6:55As aparências enganam

por Ivan Schmidt

Escrevi dia desses sobre como se comportam, habitualmente, vereadores de capitais e grandes cidades (nas pequenas não deve ser diferente) e deputados estaduais, em números quase absolutos atraídos para a órbita de influência do executivo, a quem cabe a palavra definitiva sobre a distribuição de emendas ao orçamento e nomeações para os cobiçados cargos em comissão.

No momento em que batuco essas mal-traçadas (salve Stanislaw Ponte Preta!) leio nas folhas que o senador Blairo Maggi (PR) comunicava à nação estupefata que a bancada na Câmara Alta passava a formar um bloco com o PTB. Em outras palavras, isto quer dizer que o citado partido retornou à aliança governista, da qual havia debandado semanas antes por ter perdido o Ministério dos Transportes.

Maggi afirmou que o retorno do PR, sintomaticamente o R significa República, que é para nenhum enxerido duvidar dos altissonantes ideais do partido, acertado em tertúlia com a presidente Dilma Rousseff, não cogitou da devolução do comando do ministério. Como se percebe, a tal conversa ficará gravada nos anais da brasilidade como um dos exemplos mais perfeitos do descortino republicano.

Talvez esse patriótico desinteresse pelas lantejoulas do poder nos faça compreender, em parte, a recorrente atuação de detentores de mandatos legislativos.

Há uma ajuda extra na matéria assinada pelo repórter Sandro Moser na Gazeta do Povo da última terça-feira (3), analisando dados coletados pelo Instituto Paraná Pesquisas a pedido do próprio jornal, sobre o desempenho dos integrantes da Câmara Municipal de Curitiba. Para 42% dos eleitores curitibanos constitui um mistério a atividade dos vereadores, embora 59% deles achem que a função primordial do edil é levar recursos para os bairros. Contudo, 69% deles sequer sabem o nome do vereador eleito pelo bairro onde residem.

A pesquisa mostrou, ainda, que apenas 27% responderam que a primeira responsabilidade a ser cobrada dos vereadores é a fiscalização dos atos do prefeito e/ou administração municipal, sendo bem menos expressivo o percentual do eleitorado (14%) que apontou na produção de leis a função precípua (não a única) dos representantes do povo. Moser informou que o eleitor foi convidado a atribuir uma nota de zero a dez para avaliar o desempenho dos vereadores, ficando a média final em 4,7. Transcrevo a apreciação do autor da reportagem: “O índice expressa o alto grau de reprovação ao trabalho do Legislativo municipal, segundo os especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo”.

Mesmo os números aparentemente favoráveis aos vereadores, constatou Murilo Hidalgo, diretor do Instituto Paraná Pesquisas, referindo-se aos percentuais de 59% que esperam mais benefícios para os bairros e os 50% que enxergam o vereador como mero intermediário entre a população e a prefeitura, são “fruto da propaganda que os vereadores fazem do próprio trabalho”. Falando claramente, esses resultados otimistas decorrem do surrado hábito da promoção pessoal adubada por cartas, folhetos, cartazes, faixas e até mesmos jornais distribuídos pelos próprios interessados, mas pagos com o dinheiro do contribuinte, na divulgação de seus feitos. “É sinal que de que essa estratégia funciona”, declarou.

A opinião do cientista político Ricardo Oliveira, professor da UFPR, é ainda mais taxativa ao reconhecer que os números coletados pela pesquisa são um reflexo da “cultura política nacional em que o eleitor espera obras e clientelismo, em lugar do exercício legislativo propriamente dito”.

A suma do que se tem dito até aqui é de uma indigência desanimadora e, acima de tudo, a manifestação legítima do desprezo popular à atividade política, pois o que se quer é tão-somente o asfaltamento das esburacadas ruas do bairro, a desobstrução das valetas entulhadas de lixo ou um campinho de futebol para a garotada.

E quando isso acontece, pouco importa saber o nome de quem conseguiu as melhorias. Portanto, conclusões sobre inoperância e distanciamento das funções constitucionais reservadas aos vereadores não são fruto de elucubrações de gente que vê defeito em tudo. Felizmente com o auxílio do instrumental de uma investigação séria como a do Instituto Paraná Pesquisas as coisas ficam muito mais claras e insofismáveis. Não há ceticismo, por mais pernóstico, que consiga esconder a realidade.

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