por Célio Heitor Guimarães
De vez em quando, volto ao assunto, em defesa dos desamparados: a maldição dos precatórios. Quem tem (ou já teve) a desgraça de ser credor da administração pública sabe do que falo. Para os que não sabem, explico uma vez mais: o denominado precatório requisitório é uma das práticas mais perversas da administração pública. Oficialmente, é a forma utilizada pela Fazenda Pública, estadual, municipal e federal, para quitar os seus débitos com os particulares, em virtude de decisão judicial. Na realidade, porém, é a maneira legal utilizada pela administração pública para procrastinar ao extremo o pagamento de suas dívidas, com prejuízos inestimáveis para os cidadãos credores. E tudo se torna pior ainda quando a autoridade pública toma decisões desastradas e o assunto cai nas mãos de burocratas incompetentes e
arrogantes.
Recapitulando os fatos: no apagar das luzes de 2009, o preclaro governo Lula, pseudo defensor dos pobres e oprimidos, deu à luz a Emenda Constitucional 62/2009. Ela ofereceu nova redação ao artigo 100 da Constituição Federal, criou os denominados “precatórios preferenciais”, privilegiando os velhinhos e doentes com o pagamento de uma mísera parcela líquida de quarenta mil pilas, e entregou a tarefa de quitação das dívidas ao Poder Judiciário, espargindo a confusão. Pior não poderia ter sido.
O PJ, que não peca pela celeridade, embasbacou-se ainda por cima. Não sabia como proceder, marcou reuniões, criou comissões, firmou convênios e acabou por constituir uma coordenadoria especializada para tratar da matéria.
Resultado: os credores do Estado que até então, bem ou mal, vinham recebendo seus créditos mensalmente, segundo listagens preparadas pela Fazenda estadual, a despeito de um atraso que chegava a dez anos, foram abandonados no porto sem nenhum navio à vista. Não obstante todos os meses seja transferido ao Judiciário pelo Executivo a bagatela de R$ 26 mi.
Quase dois anos depois, foram preparadas e pagas apenas oito listagens de “preferenciais” – uma nona está paralisada no setor “especializado” há quase seis meses, e só.
Minto: foram quitados, no decorrer do período, alguns precatórios comuns, não alimentares, por deferência dos gênios que compõem a coordenadoria especializada do TJ, que concluíram serem os grandes credores e as empreiteiras também filhos de Deus. Ainda que, para tanto, necessário fosse fazer vistas do art. 1º da própria EC 62, que reafirma a obrigatoriedade de pagamento dos precatórios exclusivamente na ordem cronológica de apresentação e a prevalência dos débitos de natureza alimentícia “sobre todos os demais créditos”.
Há ainda a necessidade de um novo acordo (ou coisa que o valha) entre os poderes Judiciário e Executivo para a solução de 50% da remessa de valores, que seriam destinados a uma espécie de leilão de créditos, mas que, se bom senso houvesse, poderiam destinar-se ao pagamento dos precatórios comuns,
emperrado no ano de 1996.
Só que tal medida exige ação e isso, como se sabe, não combina com as partes envolvidas. Afinal, faz só cerca de oito meses que se estuda o assunto.
Desgraçadamente, a administração do egrégio Tribunal de Justiça tem se mostrado despreparada para conduzir a questão. E nem o fato de, hoje, parte da assessoria presidencial também usar toga tem ajudado. Ao contrário, só procrastina as soluções. Magistrados, assessores, diretores e funcionários se
tornaram cultores da burocracia e da inaptidão administrativa. Lamentável.
Enquanto isso, o dinheiro vai sendo armazenado em caixa sob a responsabilidade do Judiciário e os credores vão morrendo (esta semana, soube-se do falecimento de dois deles), sem poder usufruir em vida o total do que lhes é devido por decisão judicial transitada em julgado há mais de uma década.
O surpreendente é que, na Praça N. S. de Salete, todos continuem dormindo tranquilamente o sono dos justos. E mais surpreendente e também lastimável é que a seção paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil não tenha ainda tomado as medidas cabíveis.
Revoltante, Célio. A solução, como sempre é ser simples. Acabar de vez com esses tais “precatórios” ou seja lá como chamam ou chamarem. Por Lei, inapelavelmente, sem conversa mole.
Se o Estado (munípio, estado, união, judiciário, MP) deve ao cidadão, tem que emitir imediatamente um crédito via bancária direto para a conta. Na hora, sem papo. Eletronicamente. Automaticamente, no dia da decisão, independente de A, B, C ou Z.
Se o órgão público não tem dinheiro em caixa, que empreste, peça crédito, se vire, entre no vermelho no banco. Qualquer outra coisa é sacanagem, é dar o calote, é não querer que nada funcione. É criar dificuldades para vender facilidades. É alimentar a malfadada “indústria dos precatórios” e a corrupção em todos os níveis.
E a OAB, que você chama às falas no final do texto, está muito feliz, gorda, pesada, rechonchuda e excessivamente estufada com o dinheiro das taxas que cobra (inclusive do tal absurdo “exame da ordem”) para pensar em algo que não seja gastar.
Só para complementar.
Esqueci de dizer que, se a indenização for resultado de uma cagada do governante, o Estado deverá tomar os bens do administrador público responsável e sua equipe.
Mas isso a posteriori, DEPOIS DO PAGAMENTO, para RESSARCIR os prejuízos aos cofres públicos e nunca para tentar arrumar dinheiro para pagar os cidadãos.
Preocupação de virginiano: onde se lê “deve”, na terceira linha do primeiro parágrafo, leia-se “teve”. Grato.
corrigido. abraço. saúde.