9:17Velozes e furiosos no trânsito brasileiro

por Claudio Henrique de Castro*

Interessante a recente propaganda do Renault Fluence protagonizada pelo ator Paul Walker da série “Velozes e Furiosos”(1). Durante aproximadamente três segundos aparece a mensagem em letras minúsculas: “Respeite os limites de velocidade”.

Logo adiante, depois da fusão dos veículos, um Fórmula 1 e o veículo dirigido pelo ator, aparece a mensagem: “Em um esportivo inspirado nas pistas.”

Na peça publicitária tem-se a associação com virilidade, força, glamour e, a nosso ver, potência e velocidade. As cenas se passam num autódromo sem os engarrafamentos e a lentidão do trânsito das grandes cidades brasileiras.

No livro “Fé em Deus e Pé na tábua”, o antropólogo Roberto Damatta analisa o comportamento social do brasileiro no trânsito e conclui que o carro é um dos principais instrumentos de status e opressão – e o trânsito cada vez mais caótico e violento (2).

O choque dos dois veículos da propaganda transforma-se numa fantasia onde surge um terceiro carro, o que é anunciado pela marca. Os dois veículos antes de se fundirem estão em altas velocidades.

Neste cenário perguntamos: o que está por trás das propagandas de veículos? O que, afinal, esperamos dos veículos brasileiros e seus reflexos no aumento ou diminuição dos acidentes de trânsito?

Como as propagandas conduzem os desejos das pessoas no imaginário do consumo, o desejo da velocidade, normalmente proibido, ganha um espaço lúdico no oferecimento dos bens de consumo e,  assim, a sociedade caminha, traduzindo suas inquietações e angústias na transgressão.

Não seria o momento de questionarmos eticamente as propagandas brasileiras? Afinal, elas oferecem um estilo de vida, valores e maneiras de se comportar que afetam todos nós, direta ou indiretamente.

De que adiantam as campanhas educativas, pagas com dinheiro público, para que os condutores respeitem a legislação de trânsito e trafeguem dentro dos limites de velocidade?

*Advogado e professor de Direito

Notas

(1) http://pipocamoderna.com.br/ator-de-velozes-e-furiosos-estrela-nova-campanha-da-

renault/218343?utm_source=rss

(2) http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-71832012000100021&script=sci_arttext

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6 ideias sobre “Velozes e furiosos no trânsito brasileiro

  1. Coronel Perseu Jacutingassa

    O que dizer de um povo que prefere ter um carro novo ao invés de uma casa melhor? O que dizer de um governo que incentiva a compra “a perder de vista” de carros novos ? O que dizer do fato de nossa industria automobilistica estar com padrões de segurança defasados 20 anos em relação à Europa e EUA ? Experimente andar nos bairros aos domingos, e observe o tanto de carros estacionados nas ruas (porque os prédios não tenm garagens suficientes)…
    Nesse país é ofensa mortal vc dizer que o carro do cara não presta…

  2. Raul Urban

    O anúncio mencionado pelo leitor, do Renault Fluence, não é o único que extrapola os ditames básicos do Código de Trânsito Brasileiro. A fusão do Fluence com um veículo de competição, e que resulta num aparente ingênuo Fluence “branco-virgem” – enaltecido pela capacidade de ser veloz etc etc, é similar a outra propagandaq de veículo. Edesta vez, se não me engano, o Amarok, da VW. Depois de cometer “diabruras” no que parece ser um campo desabitado, subindo encostas e por aí vai, surge, na última cena, vindo de não se sabe onde, no asfalto de uma estrada vazia – pretensamente para não haver acidente. Ou seja: ao “rabear”, espalhando terra para todos os lados, o que demonstraria a tal “virilidade”, o Amarok, que é, por si só, uma pick-up que faz lembrar as antigas pick-ups montadas pela Chrysler no Brasil. Agora, convenhamos: fica muito feio o carro sair do nada, e com uma pirueta seguir pelo asfalto, sujando-o com restos de terra, provavelmente a80 ou mais quilômetros por hora. Concordo: está mesmo na hora de revisar os anúncios veiculados de carros, como foi feito com outros produtos. A “virilidade mecânica” é coisa que o brasileiro “engolia” nos anos 60 ou 70. O Código existe para ser respeitado – e não deturpado. Afinal, todo motorista que atrás do volante parece valente e ultrapassa os cânones legais, deve se cuidar em dobro: afinal, ele é, antes de tudo, um pedestre. Imagina sendo atropelado!!

  3. Luiz Carlos Amado Nunes

    Caríssimo,
    Há alguns anos fui convidado para entrevista coletiva do presidente mundial da Mercedes, por ocasião de lançamento de veículo.
    Na mesma, ele informou que percorreu o Brasil com o veículo (um SUV – Jipão), que tinha uma série de air-bags; freios com ABS/EBD, e que nunca extrapolou o limite de velocidade de 110km/h, em algumas rodovias, conforme a legislação de trânsito permitia.
    No entanto, segundo comentário do próprio, ele nunca viu tanta barbeiragem, desrespeito, excesso de velocidade e desvio de conduta de motoristas dirigindo carros com um mínimo de acessórios de segurança, em seus potentes 1.0.
    Coisas do Brasil!
    Luiz Carlos Amado Nunes, diretor do Jornal Uberaba News, de Curitiba

  4. Zangado

    Esse tipo de consideração profundamente pertinente e oportuna não tem o mais mínimo interesse às “indústrias de multas de trânsito” implantadas nos Detran da vida por este país afora, movidos a servidores comissionados – principalmente nas Unidades Jurídica que indeferem sob o argumento da “presunção de legalidade” defesas e recursos por batelada – e que fazem a vontade do patrão de ocasião para encher as burras da entidade com dinheiro do contribuinte – infrator potencialmente interessante sob todos os aspectos – sem se preocupar com a prevenção e educação no trânsito, em especial, com esses exemplos de propaganda enganosa e detrimentosa aos princípios da cidadania no trânsito.

    Mas agora temos o Felipão e o Parreira na seleção, tudo mais é perfunctório …

  5. antonio carlos

    Peço-lhe venia caro Claudio Henrique para discordar do seu ponto-de-vista, mas com ou sem propaganda continuaremos a nos matar no trânsito. No que temos que mudar? Óbvio está que é nas leis, leis frias como esta da Lei Seca, que só é aplicada por gente que não bebe, e odeia bebida. Quem de nós ainda não desrespeitou a tal Lei? Volta e meia vemos “otoridades” dando carteirada para fugir do flagrante. E daí, fica tudo do mesmo jeito, abre-se inquérito, multa-se, perdem-se os tais pontos na carteira, como se isto importasse para os bebuns. O que fazer então? Mudar a Lei, as Leis, sem isto vamos continuar nos matando no trânsito. Com ou sem propaganda. ACarlos

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