7:19Quando as santidades sentam no banco dos réus

por Célio Heitor Guimarães

Zé Dirceu, qual o santo padroeiro Luiz Inácio, não sabia de nada. Não mais participava do dia-a-dia do PT, afastara-se do partido e desconhecia o esquema clandestino de distribuição de recursos, denominado “mensalão”. Zé Genoino era o presidente do partido, mas não participava dos assuntos financeiros do PT nem tinha habilidade para tanto. Já Delúbio Soares, embora tesoureiro do partido, cuidou apenas de arrumar recursos para saldar as finanças do partido, através de empréstimos junto a instituições financeiras. Tudo dentro da legalidade, com alguns pequenos escorregões de caixa dois.

Quer dizer: ninguém prejudicou ninguém, ninguém corrompeu ninguém, ninguém distribuiu dinheiro a ninguém. Por isso, segundo o preclaro defensor de José Dirceu, ex-chefe da Casa Civil e ex-todo poderoso do governo Lula, ele é um injustiçado, cujo pedido de condenação “é o mais atrevido e escandaloso ataque à Constituição Federal”. Até porque, de acordo com o ínclito advogado de José Genoíno, a preocupação do zeloso dirigente partidário era apenas aparar as arestas e as divergências entre os aliados. Além do que, “a prova é pífia, esgarçada, rala e não se presta à condenação dos réus”, como sentencia o digno patrono do tesoureiro Delúbio. É certo que Delúbio errou, ao utilizar-se de caixa dois – aquiesceu o respeitado causídico –, mas fez ver que se trata de um ilícito ilicitinho. Avisa que “Delúbio não se furta a responder pelo que fez”. Mas, faz questão de asseverar: “Agora, ele não corrompeu ninguém!”. Sei.

Com o que concordou, de pronto, o perspicaz defensor do publicitário Marcos Valério: “Não houve o uso de dinheiro público nas operações. Os empréstimos foram regulares por conta de contratos de publicidade”.

Ou seja: Lula foi um precipitado irracional ao descer do trono, logo que o escândalo estourou, e pedir desculpas à nação, em nome do governo e do PT.

E quem deveria estar sentado no banco dos réus é o roliço procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que foi comparado, da tribuna do STF, pelo magnífico dr. Márcio Thomaz Bastos – “God”, segundo os colegas –, ao famigerado Osama Bin-Laden. O ex-ministro da Justiça de Lula quando o “mensalão” veio à luz, subiu à tribuna do STF para defender o banqueiro José Roberto Salgado e, do alto de sua (dele) sapiência, não fez por menos: “A denúncia do mensalão foi um ato terrorista”. Cadeia para o dr. Gurgel!

Pois é, curiosas são as estratégias de defesa dos homens de beca. Sei, de ver de perto, como isso funciona. Durante cerca de vinte anos, fui advogado com alguma militância. Quando perdi, de vez, a paciência com as sumidades de toga que nos julgam e com a estratégia de muitos bacharéis, encerrei o expediente, recolhi os meus trecos e tarecos, pedi desculpas aos colegas pelo meu jeito de ser e pelos meus excessos e fui para casa aproveitar os netos antes que eles crescessem de vez. Tinha uma tese explosiva, difícil de ser assimilada pela classe: todo mundo tem, sim, direito à defesa, mas nem por isso eu era obrigado a defender bandidos. Eles que procurassem os seus semelhantes. Até porque, na minha opinião capenga, advogado sério e decente, que ama de verdade a profissão e faz dela uma missão, quando defende bandido e/ou achacador do dinheiro público, muito mais do que patrono, se torna cúmplice.

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