16:39O leilão e o pato

por Jamur Jr

No tempo em que Guaratuba era uma pequena vila, com  população que cabia numa balsa, não tinha médico, não tinha padre, não tinha estrada, não tinha veranistas, não tinha quase nada. Mas tinha uma gente alegre, feliz e divertida. Tinha baile no Salão do Belo, outro no Três Paus e  fandango em algumas casas mais distantes (cerca de 500 metros quando muito) e a grande festa do Divino Espirito Santoque lotava a praça da igreja no  mês de julho. Antecedendo o grande dia, os fieis se reuniam na igreja de Nossa Senhora do Bonsucesso para rezar o terço. Como não tinha padre, que só vinha no dia da festa, quem comandava o evento era um Rezador de Terço. Se destacava um descendente de escravos,  Antônio Margarida, bom de reza e bom benzedor. É verdade que em alguns momentos ninguém entendia direito o que o rezador dizia. Ele falava meio enrolado, rezava muito rápido e dava a impressão de que improvisava alguns trechos de orações. Nas ruas o som da rebeca, do adufo e o tambor se misturavam com as vozes dos cantadores que visitavam os fieis levando a bandeira do Divino. No dia de grande festa o ponto alto e mais popular era um leilão onde surgia todo tipo de prendas doadas por membros da comunidade. Uma galinha, um lampião com querosene, um peru, um pato, um corte da cambraia. O leiloeiro oficial era Joaquim Jorge, um morador do Cabaraquara, na região onde hoje está o Iate Clube de Caiobá. Joaquim tinha uma voz forte, que era ouvida em toda a praça, sorria muito e alegrava o final da festa. Contam que em certa ocasião foi surpreendido por “uma das prendas”. Anunciou o leilão de um pato e ao fazê-lo levantou “a prenda”, para que todos os presentes vissem o agitado pato. Nesse momento, uma pequena distração e o pato saiu voando pelo meio dos fieis presentes. Nas primeiras batidas de asas soltou uma vingança maligna na forma de cocô com  parte do que havia almoçado. Antes de desaparecer num quintal vizinho, o pato acertou um cidadão vestido elegantemente com com terno de linho branco, camisa branca e gravata vermelha. A distribuição do que veio do alto foi perfeita; a parte escura ficou no paleto branco e uma parte meio branca atingiu a gravata vermelha. O pato cagão foi motivo de muita risada e ficou na história pela bela decolagem na frente do leiloeiro e a excelente pontaria na retaguarda.

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