por Zé da Silva

Capricórnio

Olhou a capa do disco e nunca mais falou. Descobriu então que isso revelou um mundo de sons que jamais tinha prestado atenção. Não porque falasse demais. Era tímido. Mas as vozes internas o atormentavam ao ponto de fazer um descarrego e conversar com uma entidade no terreiro de umbanda. Ficou leve. Ouviu a voz que saía da boca do pai de santo dizer que algo aconteceria para iluminar sua alma. Agora ele sabia que aconteceu mesmo. Ficara leve naquele dia e o som dos atabaques o faziam dançar internamente. Estava leve. Nunca mais ouviu o tormento dele mesmo. E aí apareceu aquela foto com a moça negra fazendo o sinal que era um pedido, uma ordem divina. Ele ouviu o disco. Tinha uma música chamada Segredo e o cantor dizia em outra que veio da Bahia. João o nome. Sobrenome Gilberto. E aí todos os acordes fizeram sentido. Todas as letras de música. Ele passou a ouvir a melodia das poesias, dos textos de romances. E a Natureza. Ninguém percebeu que ele se calou. Mesmo porque era calado. Mas todos falaram que ele tinha um brilho diferente nos olhos, que agora pareciam pedras preciosas com o mar dentro, e que seu rosto era de uma paz contagiante. A paz do silêncio pedido pela moça da capa do disco.