6:53Escrito sobre uma derrota

por Ivan Schmidt

Antes de mais nada permitam-me reivindicar o direito autoral de uma tese que nenhum cientista político ou estudioso do comportamento partidário, ao menos em Curitiba, formulou até este momento. A tese é a seguinte: quem teria sido capaz de afirmar que mais ou menos trinta anos depois, um dos milhares de migrantes que vieram para Curitiba nas grandes levas da década de 80, estaria disputando a prefeitura municipal, com reais possibilidades de vencer as eleições no segundo turno?

Foi o que ocorreu em Curitiba com a vitória convincente do candidato Ratinho Junior depois de manter-se em primeiro lugar nas pesquisas durante todo o mês de setembro. Na verdade, a maior surpresa da eleição curitibana não se revelou na indicação do primeiro e segundo colocados, mas no inesperado (e agora motivo de infinitas explicações) tropeço do prefeito Luciano Ducci, que sempre esteve no segundo lugar, mas seria inapelavelmente ultrapassado nas últimas horas antes da abertura das seções eleitorais pelo candidato Gustavo Fruet.

Ducci manteve o segundo lugar até a liberação da pesquisa boca de urna realizada pelo Ibope, ao que se disse, com quatro mil eleitores convidados a reproduzir o voto a pedido dos entrevistadores. Contudo, quando o TRE liberou o primeiro boletim com cerca de 45% das urnas apuradas, quem aparecia em segundo lugar era Gustavo, que aí permaneceria com uma pertinácia de fera ferida até a apuração do último voto.

A diferença entre Gustavo e Luciano foi de apenas 4,4 mil votos e configurou uma das facetas mais sensacionais do pleito de 2012 em todo o país.

A propósito, não houve da parte do Ibope nenhum esclarecimento razoável sobre a reação de Gustavo Fruet (que acreditava nela piamente e a revelou após votar). O mais próximo da realidade foi a admissão de que – provavelmente – os dados da pesquisa foram repassados de forma equivocada aos questionários, embora permaneça a impressão de que o argumento é absurdamente primário. Correu também a informação de que o próprio instituto enfrentou dificuldades para contratar o número adequado de entrevistadores para a boca de urna, embora isso seja igualmente duvidoso em se tratando de instituição especializada na atividade. Aliás, todos os institutos que pesquisaram em Curitiba não conseguiram detectar o crescimento da intenção de votos em Gustavo Fruet, mas nem por isso apresentaram suas razões.

Passada a euforia, o primeiro passo de ambos os candidatos foi sair em busca de apoios. O espólio do PMDB submetido ao comando autoritário do senador Roberto Requião, sem ouvir o candidato Rafael  Greca, anunciou apoio a Ratinho Junior. Greca limitou-se a informar que ainda iria conversar com os candidatos para, então, anunciar sua decisão pessoal. Uma questão pertinente que se levanta diz respeito à expressiva soma de votos obtida por Rafael, transformando-o num cobiçado fiel da balança do pleito de 28 de outubro.

A constatação remete para um novo ângulo a ser examinado com a máxima atenção: a quem pertencem realmente os votos dados ao ex-prefeito? A ele próprio, político com bom recall até pelo seu estilo peculiar de se comunicar, ou ao PMDB que lhe inscreveu como candidato a prefeito? Há quem se aventure a voltar algumas páginas na história recente das eleições em Curitiba, para perceber que o antigo partido-ônibus, depois da eleição do próprio Requião e da  campanha de Maurício Fruet para eleger-se pelo voto direto, sempre colheu pífios resultados.

Assim, é inteiramente justo esperar que se respeite a opinião pessoal de Greca sobre qual dos candidatos tem sua preferência e, com enorme expectativa, se essa decisão terá guarida e, em que proporção, entre os cem mil cidadãos que votaram no irmão Waldomiro.

O prefeito Luciano Ducci que já declinou a opção pela neutralidade, promete concluir o mandato cuidando do imenso programa de obras da prefeitura, muito embora nos recônditos desvãos da estrutura governamental, onde sempre pululam os “luas pretas” como bem observou o jornalista Celso Nascimento, já se contabilize as perdas do lançamento de um candidato duro de carregar, sem o menor apelo carismático e, ainda, com flagrante dificuldade de se fazer entender do ponto de vista da arte da política.

O grande problema é que na derrota dificilmente alguém se dispõe a assumir a responsabilidade pelos erros, com a recíproca imensamente díspar na vitória.

Como o momento é pródigo, os especuladores se encheram de razão para determinar que o governo está visivelmente inclinado na direção de Ratinho Junior. Faz sentido, porque o tratamento dispensado por este mesmo grupo a Gustavo Fruet, um dos quadros mais importantes do tucanato local constrangido a romper com o partido, reviveu a prática dos antigos capitães do mato. E agora um reencontro forçado seria uma atroz demonstração de oportunismo. É bom lembrar também que os eleitores não mais se deixam embair pelo pernóstico discurso dos que se arrogam o direito de controlar o destino da massa e, a esta altura, já traçaram seu rumo.

O líder municipal do DEM, deputado Osmar Bertoldi, revelou que o partido estará com Gustavo no segundo turno, configurando a primeira defecção na coligação de Ducci. O também deputado Elio Rush declarou tratar-se de ato isolado de Bertoldi, que não falou em nome do partido, presumindo-se que o DEM prefere a sombra e água fresca que são a paga da fidelidade à batuta do governador. Mas o quid pro quo demista tornou-se inevitável.

Tanto Gustavo quanto Luciano foram bem na zona norte, bairros com predominância de famílias das classes A e B, ao passo que Ratinho Junior confirmou seu cabedal na zona sul, especialmente nos bairros novos, nos quais residem famílias das classes C e D. É óbvio que os articuladores da campanha de Fruet farão um esforço especial para conquistar parcelas consideráveis dos eleitores de Ducci, além de reforçar suas estratégias para falar também aos sentimentos deste eleitorado sem compromisso ou envolvimento com  a política tradicional da cidade.

Junior, como é tratado na intimidade, está ciente que o discurso para o segundo turno precisa de urgentes e novos enfoques, mesmo que tenha revelado nas entrevistas de domingo à noite “que adversário não se escolhe, se enfrenta”. Não tenho dúvida que tudo estava montado para continuar fustigando Luciano Ducci, pois ninguém contava com a falta de fôlego do candidato situacionista.

A propaganda eleitoral eletrônica, o desempenho nos debates, sabatinas e entrevistas, enfim, o corpo a corpo com o eleitor, estão agora para os candidatos como a gorduchinha quicando na pequena área diante do artilheiro do time. Que muitas vezes manda a bola às nuvens!

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8 ideias sobre “Escrito sobre uma derrota

  1. Polyana

    Sumesmo, Ivan Schimigt. Teu recuo e sapiência desvendou o que ninguém quer perceber: a Curitiba do Tauquara, da zona Sul. Do além paróquia. Gente que se identifica com a tagetória do Ratinho pai. Vota no filho polido do palhaço que conquistou na garra e talento uma fortuna consideravel, sem mandar dinheiro para Suiça ou outro paraiso social, pois seu paraiso conquistado é esse onde o maior orgulho é dar emprego e a mesma oportunidade à niguenzada que toca a econômia atual. Que toca o que sobra da meia duzia de ricos a lhes excluirem e só lhes procurarem em tempos de eleição.
    Por essa e outras, Fruet nnao tem tempo, originalidade nem iciativa ( éum bananão!) de reverter esse jogo. Seria falso. Ainda mais junto à turma do mnsalão e rifando as eleições ao Governo em 2014. Gustavo Fruet é um bom menino mas nnao herdou a verve do pai Mauricio. Indeciso, se sentir vontade defazer xixi e lhe aparecerem dois banheiros à frente, se mija nas calças.
    Sinto muito, mas um cara que só decide se casar pra ser prefeito, não é uma pessoa determinada o suficiente para tocar uma cidade. Fique no legislativo, investigando mensalões, mas nunca juntando-se aos a;gozes, como agora esta fazendo. Curitiba quer o fio do bigode. Quer pé de macacos que arregacem as mangas, sem preconceito.

  2. jeremias, o bom

    Gostei de sua análise e acrescentaria o ineditismo da presente disputa: nenhum dos candidatos está comprometido com a situação ou com o grupo político que comanda a Prefeitura ou o Governo.

    Acredito que a crítica mera e simples deverá ser amplamente substituída pela campanha propositiva. A cansativa dicotomia situação versus oposição sairá do cardápio.

    Metrô, trânsito, educação infantil, saúde pública, segurança, todos os temas deverão ser arejados por novas propostas e não pelo mero requentamento do que já existe.

  3. lauro

    Como é engraçado ver a opinião de leigos. Desconhece que o Datafolha de sábado mostrava Gustavo 49 x Ducci 39 na projeção de segundo turno, o que carimbava a virada do Fruet sobre o prefeito. O primeiro boletim do TRE foi com 2% das urnas; o segundo com 12%; o terceiro com 23%, todos com Gustavo na frente,e o analista acha que só soube da virada com o boletim de 45%. Analista de resultado definido, e bem equivocado.

  4. Maria

    Que absurdo esse comentário da Polyana. Só pode ter o rabo preso com o pessoal do Ratinho Junior para falar mal assim do Fruet.

    Dizer que o Fruet é um banana e indeciso é inacreditável! Se ele fosse isso que você diz ele não teria trocado de partido por discordar do governador! O Gustavo Fruet se encheu da hipocrisia do PSDB e se mandou de lá… se ele fosse indeciso e banana, ele teria ficado lá quietinho e apoiaria o Ducci.

    Mas não! Ele quer o melhor para Curitiba e por isso tomou partido e está aí demonstrando que é o candidato mais preparado.

    Sobre seus comentários sobre o casamento do Gustavo Fruet eu não vou nem comentar, isso é tão baixo que me deu nojo!

  5. Carlinhos

    Poly junte-se a Ana e vá procurar a sua turma. Você é que deve estar indecisa, caiu do caminhão de mudança do “sem voto” e não sabe em quem votar.

  6. Solda

    Isso mesmo, Ivan. Se um cachoro morde um homem, não é notícia. Mas se um homem morder um cachorro, é manchete.

    Tchans!

  7. CARLOS HEDUARDO BATALHA

    Polyana, sua opinião foi medíocre e mostra profundo desconhecimento da política. Primeiramente, qual emprego que o pai do RAtinho deu para o pessoal da região sul?! O Ratinho usa estas pessoas para enriquecer, expondo-as ao rídiculo e sensacionalizando seus problemas e sentimentos. A atuação parlamentar do Gustavo Frueto demonstra claramente que nunca foi indeciso ao contrário, foi firme e coerente em todas as suas posturas e decisões. Votou contra a CPMF, contra o aumento do salário dos deputados, pela diminuição do número de vereadores!´Para o Gustavo melhorar a educação não é dar uniforme escolar, até por que ele sabe que a educação transforma pessoas, e coloca políticos oportunistas no escanteio! Cada um vota em quem merece, mas ignorância neste blog não! Ninguém aqui é otário!

  8. Ulisses Iarochinski

    Meus caros,
    dias atrás postei no Facebook, comentário a um post do prof. Helio Puglieli, de que a divisão de votos, entre os 4 principais candidatos entre Norte e Sul carecia da minha análise.
    Quem votou no Ratinho foi principalmente o migrante trazido por Doático e Requião à força e pelos iludidos do Lerner com suas indústrias automobílisticas. Ou seja, os novos “curitibanos” da zonal 175 que compreende Boqueirão, Alto Boqueirão, Jardim Paranaense, Sítio Cercado, Xaxim, Bairro Novo (250 mil novos habitantes), Pinheirinho e invasões e conjuntos da Cohab na Cidade Industrial (que era para ter só indústrias, aliás) votaram em peso no Ratinho e nas “obras” a toque de caixa do Ducci.
    Ao contrário do que o redator da Gazeta escreveu, a zonal 177, que deu 36% de votos para o Fruet (primeiro colocado da zonal 177) não tem só Batel e EcoVille, pois ela começa na Água Verde, passa pelo Batel, Bigorilho, Campina do Siqueira, Mossunguê, Santo Inácio, São Braz e Órleãns… ou seja por curitibanos (e descendentes de colonos italianos, ucranianos e polacos). E esta porção da cidade não tem só milionários, tem pobres e humildes curitibanos, que conhecem a história da cidade. Assim, os marqueteiros deveriam se debruçar, não entre ricos e pobres, mas entre os curitibanos da gema e os novos curitibanos (migrantes). Resta saber se os migrantes são em maior número que os curitibanos.

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