar de uma espécie pavonesca, lhe garante a certeza de ser um ser superior aos outros, totalmente desligados da escumalha.

    Não é à toa que togados vociferam com requerentes que se apresentam de havaianas ou que lhe negam o arquivamento de um caso de roubo de galinha ( o Fux do STF). Eles são como a divindade da mitologia Zeus, disfarçados de graciosos cisnes, mas no fundo mesmo só querem f***r.

  2. CURITIBANO ROXO

    Enquanto isso acontece, os processos ficam engavetados durante meses ou anos nos tribunais esperando resoluções do judiciário.

  3. toledo

    Eu gosto mais de Juiz de Futebol e dos Bandeirinhas. Esses de toga eu tenho medo e confio mais nos ladrões.

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