8:06Não ia ter Copa

por Ruy Castro

Não ia ter Copa, lembra-se? Cinquenta desajustados mentais em cada cidade exibiam cartazes com esses dizeres e, misturando-se a manifestantes com reivindicações legítimas e específicas, atreviam-se a falar pelos milhões de brasileiros que gostam de futebol. E, por quase um ano, valendo-se da nossa incapacidade para cumprir prazos, respeitar orçamentos e prover segurança, fizeram parecer que seu mote ganharia quorum para se tornar realidade.

Nós, da mídia, fomos essenciais para esse pessimismo, denunciando a Fifa como Estado invasor, o fracasso na preparação da infraestrutura exigida para receber os visitantes e a diferença entre o custo estimado dos estádios e o custo real –embora não me lembre de nenhuma reportagem dizendo para onde foi o dinheiro. O “Imagina na Copa!”, que começou como uma brincadeira, tornou-se a sentença para a nossa inabalável vocação para o subdesenvolvimento.

A revolta ficou ainda maior ao se constatar que, pela configuração dos estádios, o preço dos ingressos e a escolha de certas cidades-sede, esta seria uma Copa de e para as “elites” –triste ironia sabendo-se que fazia parte do plano de um governo “popular” para eternizar-se no poder. Como se fosse pouco, veio o desgaste do dito governo, provocado pela economia pífia, a corrupção comprovada e o cansaço do discurso oficial. A Copa, em certo momento, parecia simbolizar toda uma farsa. Era inevitável que entrasse na agenda dos protestos que começaram em junho de 2013.

Desde então, nada mudou –os problemas continuam. E, magicamente, tudo mudou. Com ou sem Fifa, governo ou manifestantes, nada deu tão errado quanto parecia e tudo está dando mais certo do que deveria.

Será, está sendo, uma Copa inesquecível –na vibração dos torcedores, nos sorrisos dos visitantes e na alegria das crianças.

*Publicado na Folha de S.Paulo

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