por José Maria Correia
Certa vez, há mais de vinte anos, em uma das minhas muitas jornadas, participei de um encontro de dinâmica de grupo.
Chamava-se O PROCESSO e era conduzido por um renomado psicanalista, professor da Unicamp, o Dr. Simão.
O objetivo era o autoconhecimento.
Simão, já falecido, era também um filósofo e mestre em Sufismo – portanto, um guru.
Reunímo-nos, vários amigos, em um ambiente isolado destinado a retiros espirituais.
As práticas exaustivas começavam nas primeiras horas da manhã e duravam o dia todo. Simão nos ensinou a praticar a regressão, não para outras vidas, mas para esta mesmo.
Com técnicas de meditação e oxigenando o cérebro, em completo isolamento e orientados cientificamente,conseguíamos alcançar a memória mais profunda.
Cheguei em estado de semi hipnose até a me reencontrar com o pai e a mãe no quarto onde estava meu berço. Lembrei das cores, da juventude de ambos, do amor e do carinho; e felizmente gravei essas imagens em minha memória até hoje e para sempre , espero.
Com Simão, um a um revi os eventos importantes de minha infância: a primeira comunhão, a formatura no primário, os brinquedos preferidos e tudo que foi no passado remoto importante para mim, como em um antigo álbum de fotografias ou um filme em oito milímetros.
Mas o mais impactante aconteceu já no encerramento.
Em uma tarde ensolarada, O Dia em que Morri.
O mestre Simão me fez mergulhar em um profundo estado de concentração, me tomou pela mão e saímos caminhando por um campo florido e deserto.
Chegando em uma planície, encontramos uma pequena cruz muito simples -e lá estavam minhas iniciais J.M.
Sentamo-nos na relva e Simão disse com gravidade: “Este é um encontro antecipado com a sua sepultura”. Em seguida me deu um caderno para ler e se foi, mandando que eu aguardasse o retorno.
Li com preocupação. A orientação era para que eu, ali em total solidão, recordasse toda a minha vida e visualizasse as pessoas que iriam me fazer a última visita e que anotasse a reação de cada um.
Ali fiquei por horas, a tarde toda. Fui anotando, me emocionando sempre. Quando chegou a última página, havia outra orientação: que eu escrevesse tudo que tive oportunidade de fazer e desisti por falta de ousadia, de iniciativa, de desprendimento ou por medo das críticas sociais.
Simão somente retornou no crepúsculo. Chegou com as estrelas que surgiam na noite clara , de lua cheia. Abraçou-me fraternalmente.
Voltamos em silêncio pela pradaria.
Eu tinha anotado tudo, minhas frustrações, os limites que nunca existiram, mas que eu construíra para me proteger, os desejos irrealizados e os nomes dos que haviam estado naquela relva e na planície para o último adeus.
Não esqueci de nada, as filhas, mulher, amigos, amigas, falsos amigos e indiferentes e os que compareceram por obrigação para cumprir um ritual.
Chegando ao retiro, entramos em uma sala que estava com as luzes apagadas e onde eu nada enxergava. Ainda estava muito cansado das emoções.
De repente as luzes foram acesas, a sala estava cheia dos colegas do PROCESSO e no centro havia uma mesa de aniversário de criança igual àquelas que a mãe preparava para mim e da forma que eu havia descrito dias antes para o Simão, sem saber do objetivo.
O Simão me colocou no centro e todos começaram a cantar o parabéns. Não era a minha data, mas havia muitos docinhos, refrigerantes e um bolo.
O mestre então me disse: “Esta festa é para você que acabou de voltar de um sepultamento que adiamos, mas agora com a oportunidade de refazer tudo que deveria ter feito e não fez, de corrigir as trajetórias enquanto ainda é tempo, já que eu passara a me conhecer em profundidade.
Não consegui conter as lágrimas em meio aos abraços dos amigos e amigas.
Eu poderia e deveria passar a viver segundo os meus verdadeiros critérios e não sob o de outros, os preconceitos e os condicionamentos adquiridos.
Simão me deu naquela tarde inesquecível – e por isso a rememoro agora, algo que nunca esperei receber.
UMA SEGUNDA VIDA
Uma vida para ser vivida em plenitude, com intensidade, sem amarras e somente com os meus desígnios, minhas pretensas loucuras, riscos, paixões e insensatez.
E assim tenho feito tão certo de que, como o Guru Simão se foi, é que não terei uma terceira vida.
E com essa mesmo, rota, ferida, entusiasmada, poética, angustiada e desafiadora é que persisto e prossigo, já liberto e solto, dando pouca importância às críticas e aos juízos de valor que tanto me preocupavam. Sigo simples como uma folha no ar e até o dia que tudo que docemente recordei se apague inevitavelmente e se torne esquecimento no eterno.
Franz Kafka ta incorporando no Zé Maria…
Da licença Zebeto hihihihihihihihihi
José Maria, vem ai sim a terceira vida. Aguarde a 5ª dimensão…
Texto interessante que demonstra que podemos e devemos recomeçar sempre, suprimindo ou enfrentando nossos medos. Todos os dias é um novo recomeço, o que precisamos é nos desprender do passado, tarefa dificílima para muitos.
Informando que com Requião, Zé Maria viveu o Inferno de Dante.
Você vai ser prefeito de Matinhos em 3012, já foi o pior de sua história até hoje.
Zé Beto ficou doido com o seu professor Requião.
Obrigado mas em 3012 já tenho compromisso agendado abc JM