6:51Na entressafra da notícia

por Ivan Schmidt

Na entressafra da notícia, com o legislativo em recesso e a maioria dos governos estaduais se preparando para enfrentar os encargos naturais do ano eleitoral, porquanto governo que se preza faz das tripas coração para ganhar nas capitais e principais municípios, os editores de política são os que mais sofrem na busca de boas matérias para alimentar seus espaços.

A mera impressão se transforma em realidade mediante a leitura do texto assinado pela experiente Vera Rosa no Estadão desta quinta-feira (12), analisando a sucessão municipal em algumas das capitais (São Paulo, Belo Horizonte, Recife, Salvador, Fortaleza e Porto Alegre), nas quais o governo central está muitíssimo interessado e realizando manobras até certo ponto escancaradas para selar acordos nada ortodoxos, já que a meta é ganhar as eleições.

E quando se lê que o governo manobra abertamente deve-se compreender que tal movimentação política nem sempre leva em consideração o desejo expresso do maior partido da aliança, afinal, o partido do próprio governo. Em algumas situações, como o Rio de Janeiro, que nem chegou a ser cogitado na análise de Vera Rosa, o PT como partido-chefe da aliança sequer aparece como interlocutor no processo de sucessão, tratado diretamente pelo governador Sérgio Cabral e prefeito Eduardo Paes, ambos do
PMDB. Pela primeira vez, em muitos anos, o PT não terá candidato próprio disputando a prefeitura municipal do Rio.

Há, porém, na conjuntura analisada, um caso isolado em que o PT não abre mão da cabeça de chapa, embora a decisão não conte com todas as bênçãos da direção partidária, tendo em vista que significa a preferência pessoal do ex-presidente Lula. Estou falando de São Paulo, a maior cidade da América do Sul e umas das maiores do mundo, cuja governança é um ponto de honra na programação política do PT, que, obviamente se consagraria na hora que elegesse o prefeito da cidade que representa, sem
a menor dúvida, a pujança do trabalhador brasileiro.

O candidato imposto por Lula ao PT é o ministro Fernando Haddad (Educação), que tem pouca história no PT e, pior, nenhuma experiência eleitoral. Sondagens internas no partido e algumas pesquisas mostraram que o petista com maior chance de ganhar é a senadora Marta Suplicy (que já foi prefeita), mas nem esse argumento foi suficiente para convencer o ex-presidente.

Por esse e outros motivos, figuras ligadas ao arco dos 14 partidos que formam a aliança governista no Congresso já se mostram preocupadas com a presença de Lula nos palanques, depois da cura do câncer que afeta sua laringe, algo em que todos acreditam piamente. Para alguns líderes partidários, Lula terá a força de um “canhão”, havendo os que se arrisquem a fazer quase uma predição segundo o texto de Vera Rosa: “Com a expectativa da cura de Lula, dirigentes de partidos governistas não têm dúvidas de
que ele se transformará numa espécie de ‘santo’ nos comícios”. E é exatamente esse o motivo que impele os líderes dos partidos da aliança a contar com a força de Lula em seus palanques, apesar da primazia petista.

Voltando a São Paulo, onde o PMDB fincou pé no próprio candidato, deputado Gabriel Chalita, que Lula procura atrair como candidato a vice-prefeito na chapa de Haddad. Em Belo Horizonte ocorre o contrário, pois Lula prega o apoio do PT ao atual prefeito Márcio Lacerda (PSB). No Recife, a solução do problema da sucessão municipal poderia levar ao sacrifício do atual prefeito João da Costa (PT), que deixaria de concorrer à reeleição para não dificultar a aliança com o governador Eduardo Campos, uma reserva eleitoral tratada com muita atenção pelo Planalto.

Em Curitiba e Porto Alegre o PT parece convencido pela direção nacional a apoiar candidatos do PDT, respectivamente, o ex-deputado Gustavo Fruet e o prefeito atual José Fortunati. No caso curitibano, é explícita a interveniência dos ministros Paulo Bernardo e Gleisi Hoffmann com relação ao apoio do partido a Gustavo Fruet, tendo em vista a recíproca na eleição para o governo estadual em 2014.

O risco é ver a repetição do episódio que acabou cortando a probabilidade real da eleição do então senador Osmar Dias ao governo, em 2010, que trocou o apoio de blocos político-empresariais mais conservadores pelo PT e a ponta de estoque do avariado brechó em que se transformou o PMDB, e se deu mal.

Gustavo tem lastro eleitoral próprio, mas não poderá esconder que até recentemente foi um dos críticos mais consequentes do governo Lula, destacando-se na CPI que acabou desnudando a maracutaia do mensalão, com o destemor que sempre caracterizou sua brilhante carreira. Poderia o ”santo Lula” suplantar essa diferença, caso aqui viesse, e operar o milagre da multiplicação dos votos, emulando a cena bíblica dos pães e peixes?

O problema é que em política muitos já viram até boi voar, mas nunca se soube que alguém andou sobre a água, fez um surdo ouvir ou um cego enxergar.

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2 ideias sobre “Na entressafra da notícia

  1. Rogério Piccoli

    A mídia e seus atuantes, quase sem exceção, querem inverter tudo. Ao invéz de somente reconhecerem a capacidade eleitoral que o Gustavo Fruet possui em Curitiba, independentemente de partido político, insistem em menosprezar essa realidade, a ponto de tão-somente considerar que sua candidatura é factível, a partir do apoio do partido do governo federal. Evidente que não. O PT e, obviamente, outras legendas partidárias, seja já no primeiro turno e ou num eventual segundo, não pensam em sair perdedores da disputa eleitoral. Por isso, não se fazem de rogados e, espertamente, juntam-se aos anseios da maioria da população curitibana que certamente elegerão Gustavo Fruet como prefeito de Curitiba. Afinal, nessa disputa que se avizinha, o que conta, acima de tudo, são as expectativas locais, a serem resolvidas para o bem dos moradores da própria cidade, nada tendo a ver com os confrontos partidários em nível naciional, sejam eles passados, presentes ou futuros. Por isso, considerando tal cenário, o Gustavo Fruet, com todo o seu conhecimento técnico e político de que é possuidor, será o “cara” politicamente correto para não somente dar um fim à mesmice que assola a administração municipal, como também para resgatar o brilho das coisas que possam orgulhar todo o cidadão curitibano.

  2. ricardo crovador

    Realmente é uma pena o PSDB ter sacaneado o Fruet. O partido, para defender o Derosso e “pagar” o apoio do Ducci, entregou de bandeja a prefeitura de Curitiba.
    Ou será que algum assessor incompetente buzinou na orelha do Richa que era perigoso deixar o Fruet crescer?
    Que asneira! Para ser presidente, o Beto tinha de, em primeiro lugar, demonstrar que é capaz, pelo menos, de disciplinar as forças de apoio dentro do seu estado. Vai ser muito difícil ganhar do Fruet.
    Aliás, ainda daria tempo do Governador criar um fato novo, arranjar um jeito de apoiar o PDT e evitar assim que o PT possa, mesmo que indiretamente, chegar perto da Prefeitura.

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