6:32TRF na gaveta desde 2003

por Ivan Schmidt

A proposta de emenda constitucional (PEC 544/2002) autorizando a criação do Tribunal Regional Federal do Paraná (TRF-PR), sediado em Curitiba, foi aprovada pelo Senado da República, em grande parte pelo empenho do senador Osmar Dias na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), então presidida pelo amazonense Bernardo Cabral.

Em se tratando de questões dessa natureza, como é de praxe, Cabral também fez sua justa interferência e acabou incluindo na PEC a implantação da citada instância do judiciário federal em seu estado, o Amazonas. Aproveitando a deixa, parlamentares mineiros e baianos conseguiram incluir na lista Minas Gerais e Bahia. No final, a soma de tantos votos aprovou a medida com folga.

No ano seguinte (2003) a matéria foi encaminhada, segundo o rito interno do Congresso Nacional, à Câmara dos Deputados a fim de ser examinada também pelos deputados. Aí, sem que ninguém tenha tido a preocupação de produzir uma explicação plausível, a matéria foi simplesmente retirada da pauta.

Para quem não está acostumado, o que deputados ou senadores chamam de pauta é o conjunto de matérias em discussão em ambas as Casas (algumas prioritárias e outras nem tanto), e que para seguirem o curso normal até a aprovação ou rejeição, dependem das decisões tomadas, às vezes, pelos líderes partidários, ou quando não, pela vontade pessoal dos presidentes das mesas executivas. São esses personagens, em última análise, que decidem as matérias que entram na ordem do dia, ou seja, aquilo que efetivamente será discutido e votado em plenário.

Especula-se desde então que a bancada governista do Rio Grande do Sul foi pressionada pela cúpula do Tribunal Regional Federal do referido estado, ao qual o Paraná está jurisdicionado, injuriada com a perda de uma clientela cativa de grande expressão quantitativa. Pois é, a imensa burocracia dos serviços públicos nacionais impõe que pessoas físicas ou jurídicas estabelecidas no Paraná sejam obrigadas a se deslocar (ou mandar seus representantes legais) para Porto Alegre, sempre que se requer a necessidade de defender interesses particulares.

A chamada justiça federal de segunda instância está concentrada em cinco tribunais regionais criados há mais de duas décadas. Não é necessário lembrar, como nas demais situações afetas ao Poder Judiciário, o abarrotamento de processos protocolados ano a ano nos respectivos tribunais. Somente para citar uma dessas instâncias, o Tribunal Superior do Trabalho (TST), segundo o ex-presidente João Oreste Dalazen, recebe uma carga de dois milhões de novos processos trabalhistas por ano.

Em manifestação recente da Associação Comercial do Paraná (ACP) sobre a questão, uma das entidades de classe que ocupa posição de vanguarda nessa e outras reivindicações, diz-se que “aumentar o número de desembargadores é promover o aumento geométrico das estruturas existentes, com consequente elevação de custo para o erário”, sendo a solução mais proficiente a implantação de outros Tribunais Regionais Federais. Com tal providência, argumenta-se “a prestação jurisdicional resultará aprimorada, bem como será mais econômica ao País e àqueles que necessitam de Justiça”.

É óbvio que a instalação de novos tribunais, como o do Paraná, também exigirá despesas por parte do erário, pois afinal ele precisará de espaço físico, móveis e sofisticados equipamentos de comunicação e informática, entre outros, além de grande número de servidores de vários níveis, dos desembargadores aos porteiros, sabendo-se que tudo isso custa muito dinheiro. E bota dinheiro nisso!

Contudo, é preciso lembrar que a Justiça Federal já tem alguma estrutura física e pessoal em Curitiba, de modo que não seria justo (nem verdadeiro) alegar dificuldades na adaptação e mesmo na ampliação do quadro de servidores e dos espaços apropriados ao funcionamento do tribunal regional.

Por outro lado, torna-se impossível escamotear a verdade insofismável da agilidade da prestação jurisdicional e da economia resultante aos cidadãos (empresários ou não) que batem às portas dos tribunais.

Basta lembrar que não poucos cidadãos paranaenses são obrigados a viajar a Porto Alegre a fim de resolver pendengas com a Justiça Federal, quando poderiam fazê-lo tranquilamente em Curitiba, inclusive com a diminuição dos gastos para os residentes em cidades do interior. Não há nem o que reclamar da inclusão dos estados de Santa Catarina e Mato Grosso do Sul na jurisdição do tribunal sediado no Paraná, sob a advertência racional de que as vantagens para os paranaenses passariam a onerar catarinenses e mato-grossenses do sul.

Também não resiste à análise a surrada desculpa da falta de recursos no Tesouro. A mentira repetida pelo governo desde os dias de Cunhambebe foi desmoralizada por reportagem publicada no último domingo (3) pelo jornal O Estado de S. Paulo, na qual se lê que entre 2003 e 2012 os partidos políticos brasileiros custaram aos cofres públicos a bagatela de R$ 6,8 bilhões, em subsídio para a propaganda eleitoral e para o Fundo Partidário. O custo de manutenção da enxurrada de legendas pagaria sete vezes a reforma do Maracanã para a Copa do Mundo.

O Estadão chegou às raias do patético ao calcular que o último programa de 10 minutos exibido pelo PMDB em rede nacional de rádio e televisão, sugou do bolso dos contribuintes exatos R$ 2,1 milhões. “Só os 43 segundos que o peemedebista Renan Calheiros (AL) utilizou para destacar sua ‘vontade de acertar’ na presidência do Senado, cargo para o qual foi eleito neste ano, representaram um baque de R$ 152 mil nos cofres públicos”, escreveu Daniel Bramatti, autor da matéria.

A palavra subsídio, nesse contexto, deve ser entendida como o benefício fiscal que a Receita Federal calcula com base na elevação dos custos da publicidade comercial, e concede a cada emissora de rádio e TV pela cessão do espaço destinado à propaganda eleitoral gratuita. Gratuita para quem?, prezadíssimo leitor, você está careca de saber. Imaginemos o volume desse saco de bondades ao final de 2013, quando “a propaganda dos partidos terá invadido o rádio e a televisão em 59 noites, sempre às quintas-feiras, na forma de programas de cinco ou dez minutos”, fora os 20 minutos por semestre distribuídos entre os maiores partidos, divididos em inserções de 30 segundos ou um minuto.

No ano passado as legendas mais importantes (creio que a palavra não é bem essa) embolsaram R$ 892,4 milhões do Orçamento Geral da União. Do PT (R$ 134,4 milhões) ao PRB (16,4 milhões), as burras de PMDB, PSDB, PSD, PR, PDT, DEM, PTB, PSB, PSOL, PV, PPS, PP, PSC e PCdoB, levaram quase R$ 1 bilhão da grana arrecadada pela insaciável máquina federal. Café pequeno para quem botou a mão em R$ 1,5 trilhão, mas arruma um monte de desculpas para procrastinar a implantação de um tribunal federal num dos estados que mais contribui para a riqueza nacional.

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Uma ideia sobre “TRF na gaveta desde 2003

  1. Lori

    lendo esse texto me lembrei que no Japão são abertos apenas 1.500 processos trabalhistas por ano. (no Brasil são abertos 2.000.000 de processos) É pra se pensar, não???

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