7:26…e ninguém toma providência!

por Célio Heitor Guimarães

 

O jornalista e escritor Carlos Heitor Cony está de volta ao batente, depois de um piripaque que o levou ao hospital no mês de outubro. Andou levando um tombo doméstico, que lhe causou leve traumatismo craniano e um pequeno hematoma cerebral. Devidamente restabelecido, reassumiu a coluna que assina no jornal Folha de S.Paulo. E continua sendo comentarista de generalidades na rádio CBN.

 

Dias atrás, valendo-se da celeuma causada pelas biografias não-autorizadas, Cony confessou que, no dia em que pensar em memórias, pretende escrever um robusto ensaio histórico intitulado “Cony e seu Tempo”. Deverá ser assinado por um pseudônimo e a escrita não focalizará o personagem em si, mas o tempo em que ele viveu. Diz que vai inventar um autor que, com uma dose bastarda de informação e conhecimento, procurará interpretar a vida de um pobre coitado que se espalhou por aí, no tranco da vida.

 

Ex-seminarista, Carlos Heitor Cony foi um grande jornalista (hoje, além de frequentar a Academia Brasileira de Letras, limita-se a publicar artigos na imprensa), sempre escreveu bem, foi crítico literário, mas notabilizou-se por enfrentar a ditadura, nos primórdios de 1964, com corajosos e atrevidos textos no extinto Correio da Manhã, do Rio, fato que o levou para trás das grades. Depois, dirigiu publicações da dimensão de Manchete, Fatos e Fotos e Ele Ela, e escreveu alguns livros de qualidade indiscutível.

 

Mas Cony é, sobretudo, um grande contador de histórias. Lembrei-me hoje de uma em especial, contada por ele ao escritor neoparanaense José Castelo. É a história do Aragão.

 

Cony narrou que, quando estava no Jornal do Brasil, apareceu lá uma senhora dizendo que precisava de ajuda. Ela era diretora do Hospício Engenho Novo dedicado aos pobres e indigentes, e queria que o pessoal do suplemento dominical, cujo forte eram as artes plásticas, fizesse uma matéria sobre uma exposição das pinturas dos loucos. Mário Pedrosa, que era um grande crítico teatral e chefiava a moçada, topou a parada e comandou todo mundo rumo ao Engenho Novo. Lá chegando, passaram em revista os quadros todos. Até que Mário empacou diante de um em especial e proclamou: “Esse aqui é um gênio, um Cèzane…”. Convocaram o autor. Era um tal de Aragão.

 

Pedrosa, que tinha os contatos dele, comunicou-se com o então ministro da Educação e foi feita uma exposição do Aragão, lá no Ministério, aquele edifício projetado pelo Niemeyer, com azulejos de Portinari, no Rio de Janeiro. Vendeu tudo. O Aragão, então, segundo o Cony, pediu baixa do hospício, fez a barba, cortou o cabelo e se mandou para a Europa. Esteve na Espanha e na Itália.

 

Por três anos, ninguém soube dele. Até que um dia chega novamente no jornal aquela mulher:

 

— Olha, eu vim aqui outra vez por uma coisa muito chata. O Aragão…

 

E enquanto Cony e seus colegas pensavam que ele estava rico, famoso, ela completou:

 

— … está na pior, preso numa cela solitária, não pode sair. Está furioso. Vocês dão uma palavrinha com ele?

 

E lá foram Cony e o pessoal do jornal.

 

— Aragão, você é um pintor! – disse Mário Pedrosa ao Cèzane do Engenho Novo. “Não pode ficar assim, tem de voltar a pintar”.

 

Aragão olhou para o Mário e respondeu de bate pronto:

 

— Eu pintei. Mas ninguém tomou providências…

 

Diz Carlos Heitor Cony que com ele, como de resto com todos os escritores e jornalistas, ocorre mais ou menos a mesma coisa:

 

— A gente escreve, escreve, escreve e ninguém toma providências!

 

Pois, sem a menor pretensão de comparar-me com o mestre ou com qualquer outro cultor da escrita, peço licença a Cony para usar também as sábias palavras do Aragão.

 

Há dois anos e nove meses, desde fevereiro de 2011, tenho ocupado espaço neste blog. Tenho dado os meus palpites, criticado gregos e troianos, com especial predileção pelos poderosos de plantão, no Executivo, Legislativo e até no Judiciário; na esfera municipal, estadual e federal…

 

Tenho feito provocações, usado de sutileza e de ironia e sido até, às vezes, excessivamente atrevido, confesso…

 

E o meu querido editor, Roberto José da Silva, o Grande ZB, não toma nenhuma providência, puxa vida!…

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