6:46Luluzinha para avós e netinhas

Lulu1

 

 

por Célio Heitor Guimarães

 

Acabo de reler as primeiras histórias da Luluzinha, quadrinhos clássicos de 1940 a 1950, editados pela Ediouro, através do selo Pixel, e estou em estado de graça. Literalmente. Humor simples, ingênuo, descomplicado e, sobretudo, engraçado. Que faz bem para a cabeça e para o espírito. Pelo que, recomendo-o com alegria para os avós de todas as idades.

 

Vovôs, vovós, pais e mães do Brasil, esqueçam-se dos problemas do mundo, dos políticos e dos bandidos que infestam este país, deem-se as mãos e, irmanados, corram à banca de jornais, livraria ou gibeteria mais próxima e entreguem-se de corpo e alma à leitura de Little Lulu, de Marge. Se os seus filhos e netos não estiverem mais nessa, azar deles; divirtam-se vocês.

 

Mestre Zé Beto há de compreender e desculpar-me. Que Dilma, que menino Richa, que Judiciário coisa nenhuma! O mundo real me dá engulho. Hoje, vou falar da Luluzinha e da sua turminha animada: Bola, Glória, Alvinho, Carequinha, Plínio Raposo, Aninha, Vovô Fracolino e até a bruxa Neméia.

 

Conheci-os nos anos 50, quando eu tinha uns treze anos, e eles começaram a ser editados no Brasil pela Editora O Cruzeiro, em edição mensal (mal) impressa em cores, o que não era comum nos gibis da época. As histórias eram identificadas como sendo de Marge, que só algum tempo depois fiquei sabendo tratar-se de Marjorie Henderson Buell. Fiquei sabendo também que os desenhos, assim como os argumentos, eram, na verdade, de John Stanley, mais tarde auxiliado por Irving Tripp. Naquele tempo, não se costumava creditar os roteiristas nem os desenhistas, só os criadores.

 

Stanley, que já trabalhara com animação no Fleischer Studios e contribuíra para a Mickey Mouse Magazine, é tido como o “pai” de Lulu. Até o gorducho Bolinha (Tubby, no original) foi meio que batizado por ele, uma vez que apareceu poucas vezes nas charges assinadas por Marge e com o nome de Joe. Todos os outros personagens, como Alvinho (Alvin James), Aninha (Annie Inch), Carequinha (Iggy Inch), Carlinhos (Chubby), Alcéia (Ol’ Witch Hazel), Meméia (Little Itch), Glória (Gloria Darling), Plínio Raposo (Wilber Van Snobbe), Dona Marocas (Miss Feeny), Seu Miguel (Clarence McNabben) e tantos outros foram criações memoráveis do genial Stanley, à cuja criatividade deve-se, sem dúvida, o notável sucesso editorial de Luluzinha nos quadrinhos.

 

O cenário das historietas é o cotidiano familiar e o da turminha do bairro, com suas alegrias ingênuas, suas pequeníssimas “tragédias” e as artes da garotada de uma época em que se era feliz e nem se desconfiava. Sem falar da existência de um misterioso Clube dos Meninos, onde as meninas não podiam entrar e se mordiam de raiva por isso.

 

Little Lulu, como conta Otacílio d’Assunção Barros, o Ota, ex-editor nacional de Mad – que conheci quando era pouco mais de um menino, estagiário de Adolfo Aizen, na velha Ebal do Rio de Janeiro –, foi lançada em 23 de fevereiro de1935, inicialmente em forma de cartum semanal na revista Saturday Evening Post. O editor precisava de um substituto para Henry (no Brasil, batizado de Pinduca e Carequinha), de Carl Anderson, que se transferira para o King Features Syndicate. E Lulu foi uma mão-na-roda. Em forma de revista, a jornada começou em 1945, em Four Color Comics, da Western Printing, braço editorial da Dell Comics, depois de uma passagem pelo cinema, em uma série de 26 desenhos animados, produzidos pela Paramount, de 1943 a 1947. Depois, chegaria também à televisão. Revista própria Lulu recebeu em janeiro- fevereiro de 1948, um mês depois foi promovida a publicação mensal.

 

Menininha inteligente, criativa e com espírito-nato de liderança; cabelos encaracolados, vestidinho e boina vermelhos, calcinha branca e sapatos marrons, Luluzinha é a precursora da Mônica, de Maurício de Sousa, claramente inspirada na estrelinha de Marge. Hoje, ela seria uma senhora de quase 80 anos, como Mônica é uma cinquentona. Ambas, porém, continuam conservando aquele corpinho de oito aninhos. Milagre dos deuses de papel.

 

De julho de1955 a 1972, a revista Luluzinha foi publicada pelos Diários Associados, de Assis Chateaubriand. Em 1974, ressurgiu através da Editora Abril, em formatinho, com mais de 200 edições, até 1995. Em 2006, a Editora Devir lançou alguns álbuns esparsos, em preto e branco, até que os direitos foram adquiridos pela Pixel Media, que transformou a personagem em uma adolescente. As histórias clássicas começaram a ser reeditadas em 2011.

 

Marjorie Henderson, a partir de 1945, passou apenas a supervisionar o licenciamento de seus personagens, entregues a Stanley. Mas fazia questão de aprovar pessoalmente todas as histórias. Sempre gostou do que viu. Com uma única exceção: em 1950, vetou integralmente uma historia do Bicho- Papão, que achou assustadora demais para as crianças. Coisa da época. A aventura censurada, aliás, encerra a edição nº 1 dos clássicos da Pixel, impressa em preto e branco, já que nunca foi colorizada. Em 1972, a totalidade dos direitos da personagem foi vendida para a Western; hoje, pertence à DreamWorks Classics. Marjorie faleceu em 1993, aos 88 anos; John, em novembro do mesmo ano, com 79 anos.

 

Luluzinha – Primeiras Histórias (formato 17 x 24 cm, 128 páginas, R$ 16,90) já está em sua terceira edição, embora a primeira só tenha chegado aqui na semana retrasada. A distribuição é da Ghignone e deve ser setorizada. Presenteei minha neta Fernanda, de oito anos, com esse álbum da Lulu. Oxalá ele tenha o poder de afastá-la dos iPhones, iPads, iPods e de outras maldições semelhantes desta triste era digital!…

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