6:30Quadrinho com alma africana

André Diniz (ao centro, em auto-retrato) e sua arte

por Célio Heitor Guimarães

Um talento se consolida no país. E põe talento nisso! André Diniz, carioca criado em Santa Tereza, 37 anos, casado com Marcela e pai de Lia, é uma das grandes revelações dos quadrinhos nacionais nos últimos tempos. Descobri-o na internet, no site Nona Arte, onde ele postava a sua arte. Depois, reencontrei-o em álbuns impressos, presentes nas boas casas do ramo, em uma produção que surpreende inclusive pela quantidade.

André Diniz (Fernandes) é um escritor, roteirista, desenhista e ilustrador de mão cheia. Tem estilo próprio e sabe como poucos conduzir a sua mensagem. Usa óculos, deve ser míope, mas enxerga longe. É branco, filho de pai potiguar e mãe mineira, mas tem o coração africano, como mostra a sua obra e o roteiro escrito para “7 Vidas” (Conrad Editora, 2009), ilustrado pelo curitibano Antonio Eder, onde narra as suas experiências em regressões a vidas passadas.

Nasceu nos fanzines, em 1994. Sozinho, escrevia e desenhava em folhas de papel A4 e distribuía as suas histórias nas lojas de quadrinhos. 500 exemplares por edição. Às vezes, chegava às 3.000 cópias.

Em 2000, André criou a Editora Nona Arte, com o propósito de autopublicar os seus trabalhos e oferecer uma oportunidade aos novos artistas. E assim colocou no mercado, na forma impressa, “Fawcett”, “Subversivos”, “A Classe Média Agradece” e “31 de Fevereiro”. Em seguida, disponibilizou na rede centenas de histórias on-line ou download em arquivos PDF, com imagem de alta resolução, que podiam ser impressas. De 2000 a 2005, conquistou 15 prêmios, entre eles o Troféu HQ Mix de melhor editora de quadrinhos, três vezes de melhor roteirista e tetracampeão como o melhor site de quadrinhos. Em 2010, ganhou o HQ Mix de melhor roteirista pelos seus trabalhos de 2009, “7 Vidas” e “Ato 5”.

É nítida a influência do grande Flávio Colin, um dos maiores nomes dos gibis brasileiros, no traço de Diniz. Juntos, fizeram “Fawcett” (que foi relançado pela Devir Livraria). Não obstante, André conseguiu dar à sua arte características próprias, marcantes, únicas no universo nacional (quiçá internacional).

Acabo de ler “O Quilombo Orum Aiê” (Galera Record, 2009), que narra a busca do paraíso pelo moleque Vinícius “Capivara” e pela escrava Sinhana, “um lugar maravilhoso, onde não há guerras, injustiças ou doenças”, e fiquei emocionado. A trama é bem armada, o enquadramento cinematográfico e a arte refinada.

O próprio artista considera “Quilombo Orum Auê” um divisor de sua carreira. Em entrevista ao blog Pipoca e Nanquim, confessa que foi através dessa história que se encontrou como desenhista, “não só quanto ao desenho em si, mas também quanto ao processo de criação e execução de uma página de HQ”. E “O Quilombo…” foi selecionado para o PNBE – Programa Nacional Biblioteca da Escola, do governo federal.

Os mais recentes trabalhos de André Diniz confirmam a preferência do autor pela cultura afro-brasileira e a opção pelo traço artístico africano: “A História do Homem mais Velho do Mundo” (Galera, 2008), “Chico Rei” (Franco Editora, 2009), “A Cachoeira de Paulo Afonso” (adaptado do poema de Castro Alves – Editora Pallas, 2011), “Morro da Favela” (Leya/Barba Negra, 2011), “O Negrinho do Pastoreio” (Ygarapé, 2012) e “Mwindo” (Galera, 2012).

– A estilização do desenho africano tem muito com a minha forma de olhar, porque eu não sou de detectar sutilezas, prefiro as formas exageradas – confirmou a Marcelo Miranda, do site No Extracampo, revelando usar, também, a xilografia como referência.

A partir de “Mwindo” e “O Negrinho do Pastoreio”, a arte de André ganhou a colaboração da esposa Marcela Mannheimer, artista gráfica de primeira linha, que passou a colorir o trabalho do marido, dando-lhe uma graça especial.

De vez em quando, Diniz vem a Curitiba para um papo com os doidos por gibis destas paragens. Faz ponto no Itiban Comics Shop, do Xico e da Mitie. Agora, porém, acaba de chegar da Europa, aonde foi a convite da editora francesa Des Rond Dans I’O, que deverá publicar “Morro da Favela” na França. A mesma novela gráfica sairá em inglês na Inglaterra e nos EUA, pela editora Self MadeHero.

De quebra, André Diniz recebeu, no final de junho, mais dois troféus HQ Mix – o de melhor álbum nacional (“Morro da Favela”) e o de roteirista nacional, prêmio que já havia conquistado nos anos de 2004 e 2010.

Esse menino vai longe…

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