de Jorge Amado*
Manhã vem chegando devagar, sonolenta; três quartos de hora de atraso, funcionária relapsa.
Demora-se entre as nuvens, preguiçosa, abre a custo os olhos sobre o campo, ai que vontade de dormir sem despertador, dormir até não ter mais sono!
Se lhe acontecer arranjar marido rico, a Manhã não mais acordará antes das onze e olhe lá.
Cortinas nas janelas para evitar a luz violenta, café servido na cama.
Sonhos de donzela casadoira, outra a realidade da vida, de uma funcionária subalterna, de rígidos horários.
Obrigada a acordar cedíssimo para apagar as estrela que a Noite acende com medo do escuro.
A Noite é uma apavorada, tem horror às trevas.
Com um beijo, a Manhã apaga cada estrela enquanto prossegue a caminhada em direção ao horizonte.
Semi-adormecida, bocejando, acontece-lhe esquecer algumas sem apagar.
Ficam as pobres acesas na claridade, tentando inutilmente brilhar durante o dia, uma tristeza.
*Texto publicado na abertura do livro “O Gato Malhado E A Andorinha Sinhá – uma história de amor”, escrito em 1948 para o filho João Jorge, no 1º aniversário