8:33Bode velho, capim novo

por JamurJr

 

Na mocidade foi um verdadeiro atleta, forte, disposto, bom remador e namorador de muitos méritos. Trabalhava com o pai durante a semana num engenho de beneficiamento de arroz. No sábado costumava visitar uma namorada no fundo da baía. Remava várias horas para chegar ao porto onde era esperado pela amada. Quando o vento soprava a favor e a maré estava em regime de enchente, colocava uma vela que fazia a embarcação deslizar suave e mais rápido pelas águas tranquilas. Cumpria esse percurso toda a semana para ficar apenas algumas horas ao lado dela, sempre sob a vigilância permanente do pai.

 

O namoro, além de vigiado de perto, era programado e seguia um ritual que se repetia semanalmente. Todas as tentativas de fuga para o fundo do quintal ou para ver a cachoeira no rio que passava na propriedade eram frustradas com o olhar atento do pai. Um passeio nos arredores, sem pegar na mão, jantar com a família e retorno, remando mais um longo tempo até chegar na vila onde morava. Saía sempre na mesma hora para aproveitar a maré vazante e chegar mais cedo em casa.

 

Teve uma juventude saudável, animada por muitas namoradas, e finalmente um casamento que durou muitos anos e produziu uma família numerosa e unida.

 

Aos 92 anos de idade, viúvo, seu João vivia sozinho em sua pequena e humilde casa em Guaratuba. Apesar da idade, continuava a gostar de um bom namoro, especialmente com “umas gurias novas”. Pagava pela companhia feminina com presentes e algumas vezes com algum dinheiro. Recebia aposentadoria do governo e sabia dosar as despesas de maneira que não faltasse dinheiro para manter a despensa abastecida e as moças agradecidas.

 

Tinha duas de sua preferência, que freqüentemente estavam juntas para encontros meio secretos. Meio, porque os vizinhos percebiam a movimentação e o riso fácil das animadas moças.

 

Uma noite fizeram barulho excessivo. As moças beberam demais e resolveram dançar e promover uma grande bagunça na casa do velho remador. Um vizinho incomodado com as gargalhadas que revelavam uma grande farra, decidiu chamar a polícia. Dois policias militares, guiados pela determinação de cumprir a missão de prender, mesmo sem claramente qualificar o tipo de ocorrência, conduziram o alegre trio até a Delegacia de Polícia.

 

O delegado mandou que as duas moças entrassem em sua sala, onde estava o escrivão de plantão, e começou a fazer perguntas, iniciando pela identificação. Ambas tinham aparência de muito jovens e se comportavam de maneira estranha ao lado de um homem idoso.

 

– Quantos anos você tem, moça?

– Tenho 25.

– E você?

– Eu, 26.

– As duas estão sendo acusadas de estar promovendo orgia sexual com perturbação do sossego dos vizinhos. Sabem?

-Sei, não, doutor.

– Pois fique sabendo que por causa disso todos vocês vão passar a noite no xadrez.

– Que é isso, doutor! A gente só estava se divertindo um pouquinho.

 

Na continuidade o delegado chamou o homem. O experiente policial ficou com cara de quem encontra um fantasma, ao ver o acusado à sua frente. Durante algum tempo permaneceu olhando incrédulo para aquela figura pequena, com um leve sorriso animando um rosto marcado por rugas e pequenas manchas que o tempo plantou. Era baixo, meio encurvado, olhar líquido, braços finos. Na cabeça, um boné velho, lembrança da última campanha para vereador na cidade. Vestia bermudão e camisa regata, deixando a mostra os sinais do tempo.

 

– Seu nome, cidadão?

– Me chamo João, mas sou conhecido como Jango.

-Qual é sua idade?

– Eu, tenho 92 anos.

– Com essa idade e fazendo farra com duas mocinhas?

– Não era farra, não, doutor delegado. A gente estava um pouco alegre antes de chegar nos finalmente.

– Que finalmente é esse?

– O senhor sabe, né? Quem é que não gosta?

– O senhor pode sair. Escrivão rasgue o BO e vamos soltar todos eles. Isso não é caso de prisão, é caso de homenagem.

 

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