18:52Material antipoético

por Pedro Juan Gutiérrez

O panorama deste verão é desolador
abundam as baratas
as moscas e guasasas* da merda
o fedor do lixo podre
e do esgoto derramado nas ruas
os ratos pequenos / dizem
que também há ratazanas enormes
Há avisos / vacina grátis
contra leptospirose
No Malecón um edifício se inclinou
como a Torre de Pisa
e a gente saiu fugida
Agora uns homens o derrubam
com muito cuidado / pedra por pedra
Porque pode desabar e enterrar os vizinhos
Enfim o panorama é pavoroso
sob o sol e o calor
A cidade antipoética
Nicanor Parra teria que visitá-la
Gente cansada e de mau humor Bêbados
sentados nas calçadas esperando o nada
E os poetas em baixa

Não há nada belo que cantar
uma desgraça para os poetas
Tudo é merda
Assim é impossível escrever poesia nutritiva
poesia alimentícia
poesia que faça exclamar
as damas sensíveis
oh, que grande poeta estupendo é um clássico!
Não / nada disso
A vida antipoética ganha terreno
e estabelece cabeças de praia
em cada coraçãozinho que consegue alcançar
E eu desgraçadamente
não posso olhar sozinho o mar
O mar salvador azul
O eterno belíssimo brilhante mar.

*Em Cuba, mosca pequena que vive em enxames em lugares úmidos e escuros.

*Tradução de Paulo Sandrini

*Poema do livro Yo y una lujuriosa negra vieja.

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Uma ideia sobre “Material antipoético

  1. Abismado

    Zé, sou teu leitor há muito tempo, admiro teu bom senso e queria saber qual tua opinião sobre o vergonhoso caderno publicado hoje pela Gazeta do Povo sobre o papa Bento XVI. O papa, como qualquer ser humano, teve seus erros e acertos. Não vem ao caso. O que me espanta é que a Gazeta tenha abandonado suas credenciais jornalísticas e feito algo que beira a propaganda explícita. Nada de ouvir o outro lado, o contradito, os inúmeros críticos do papa, ou tocar a fundo na questão das perseguições a religiosos contrários, às mensagens de desamor aos gays, o silêncio em relação à Aids, às mulheres que morrem em abortos clandestinos. Não ouviu ninguém da teologia da libertação, nenhum crítico, nada. A Gazeta, obviamente, tem todo o direito de publicar o que quer, elogiar quem quer, pois vivemos em uma democracia. Mas estará sendo honesta com seus leitores, profissionais e anunciantes ao chamar isso de jornalismo? Não deveria deixar claro que é abertamente a favor de tudo o que a igreja dita e que opta por não trazer à tona, de forma sincera, suas contradições e erros? Fica o meu desabafo.

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