8:20À ex-secretária Jozélia, com respeito

por Célio Heitor Guimarães

 

Uma das preocupações constantes nos últimos encontros que alguns ex-funcionários do Tribunal de Justiça do Estado – inativos por tempo de serviço e merecimento – mantêm em torno de rodadas de um bom capuccino vinha sendo a (ex) secretária da Fazenda estadual Jozélia Nogueira.

Para quem não sabe, esclareço: antes de ingressar na Procuradoria Geral do Estado, Jozélia integrou o quadro de pessoal do TJ/PR. E quem com ela trabalhou ou conviveu só guardou boas recordações. Servidora dedicada, séria, estudiosa e competente, revelou desde logo grande talento para a Administração Pública. Prova é a carreira que fez e está fazendo na PGE.

Daí a apreensão dos velhinhos:

– Sinceramente, não sei o que aquela menina foi fazer lá na Fazenda – lamentou, com sinceridade, um dos cultores da rubiácea, que não só foi colega de Jozélia no Judiciário como com ela participou, posteriormente, de encontros e simpósios destinados ao aprimoramento da atividade pública.

Faço outro esclarecimento: o acima referido “menina” justifica-se pelo fato de que todos os frequentadores da roda semanal de cafezinho já terem ultrapassado a barreira dos sessenta ou estarem quase lá.

– Jozélia é uma entusiasta da Lei de Responsabilidade Fiscal, conhece-a como poucos e a defende com a própria vida, se preciso for – exagerou o mesmo interlocutor.

Pois era aí que morava o perigo. Jozélia Nogueira deixou a secretaria da Fazenda exatamente pelas suas virtudes, entre as quais a coragem, a sinceridade e o extremo cuidado com as finanças públicas.

– Apesar de tantas qualidades, parece que ela continua muito ingênua – emendou outro participante da roda.

Tinha alguma razão. Jozélia já tivera uma experiência não muito agradável durante o governo Requião. O fato não foi surpresa para quem conhece o Zorro das Araucárias. Só para a própria Jozélia, que se imaginou capaz de injetar um pouco de juízo na cabeça do ex-governador. Não conseguiu e ainda foi desrespeitada publicamente por sua majestade. Pediu o boné e deixou-o  esbravejando sozinho.

Agora, trocou a truculência pela tibieza e pela insinceridade.

Quando o “xoque de jestão” – como tão bem o definiu o brilhante Celso Nascimento – do menino Richa derrubou o secretário Hauly e as finanças do Estado ameaçavam descarrilar de vez, eis que o nosso garboso governador convocou outra vez a competente gestora. O pequeno Beto prometeu-lhe carta branca. E Jozélia acreditou.

Jozélia chegou para fazer o que lhe pediram: botar a casa em ordem. Levou a sério a tarefa. Apenas não sabia que a seriedade não devia ser tanto assim. Fez o que qualquer dona de casa zelosa faz quando falta recursos: refez os cálculos, cortou despesas, listou prioridades, prorrogou pagamentos. Mas quando voltou-se a respirar no Palácio Iguaçu e o trem administrativo começou a ser recolocado nos trilhos, eis que o governo débil, tíbio e incapaz, que já quebrara o Estado e se tornara refém de políticos mal-acostumados e pouco republicanos e do Judiciário, assustou-se com a proximidade das eleições. Alguma coisa precisava ser encenada, ainda que sem maior consistência, como de praxe. Sobrou para Jozélia. Ela passou a ser a culpada da falta de dinheiro, da paralisação de obras, do não-pagamento de fornecedores, do sucateamento das viaturas policiais e dos ônibus escolares, do péssimo estado nas escolas, do miserável salário da maioria do funcionalismo e até da apropriação indébita de depósitos judiciais pelo Executivo… A gota d’água que faltava caiu quando a secretária, com argumentos técnicos e sólidos, posicionou-se contra a concessão do tal auxílio-moradia aos magistrados, coisa de R$ 4 mil por mês por cabeça, muito mais do que a remuneração total percebida pela maioria dos brasileiros.

Jozélia aproveitou o feriado de Carnaval para submeter-se a uma cirurgia de hérnia de hiato. O menino Richa foi veranear no Caribe. Ao regressar ao Centro Cívico, bronzeado e faceiro, anunciou a substituição da secretária Jozélia. Sequer lembrou-se de que se não fosse ela o funcionalismo estadual ainda não teria recebido o 13º salário do ano passado.

Assim é a vida na Praça N. S. de Salete. E uma coisa é certa: na próxima reunião dos velhinhos do TJ/PR não mais haverá preocupação com a secretária Jozélia Nogueira. Ao contrário, várias rodadas de um caprichado capuccino serão servidas em sua homenagem. Com direito a pão-de-queijo.

Um forte abraço, menina.

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3 ideias sobre “À ex-secretária Jozélia, com respeito

  1. ladismara teixeira

    O comentário rende homenagem mais que merecida à nobre procuradora, competentíssima em sua carreira e brava defensora da destinação correta e vinculada dos recursos públicos. Quem perdeu foi o Estado.

  2. Auditor-Ctba

    Nada contra essa crônica em homenagem a Jozélia. O problema é que ela aceitou uma Secretaria de Estado sem ser da área. Deixar de pagar todas as contas para pagar o 13 salário não é nada extraordinário. Essa é uma operação básica. O diferencial seria buscar alternativas para superar esse momento difícil. Quer um exemplo: desde quando assumiu a Sefa, o ex-Secretário Hauly encontrou um cenário desolador.Mesmo assim ele valorizou os profissionais, adotou medidas importantes e elevou a arrecadação em 13% num período adverso da economia. Ele também formulou o Paraná Competitivo com resultado extremamente positivo, entre tantos projetos que criou. Como Deputado Federal e economista ( especialista em finanças públicas), ele conciliou o técnico e o político e sempre adotou alternativas.

  3. Jeremias, o bom

    O texto de CHG sobre a ex-secretária Joselia reforça a percepção de um paradoxo: em geral as pessoas sáo punidas não pelos seus defeitos mas pelas suas virtudes.
    É o que se deu, na espécie.

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