17:16Para Nilton Santos

Nunca alguém tratou a bola com tanto carinho como ele. E ela, dócil, correspondia. Um dia perguntaram a Nilton Santos porque tanto chamego. Ele, do alto da sua sabedoria, respondeu: “Para ela não me trair”. Pergunta-se como a bola iria trair um jogador e um homem como ele, um jogador fiel ao seu Botafogo, um craque exuberante, discreto e correto fora de campo, estampa de encher os olhos nas figurinhas, nas fotos, nos gramados do mundo, principalmente o do Maracanã? Nilton Santos não precisava ser visto atuando para enfeitiçar os amantes da arte do futebol. Bastava uma foto, uma imagem, um lance como o do gol na Copa de 58 quando ele disparou para frente para marcar um gol com a classe dos gênios, dando um toquinho tipo cavadinha para encobrir o goleiro e calar o técnico Vicente Feola que gritava para ele voltar para a sua posição. Ele inaugurou assim a nova função dos laterais, hoje chamados de alas. E o incrível sangue frio e sagacidade que mostrou naquele lance da Copa de 62, contra a Espanha, jogo difícil, quando fez pênalti ao ser driblado por um atacante e, ao ver a distração momentânea do juiz, deu um passo à frente, braços abertos, e apontou o chão para mostrar que tinha feito a falta fora da área. Brasileiro até o tutano da alma, com a humildade dos grandes, sempre tranquilo ao dar as entrevistas, nunca afetado pelo apelido de “Enciclopédia do Futebol”, ele que foi muito mais que isso pois formou um time onde era rei na defesa e tinha como companheiros Didi no meio-campo e Garrincha no ataque. Querem mais? A história de seu primeiro encontro com o Mané entrou para a história do futebol desse Brasil que não sabe valorizar seus patrimônios humanos, seus artistas fenomenais (no fim da vida, ele teve de vender seu acervo pessoal para bancar tratamento de saúde). O menino das pernas tortas entrou para jogar no time reserva e não quis nem saber quem era o marcador. Driblou uma, duas, três vezes até que Nilton Santos parou o treino e pediu para o técnico colocar o endiabrado no time titular porque não estava a fim de passar vexame. Hoje é um dia triste para o futebol brasileiro e mundial. Um dia triste para quem ama a bola como o mestre Nilton Santos amou e tratou.

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2 ideias sobre “Para Nilton Santos

  1. Célio Heitor Guuimarães

    Não por acaso era chamado a “Enciclopédia do Futebol. Sabia tudo, dentro e fora de campo. Mas, sobretudo, era um grande caráter, bom amigo, companheiro de todas as horas, sempre com uma palavra de incentivo e orientação aos que se iniciavam na arte da bola. Será pouco, muito pouco, o minuto de silêncio que lhe oferecerão nos estádios. Vai fazer muita falta. Aliás, já está fazendo.

  2. jango

    Você disse o essencial, Zé Beto.
    Não há quem não se defronte com Niltão que não passe a admirá-lo.
    Aquele gol contra a Áustria lembro até hoje, jogo duro, Brasil com dificuldade, de repente, usando de seus recursos enciclopédicos, Niltão nos fez soltar todos os pulmões em alegria de gol.
    E era a quele gol gostoso que vinha pelas ondas do rádio.
    Eu era garoto e não esqueço até hoje.
    Por que será?

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