9:37BOTEQUIM

de Newton Sampaio

     Era um botequim. Muito triste, muito desajeitado. Perdido lá no fim daquele beco de luzes tímidas. Enfurnado no bairro mais esquecido da cidade.
     Era um botequim. Triste, desajeitado, miserável. Bem como o rapaz de azul-escuro que ia entrando. Que ia entrando e pedindo um trago bem forte. O trago mais forte daquele comércio.
     O portuga amansou a bigodeira e procurou a garrafa que era branquinha. O trio da mesa do fundo se virou sem discrição. O casal do lado direito se beijocou publicamente. Ele pegou na coxa dela, ela soltou um palavrão, os dois soltaram uma gargalhada enorme que fez eco e mais parecia uma vontade de se amarem ali mesmo, só para divertir a vizinhança e matar de inveja o marinheiro de blusa encardida. O marinheiro fechou a cara, lembrou-se de quando esfaqueara um parceiro em qualquer porto sem importância do estrangeiro, afogou a raiva no copo de cerveja ordinária. Nem percebeu o agrado que lhe queria fazer um cachorrinho de cor inexplicável. O animal ficou mexendo o rabo, o qual era curto e quase sem pêlo. De repente tomou coragem, lambeu-lhe a perna, saltou-lhe ao colo. Foi a conta. O marinheiro descarregou nele o que desejaria jogar sobre o rival. Socos, pontapés, e substantivos obscenos. Como convém a marinheiros solteiros em noite de feriado nacional…
     Todos riram. Com exceção do portuga, por nobre prudência comercial. E do moço de azul-escuro, porque este tinha o pensamento muito longe. Tão longe que ia até saindo sem pagar a despesa. No que foi imediatamente impedido pela mesma prudência lusitana. Sentou-se outra vez, como represália à própria distração. E pediu mais um trago ainda mais carregado. O trago mais forte de todos os comércios.
     Pediu, enquanto o casal da direita se entortava todo nos assentos, para que as mãos peludas do homem continuassem a fazer viagens probididas…

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