8:34O Mané tem razão

por Helio Teixeira 
 
Cena na agência do Banco do Brasil, em Praia de Leste, onde, como em todos os bancos das praias (e do resto do país), estava lotada. Um simpático Mané ostentando apenas os dois  paus verticais da arcada superior da antiga dentição, malemolente na camisa regata e bermuda meio palmo abaixo da barriga,
fez uma análise do ambiente. 

O cenário era  de elevador, torcida silenciosa pra turma da frente andar rápido. Todos fazendo figa  pro veinho não esquecer a senha e a dama de ancas largas e jeito, digamos, parcimonioso, saber que saque é tirar o capilé e não o Giba sacando na seleção de volei. Aquela tristeza que o Tezza, em algum dia de 2011, descreveu na Gazetona, como só ele sabe, sobre o que é uma fila.

Reconheça-se que o gerente da pequena agência era um mar de paciência, mas, experiente, recomendando “passa depois das 4 da tarde que isso aqui fica manero”. A senhora olhou pro maridão, vermelho que era um aço depois do sol das 11 da matina, e questionou:
– Getúlio, ele tem razão, mas o pescador da banca da praia aceita o Visa?
Getúlio foi gentil com a patroa:
– Isolda, o Visa chegará lá, por enquanto sem dinheiro não tem camarão do almoço.
E aí, meio irritadiço, desafiou Isolda:
– Te falei pra mandar o teu genro, mas você não quer que eu conte minha senha pra ele. Então, guente.
Isolda guentou.

Aí, dois inevitáveis aconteceram.

O veinho esqueceu a senha na hora de tirar a grana – e lamentou com aquele olhar que só os velho tem: “Que merda, esqueci”.

O piazão surfista era o da vez e atirou: ” Então se manda, porque o mar me espera”.

Ihhh, o piazão não havia olhado em volta para perceber que o mais novo na fila tinha uns cinquentinha nas costas e no bucho… E a tchurma reagiu: “Olha o respeito, vagabundo!”; “Você também vai ficar
velho!”. Saiu um fdp ali, um viado lá, um educado “Cadê o respeito?”. Piazão mergulhou no ostracismo da espuma da fila.

Como deve ter uns dez anos de 2 de janeiro à frente da turba em agências do BB, o gerentão pegou o simpático veinho e foi resolver o “x” da senha dele. Tudo parecia finalizar na boa, quando nosso malemolente com dois dentes na arquibancada superior resolveu exprimir sua compreensão do comportamento do bravo povo brasileiro e disse, com a força do pulmão de muitos cigarros:
 
– O brasileiro é uma merda, não se emenda, tudo sempre no último dia.
 
Esqueceu que era o primeiro dia de banco aberto do cognominado Ano Novo.  Foi o que bastou para o aposentado ostentando umas cinco faturas de contas nas mãos, brabo feito uma ganso de polaco, garantir também a pleno pulmão:
– Você é brasileiro, logo é também um merda e eu sou o próximo para chegar no caixa, enquanto você tá aí atrás.
 
Nosso Mané ajeitou a bemudão, mesmo sabendo que o umbigo não a seguraria, e decretou subserviente:
“Somos todos uns merdas!”

Pois é.

E da sexta economia do mundo. Imagine os primeirões!

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2 ideias sobre “O Mané tem razão

  1. Célio Heitor Guimarães

    Que prazer ler o Helio, um dos grandes textos deste país! Contrata ele rápido, grande ZB!

  2. Vania Mara Welte

    A sensibilidade do grande profissional e ser humano, Hélio Teixeira, permite que ele nos brinde com a beleza deste texto.

    Grata, amigo.

    Um 2012 Magnífico para você e sua família!

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