9:48PARA NUNCA ESQUECER

Philip Roth foi atrás de Philip Roth em um dos seus livros porque estava em crise e queria conhecer o impostor que se fazia passar por ele, escritor, inclusive em Israel. Na ficção, Philip Roth, o original, estava atravessando uma crise depressiva tão profunda que o leitor sentia todas as dores, a impossibilidade da vida, o aniquilamento das cores, dos sentimentos, da vontade de se virar para cair da cama e se arrastar para ir ao banheiro fazer xixi depois de poucas horas de sono, único momento de alívio. Dizer que este Philip Roth, que hoje faz 80 anos e informou recentemente que não vai mais escrever, é o melhor escritor vivo, é daquelas bobagens que alimentam cadernos que não são mais culturais, apêndices de revistas de fofocas sobre celebridades. Escritores são os melhores para nós, humildes leitores, quando conseguem atravessar as defesas que nem conhecemos e nos falam do que saiu de lá de dentro das fortalezas deles – e o diálogo existe, mesmo e principalmente quando ele escreveu algo bem diferente do que chegou dentro da nossa casa particular, mas se fez a conversa e o entendimento. A isso chama-se arte. Roth pode escrever um parágrafo de vinte mil palavras, mas não cansa e é compreendido. Roth fala da vida, por isso há sexo, a essência, há revolta, amor, o choque dentro da tradição familiar, a ironia, o sarcasmo, a poesia. Roth não é um escritor judeu, como acaba de dizer. Roth também não é um escritor americano, como se rotula, apesar de todos os seus livros serem escritos a partir da sua Newark. Philip Roth é aquele amigo ali da esquina, aquele que não temos, e vem nos contar tudo o que está sentindo de uma forma tão clara que até as histórias malucas que usa para isso nós relevamos, porque o que importa é a essência. Para quem, sabe-se lá como, teve a sorte da “iniciação” com o Complexo de Portnoy, talvez seu livro mais famoso, acompanhá-lo ao longo dos anos, ir envelhecendo junto e entrar neste período da vida com o que ele escreveu ultimamente, é motivo de felicidade. Arte no encontro. Olhar as imagens acima, que registram períodos da vida do escritor, também permite descobertas e leituras das linhas do rosto. E o olhar… é olhar de quem sempre se procurou, porque esse é o motivo.

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2 ideias sobre “PARA NUNCA ESQUECER

  1. Ivan Schmidt

    Meu primeiro contato com Philip Roth (assim como milhares de leitores patrícios) deu-se no lançamento de Complexo de Portnoy, apenas um entre “muitos” livros famosos. Creio que todos os romances escritos por PR acabaram ficando famosos, pois um é melhor que o outro… basta conferir, pois quase toda a obra do grande sacana foi editada no Brasil.
    A meu ver, o melhor livro escrito pelo criador de Natan Zuckerman — personagem abundantemente autobiográfico — chama-se “Patrimônio” no qual contou a história real da morte do pai. É inesquecível.

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