7:55Sócrates Brasileiro, Elifas Andreato e o alcoolismo

Do livro “Sócrates Brasileiro”, escrito por Kátia Bagnarelli (com a ajuda de Regina Echeverria). Ela foi a última mulher do “Doutor”, e narra os últimos tempos dele. O trecho que segue é a transcrição de uma entrevista dada ao “Magrão” pelo artista plástico Elifas Andreato, que por acaso nasceu no Paraná. Nele Elifas fala da sua luta para controlar o vício do álcool. Como se sabe, infelizmente o entrevistador perdeu essa batalha. (Célio Heitor Guimarães)

… Naquele momento nós demos um tempo, que corresponderia ao break do programa, para que eles cumprimentassem o jornalista José Trajano que havia chegado naquele momento. Ele era nosso próximo entrevistado. Eles se abraçaram e pedi para que se posicionassem para prosseguirmos. Câmeras ligadas. Foi quando o Elifas começou a falar sobre alcoolismo:

No meu período de bebedeiras, eu estava me destruindo mesmo.

Sócrates interviu:

– E foi “brabo” isso mesmo?

– Foi. Foi sim. Eu não sei se a proximidade do fim, se a finitude de repente mexeu comigo, eu não sei. Eu bebo, bebi há muitos anos, mas nos últimos 15 anos eu bebi muito e chegou num ponto em que eu estava jogando tudo fora, cara. Foi um processo de destruição que primeiro me fazia tremer, depois eu tinha apagões, depois isso me levou a não dar nenhum valor ao que eu tinha conquistado e então um dia eu disse: “Não!” Eu tenho duas netinhas que estão começando a viver, são as filhas do Bento, enfim, então decidi que eu quero viver um pouco mais e pensei: “Eu não posso me entregar dessa maneira!” Comecei a considerar: vai ser difícil? Vai. Mas eu enfrentei tantas dificuldades antes, por que é que eu não vou enfrentar o álcool agora? E dali eu fui para os Alcoólicos Anônimos e deixei de beber.

– Como funcionou para você? Onde você encontrou forças?

– É o apoio. Você encontra lá de tudo e ao mesmo tempo você tem espelhos e todas as histórias são muito parecidas; ali você tem empregada doméstica, motorista de caminhão, médicos, advogados, juíz, jornalistas, artistas, enfim…

– Não se escolhe classe social…

– E é muito simples e barato, não custa nada, não é? E o que funciona primeiro é a tua decisão. É fundamental que você decida porque o AA não te obriga a fazer coisa nenhuma, nem a parar de beber, mas é um programa muito simples que te dá um baita apoio e o apoio tem um período em que você faz uma espécie de autoanálise compartilhada até o momento em que você decide que é doente e que, como qualquer doença, ela é para sempre e é letal; porque tomei na decisão de parar de beber aquilo que eu ainda posso fazer, estou com 65 anos e lembrei que quando nasceram meus filhos meu pai era alcoólatra e eu disse a ele: “Pai, agora você tem uma motivação, veja crescer seus netos, me ajude nessa tarefa, você foi tão ausente na minha vida, eu acabei assumindo suas responsabilidades, eu acabei criando seus filhos”. Enfim, ele disse que não, que nada mais interessava, que ele só se interessava mesmo pelo prazer que ele tinha em estar do jeito que estava. E morreu assim.

– Morreu jovem? – perguntou rapidamente Sócrates.

– Com a minha idade. Eu me considero jovem.

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