9:14Um nome guardado

por Janio de Freitas

 

No dia em que for contada a história verdadeira dos fatos cuja versão predominante prestou-se ao chamado julgamento do mensalão, entre outros possíveis personagens novos estará ao menos um que, por si só, muda a configuração e a essência da história conhecida.

Duas observações urgentes aqui. A primeira é de que não me refiro a Lula, como o personagem de relevância especial.

A outra é a de que não conheço os fatos completos. A partir de duas inserções breves e bastante sutis, que me foram dirigidas em conversas diferentes há poucos meses, passei a rever muitas anotações feitas desde o começo do caso mensalão, interrogatórios, depoimentos e conversas memorizadas ou com pontos focais por mim registrados. Nada de excepcional no trabalho de jornalismo.

Como também consigo ser sutil às vezes, foi desse modo que testei minha constatação com um dos que poderiam derrubá-la. Sobreviveu. E, se não posso expô-la por motivo legal, basicamente falta de prova objetiva e firme, posso dizer com convicção: a cada vez que cruzarem a porta de sua reclusão, José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares estarão levando o segredo de um nome e de fatos que não quiseram mencionar. Ou, na linguagem vulgarizada pela ditadura, não quiseram entregar ou dedurar.

Os ministros do Supremo, como todos os juízes, julgaram o que foi submetido ao seu conhecimento jurídico e, mais ainda, às suas consciências. O mesmo não pode ser dito sobre a Procuradoria-Geral da República, que teve a responsabilidade de reunir e passar ao STF as informações e comprovações apuradas, as conclusões e suas acusações no caso. Ficou muito por apurar e muito por provar. A quem tiver curiosidade e paciência, sugiro começar pela leitura dos interrogatórios da CPI dos Correios, onde se encontra, ligeira e não explorada, uma pista (a primeira, creio) do que veio a ser um segredo por amizade, ou por companheirismo, ou por ética pessoal, com os mesmos ônus nas três hipóteses.
Civilização

Por falar no Supremo, sua sessão da semana passada sobre o mensalão não foi apenas uma das mais tensas nesse processo de divergências tensionantes. Voltou a ter ocasiões de hostilidade que desmoralizam o Judiciário e sobretudo o próprio Supremo. Além de não menos desmoralizantes posições como a recusa, com o argumento de que “é preciso acabar com este julgamento”, a reexaminar um erro grave: o réu Jacinto Lamas foi condenado a pena maior do que o chefe dos seus atos, este também autor de maior número das condenadas lavagens de dinheiro. Isso pode ser justiça emanada do Supremo? E aquele é à altura de ministros do Supremo?

Tão grande foi a balbúrdia da sessão do outrora dito “vetusto tribunal” que ao fim o ministro Joaquim Barbosa não conseguiu dizer o que fora decidido, e precisou adiar a proclamação. Impossibilidade e causa, provavelmente, sem ocorrência, jamais, no velho Supremo.

Nada disso sequer motivado por questões relativas a petistas, como em tantas vezes. Foi só desinteligência mesmo, em qualquer sentido da palavra. Com os níveis de civilidade, entre a melhor educação e o seu oposto absoluto.

OLÍMPICA

Uma exibição de eficiência real no Supremo. Na quarta-feira, a ministra Cármen Lúcia movimentou o processo penal movido contra Fernando Collor, passando-o ao revisor Dias Toffoli. Era um recorde. Na manhã daquele dia, o “Globo” publicara a manchete “Collor está próximo de se livrar da última ação no STF”. Isto porque “o processo está parado no gabinete da ministra Cármen Lúcia desde outubro de 2009 sem qualquer movimentação”. De quatro anos a algumas horas.

Tofolli não precisou de manchete, liberando prontamente o processo para votação. Mas a verdade é que a sem-cerimônia com que alguns ministros guardam determinados projetos, bem determinados, só é proporcional à rapidez com que as manchetes os apressam.

(A manchete do “Globo” por certo contrariou um terceiro ministro).

IMPUNES

Os comentaristas que veem, no caso mensalão, “o fim da impunidade” e outras maravilhas nacionais poderiam explicar o que se passa, então, com o mensalão do PSDB, que se espreguiça desde 1998, já com prescrições havidas e outras iminentes para seus réus. Também serve uma explicação sobre o jornalismo e aquele processo.

 

*Publicado na Folha de S.Paulo

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2 ideias sobre “Um nome guardado

  1. Leopoldo Heitor Barbosa

    Corretíssima essa indignação com o desfecho da Ação Penal nº 470, do Janio. Com a prisão de políticos importantes, como Dirceu, Genoíno e Delúbio, a partir de denúncias, verdadeira vingança, de um conhecido trânsfuga, Roberto Jefferson, porque julgava-se traído na armação que Carlinhos Cachoeira fez nos Correios e prendeu um de seu apaniguados, tudo num crescendo, aproveitado pela mídia e os interesses da oposição. Agora, dizer que à classe média como um todo interessa-se por esse resultado não é correto. Se falar na pequena parte da classe média encastelada nos estamentos policiais e militares, em alguns órgãos públicos e empresas estatais, que é o caso, basta acessar os locais na internet onde transitam os pensamentos dessas pessoas, e ter amigos, conhecidos e parentes que foram colaboradores para verificar o que dizem, para aquilatar essa verdade. Todos de uma forma geral serviram e serviram-se da ditadura,muitos fizeram ou foram favoráveis ao papel sujo da tortura e morte de opositores do regime, que lhes exigiam os grandes interesses do capital em nosso país,que estiveram no poder, e não perdoam o PT os petistas, que acusam de tudo, num claro ressentimento pelas derrotas que veem sofrendo nesses quase onze anos, e desejam vingança e muito mais a volta ao poder, que parece estar quase impossível,cada vez fica mais claro que caminham para quarta queda, na presente conjuntura e correlação de forças, nem através de eleições, nem muito menos através de um golpe de Estado. Fica mais odioso ainda o comportamento dessa parte da classe média, se considerarmos que o PT, petistas e aliados, conduziram a economia à estabilização, quando a receberam em desequilíbrio, aumentaram a oferta de emprego, inclusive no aparelho de Estado, porque mandaram às favas a sacanagem de Estado mínimo, imposta pela ordem neoliberal, levando a emprego imediato a quase totalidade das classes médias, inclusive seus extratos mais baixos, que estavam e seus filhos todos desempregados, dando inclusive para quererem teorizar na fajutice de nova classe média, quando na realidade era a chegada de emprego imediato para todos que tivessem mais qualificações, e aconteceu nessa última década, onde praticamente o Brasil alcançou o pleno emprego. Não vejo onde se possa respaldar a afirmação que toda a classe média esteja favorável a essas prisões e regojizando-se com as mesmas. Mesmo diante da conhecida volubilidade das classes médias, que não são confiáveis, a grande maioria apegada aos seus interesses imediatos, na procura tão somente de ascensão social, prestígio e dinheiro. Mesmo assim, não mesmo. Agora, que ficou mais do que claro que o Supremo Tribunal Federal tem seus Ministros escolhidos por forças, que não estão no poder formal, não foram escolhidas pelo voto, e, também sem votos, servem a essas forças, salta aos olhos. Está mais do que claro, não vê quem não quer. Não é lista tríplice, não é o Presidente, agora a Presidenta, nem muito menos os Senadores, que escolhem os Ministros dos Tribunais Superiores. Não sabemos quem escolhe os Ministros, mas está mais do que claro que os escolhidos sabem muito bem a quem devem o poder que passam a usufruir, e claramente a estes servem. São forças ocultas, as famosas forças ocultas. Está mais do que na hora de serem adotadas medidas para impedir a manipulação de nossos Tribunais Superiores por essas forças junto com a mídia, para que defendam e encaminhem os interesses das mesmas. Não tem sentido esse poder todo em mãos de quem o povo não escolheu, de quem não age em seu nome e interesse, sem mandato, agindo politicamente em seus pronunciamentos e mais do que isso flagrantemente aliados a políticos e à oposição e aos interesses por esses defendidos, como sempre tem acontecido, tendo ao lado a mídia que defende e encaminha os interesses do grande capital.

  2. Jeremias

    Ufa!
    Enfim textos e comentários inteligentes ainda existem neste espaço. O resto é efeito manada…

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