8:14Com medo de avião

por Sergio Brandão

Ultimamente nada me deixa tão perto da morte como andar de avião. Nem o diagnóstico de câncer há um ano e meio me deixou tão assustado. O câncer consome aos poucos e a morte num acidente de avião pode acontecer em no máximo alguns minutos. A sensação de impotência, de estar lá em cima e a partir da decolagem nada mais pode ser feito, me consome. Não gosto desta sensação de não ter outra alternativa, se não apenas torcer.
A coisa se agravou em setembro e outubro, quando voei todo fim de semana. As vezes em pequenas aeronaves e poucas vezes em grandes. Alguns sustos e procedimentos emergenciais que não conhecia foram determinates. De quase todos não gostei.
Em um dos voos o comando da aeronave era separada dos passageiros por uma cortina. A saudação do comandante foi feita ao mesmo tempo que dividia os passageiros por peso, segundo ele procedimento normal, apenas para equilibrar as coisas. Não confiei muito na balança que usou, apenas avaliando as pessoas no olho e jogando um pra lá, outro pra cá. Me desesperei mesmo quando uma moça, atrás de mim diz, “ai meu Deus, nunca vi isso”! Como eu também não tinha visto nada igual, olhei assustado para ela que me assustando mais ainda diz: “ você sabe rezar”, pergunta ela. Sorrio como se tudo aquilo fosse uma grande bobagem. Como este voo foram vários. Pelo menos três vezes com a mesma companhia da cortina que separa a cabine dos mortais. É, porque os caras lá de dentro se comportam com tanta naturalidade que parecem saber como fazer para não morrer em caso de acidente.
Falando sério, foram uns oito ou 10 voos assim, durante dois meses. Não consigo nem pensar numa viagem de dez ou doze horas, coisa que já fiz, mas hoje acho que não faria mais.
Ainda não alcanço a loucura de gente que trata destas coisas com naturalidade. Até Chico Xavier, uma das pessoas mais equilibradas de que tenho notícia, perdeu a compostura numa grande turbulência. Não venha me dizer que você não tem medo de avião. Isso não é possível depois que você vê o diabo de cuecas, como dizia meu pai.
Outro dia a Globo reprisou uma entrevista do Walmor Chagas. Ele falava sobre vida e morte. No meio da conversa diz que gostaria de morrer num desastre de avião. O olho dele vidrou quando disse isso. Pensei, maluco a ponto de fazer o que fez, se suicidando.
Conheço casos de gente que tem motivos de sobra pra nunca mais entrar num avião. Em um caso específico, o cara virou piloto. Também o classifico como maluco.
Curitiba tem helicóptero demais para o meu gosto. Tá ficando igual a São Paulo. Todos os dias, a qualquer hora tem um sobrevoando minha cabeça. Isso aumenta a probabilidade de um deles cair em cima de mim.
Tudo bem, eu sei que as estatísticas dizem que é mais fácil morrer num acidente de carro do que num acidente de avião. Eu também pensava assim e levava isso em conta. É que você só vai me entender quando ficar dois meses voando como voei. Não te desejo isso, não.

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2 ideias sobre “Com medo de avião

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