7:10Morre o homem, fica a historia

milton cavalcanti

Milton Cavalcanti – Foto publicada no blog do JJ

 

por Célio Heitor Guimarães

 

Morreu Milton Cavalcanti e poucos se deram conta disso, especialmente na imprensa escrita desta Província de Tindiquera. Luiz Geraldo Mazza, ex-companheiro de jornal e de IPM de Milton, fez referência; Aroldo Murá, notório liberal, que tinha tudo para omitir-se, registrou o acontecido com isenção e fidalguia, destacando a importância de Milton para o país; mas o grande destaque foi dado pelo bom João José Werzbitzki, jornalista e publicitário, que passou a escrever no Brasil Post, iniciativa jornalística virtual do Grupo Abril, em sociedade com o The Huffington Post, considerado o maior jornal online do planeta. E foi só.

Não obstante, Milton, pernambucano de nascimento, 88 de idade, foi figura marcante não apenas do jornalismo brasileiro, mas na vida pública nacional. Chegou a Curitiba, no final dos anos 50, para estudar engenharia na UFPR (embora nunca tenha se formado). Foi líder estudantil, com grande atuação entre os jovens universitários. Depois, ingressou no jornalismo e atuou na assessoria de Relações Públicas da Copel. Mas ganhou mesmo realce quando presidiu o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Paraná, cargo do qual foi apeado pelo golpe militar de 1964.

Atuante, combativo, culto e profundamente inteligente, Milton sabia escrever com correção e estilo. E manejava uma Rolleiflex como profissional. Era também grande figura humana, bem-humorado, bom de papo, bom amigo e de agradável convívio. Estivemos juntos no Última Hora e não me consta que ele tivesse sido um perigoso “agente de Moscou” ou que o jornal fosse um “covil de comunistas” comedores de criancinhas.

Milton nunca escondeu a sua condição de esquerdista, preocupava-se com os problemas sociais e econômicos do país. E nesse sentido foi à luta. Defendeu o seu ideal com ardor e sinceridade e sofreu as consequências disso. Mas era respeitado e admirado pelos próprios adversários. Enfrentou com coragem processos na justiça militar e de todos saiu com impoluta dignidade.

Além de Última Hora, Milton Cavalcanti foi correspondente no Paraná da conceituada revista Visão, especializada em assuntos econômicos. Depois da tormenta de 64, foi técnico do Banco de Desenvolvimento Econômico do Paraná e assessor da diretoria da Binacional Itaipu, então presidida por Ney Braga. Além de – como lembra o também jornalista e também ex-integrante da equipe de Última Hora Cícero Cattani –, “um expert em cozinha baiana, capaz de fazer um vatapá de comer ajoelhado”.

“Pena que a morte de Milton Cavalcanti não tenha merecido mais do que 2 ou 3 linhas do maior jornal do Paraná, que muitas vezes foi alimentado pelos textos dele” – lamenta, coberto de razão, J. J. Werzbitzki.

A explicação é dada por Aroldo Murá: “As novas gerações que atuam com papel decisivo na mídia poucas vezes têm interesse em ir a fundo em torno de quem, como no caso de Cavalcanti, foi importante para o país”.

O fato remete-me a outro “mastodonte” do jornalismo paranaense, também ex-integrante dos “perigosos” da velha Última Hora, Milton Ivan Heller. Certa feita, perguntei ao velho jornalista, o que ele achava dos novos redatores dos jornais. Respondeu-me de bate pronto: “São tão bem informados que, quando morrer o Ney Braga [foi antes disso], serão capazes de escrever: ‘parece que foi governador do Paraná’”.

 

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2 ideias sobre “Morre o homem, fica a historia

  1. Z.

    As escolas de jornalismo, há algum tempo, formam “técnicos em notícia” e não jornalistas na acepção literal da palavra. Entram no curso já afoitos pela prática e toda a formação humanística e social (essencial à formação de um bom jornalista) é esquecida e relegada pelos próprios cursos.

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