6:50Sem respeito não tem jeito

por Célio Heitor Guimarães

 

Escrever para o público não é tarefa fácil. Ao contrário, muitas vezes é atividade das mais penosas, que desgasta e desgosta quem escreve. Sobretudo porque nunca se sabe qual será a reação do leitor. Alguns apreciam o que leem, outros odeiam o que foi escrito, e uma boa parte – mas boa mesmo – não entende o que leu.

 

Há leitores que dizem passar direto quando trato de política e de políticos. Minha mulher tem opinião mais ou menos idêntica, embora – talvez mais por cortesia ao marido – leia e comente o texto, acrescentando sempre uma palavra de incentivo. Ou preocupação.

 

Outros membros do seleto Clube dos 15 – universo de leitores destes comentários, como se sabe –, chateiam-se quando derivo para temas mais palatáveis ou familiares, tais como a ventura de ser avô e desfrutar dos ensinamentos dos netos, ou as crianças cristal, que estão chegando para reconstruir este mundo antes que o destruamos por inteiro. Afirmam que, nessas ocasiões, desrespeito a minha natureza – o que, certamente, não é verdade.

 

Agora, difícil mesmo é enfrentar aqueles que leem e não entendem nada, extraem do escrito o que ele não contém, vislumbram nas entrelinhas fantasmas inexistentes, tiram conclusões precipitadas e malham o redator. Usar de ironia, então – já disse o Luís Fernando Veríssimo –, é um perigo, passível de agressão física se o autor estiver ao alcance da mão do leitor. E a culpa será do colunista, que não foi capaz de se fazer entender.

 

No blog é ainda pior, porque tem também aqueles que se escondem atrás de pseudônimo idiotas (os “cagões”, na opinião mais direta e certeira do leitor Márcio Augusto) e, na falta de argumento, baixam o nível do debate. Paciência, cada um só pode dar o que tem.

 

Semanas atrás, aproveitando o imbróglio da importação de médicos cubanos pela diligente “presidenta” Dilma e a reserva de um deles para a Lapa, minha cidade natal, acabei atiçando a ira da prefeita local, que viu na provocação terrível discriminação às mulheres e racismo. Um dos seus seguidores, por seu turno, deduziu ser eu um desempregado. Felizmente não acrescentou que eu estaria procurando uma colocação na prefeitura da Lapa.

 

Quem saiu ganhando no episódio? Ninguém, por certo. Esse tipo de debate quase sempre não chega a lugar algum. E amola os demais leitores – o que é péssimo para todos.

 

Rubem Alves, o meu filósofo, escritor e colunista favorito, já enfrentou o problema. Diz que escrever lhe traz grande felicidade, recebe cartas e e-mails de crianças, jovens e adultos, dizendo que as coisas que ele escreve lhes dão prazer e os ajudam a viver. Mas também confessa que às vezes, a mesma escrita lhe traz grande infelicidade. E justifica: “Isso porque há pessoas que, sem ter respeito pelo escritor e por aquilo que ele escreveu, se dedicam não só a destruir o texto literário como também destruir o próprio escritor”.

 

Entre o colunista e o leitor deveria existir só fraternidade. Não é preciso estar-se de acordo. Mas, com certeza, ganharemos todos se concordarmos com a opinião do Rubem: “Fora do amor e do respeito não há salvação”.

 

Zé Beto, o titular deste blog, prevê que eu e dona Leila Klenk ainda poderemos ser bons amigos. Normalmente ele é certeiro em suas afirmações/deduções. Se ela estiver de acordo e amar a velha Lapa como eu amo, de minha parte, não haverá nenhuma objeção.

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5 ideias sobre “Sem respeito não tem jeito

  1. Glauber Rock

    “Não concordo com nada do que dizes, mas morro pelo seu direito de dizê-las.”

    RA Filósofo????? Na minha humilde opinião ele é um escritor de livro de auto ajuda e dos bons.

    Ser filósofo e estar sempre fazendo pergunta a sua mente, filósofo não tem respostas a dar. Filosofia não é receita de bolo. Agora, Célio vc não escreve como um filósofo, vc é opinativo, daí os contrários atacam. Lembre-se que: “Só sei, que nada sei” – Sócrates.

    hehehehe

    Desculpa a risada, mas nem de longe uma pessoa formada em filosofia é um filósofo!!

    Honestamente, eu conheço pessoas formadas em filosofia que não conhecem nem o estoicismo… Ou pior, aqueles que já leram muita filosofia, conhecem todas as ‘correntes filosóficas’, no entanto nunca conseguiram ter um pensamento próprio, uma opinião pessoal sobre qualquer coisa do que leu… Aprender sobre filosofia é uma coisa, ser um filósofo é outra muitoooooooo diferente… Mas deixa pra lá…

    Olha só, na minha concepção e não no que ditam os livros, filósofo é um curioso nato, um insatisfeito, alguém que está em constante busca pela razão das coisas que o cercam, sobre o ser, o existir…

    Filósofo é aquele que “estuda” a mente humana, sua reações, suas emoções, sua relação com o mundo, com os outros seres humanos, com a vida…

    Filósofo é acima de tudo um ser pensante, alguém que pensa por si mesmo. Que não se curva às doutrinas que lhe são impostas como certas, mas que busca dentro de si, a formação de suas próprias ideias, aquela que vem a ser a sua própria filosofia…

  2. Glauber Rock

    “Não concordo com nada do que dizes, mas morro pelo seu direito de dizê-las.” – Voltaire

    Célio, na minha opinião vc quando escreve é um doutrinador.

  3. Miguel

    Até acho possível que voce venha a ser bom amigo da Prefeita, mas com toda sinceridade? Só depois dela pedir desculpas pela forma como tratou a vossa pessoa, razão de uma opinião, que não merecia tanta cólera.

  4. Franco

    Mas há vida inteligente na Internet ?
    Também me espanta situações como essa. Que tipo de gente acessa, lê e – principalmente – comenta artigos da Internet ? Não digo os comentários anônimos dos grandes portais, em que se pode ter uma ideia da imbecilidade humana em três cliques… Mas sim de sites que, em tese, são frequentados por gente mais instruída…
    É de se espantar o baixo nível, mesmo considerando que grande parte dos leitores não se dispõe a comentar artigos, e que essa grande parte pode ser dividida entre “não comento nada porque não entendi muito bem e não estou mesmo interessado” e “não comento porque não vejo futuro e nem tenho paciência para discussões de Internet”.
    Além do exemplo da Exma. Prefeita da Lapa, há muitos outros… Dia desses, um site de literatura trouxe um texto muito interessante, onde o autor fazia uma brincadeira sobre o autor e os personagens de “Chaves” (isso mesmo, o clássico seriado mexicano), relacionando o enredo à céu, inferno, anjos e demônios. Texto muito bem feito, mas com nítido caráter de graça descompromissada.
    O que aconteceu nos comentários ? O óbvio: a maioria levou a sério a correlação entre Roberto Bolaños e Sartre e entre Nhônho e o demônio Mamon…
    E olha que são leitores de um site sobre literatura…
    Há vida inteligente na Internet? Se há, é minoria ? Devemos nos preocupar com as críticas dos internautas ? Alguém que lê entende? Quantos ? Quantos ???

  5. Mauricio Simões

    Amigo Célio,

    Há anos sigo uma fórmula que tem funcionado muito bem.
    Escreva sem procurar por apreciação. Sem censura, sem medo, sem restrições.
    Escreva o que você pensa, seja como opinião ou desabafo.
    Impossível agradar a “gregos e baianos”.
    No final, quem tem personalidade e a expressa em palavras, está correndo o delicioso risco de desagradar a todos.
    E qual o problema? Está à procura de novos amigos? Besteira. Isso vem naturalmente.
    Precisa de uma massagem no ego? Escrever verdades não é o melhor caminho.
    Não vincule elogios à sua felicidade. É um grave erro!
    Sua experiência já deve ter lhe mostrado que é nas críticas donde se extrai o mais proveitoso.
    Mesmo a dos “cagões agressivos”, ainda que apenas sirvam como combustível para novos textos críticos.
    Desencane, meu velho amigo! Continue sendo a exceção, pois da regra já estamos de saco cheio!

    Grande abraço,
    Mauricio

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