17:13Doações de campanha: melhor não fazê-las

Do blog “Licitações e Fraudes” (http://licitacoesefraudes.com/) , de Caio Brandão:

Caminhar por essa praia é andar sem deixar pegadas.

A lógica da motivação das doações nas eleições, principalmente nas campanhas majoritárias, é sempre a mesma: uns doam, porque temem perdas; enquanto que outros doam, porque anseiam por benefícios. Alguns cedem mediante persuasão, ou em reconhecimento a favores passados, mas são poucos. A maioria fica mesmo é restrita à velha estória de que “é dando que se recebe”. Nessa linha, um apaniguado do velho Itamar, costumava orar com o fervor dos crentes, o verso da canção que dizia “cê mi insina a fazê renda, que eu ti insino a namorá”.  Desnecessário dizer que esse namorador deve ter feito muita renda, mas certamente  não ensinou ninguém a namorar.

O drama das campanhas majoritárias é o tamanho e o custo do seu aparato. Trata-se de uma grande empresa criada para existir durante  uns poucos meses, que terá que movimentar muitos milhões de reais em meio de controles precários e de organização absolutamente temerária. O produto  a ser vendido, para o grande público, será sempre a figura do candidato e o rol do seu ideário político e administrativo. Para os mais próximos existe, além desse mote, o apelo no tocante às ações futuras diretas, relativas aos setores que deverão receber as rubricas mais robustas voltadas para as compras, os investimentos e as obras públicas. E, é exatamente nesse nicho, que mora o perigo.

O sonho de todo doador é poder entregar na mão do candidato, direto e sem intermediário, uma soma em dinheiro vivo e com recibo. A seu turno, a esperança do candidato é poder contar com o seu caixa de campanha abarrotado e sequer tomar conhecimento dos doadores, com os quais ele não deseja firmar nenhum tipo de compromisso. Aliás, existe uma desproporção abismal entre a expectativa daquele que oferta e o reconhecimento de quem a recebe. O candidato, quando muito generoso e na sua concepção de gratidão, credita ao doador o obséquio de tratá-lo pelo nome, de tocar no seu ombro, de recebê-lo cordialmente em audiência, de fazer alguma promessa que certamente não irá cumprir, e de aceitar e de despachar pedidos, dentre outras formalidades.

No início do governo Itamar Franco, uma das primeiras providências da sua gestão foi a rescisão de centenas de contratos no âmbito do DER que, paralisados, se arrastavam há anos nos escaninhos daquele Departamento. Desnecessário dizer que ali se quedaram, atônitos, vários dos seus doadores de campanha.

Aliás, a vertente da ingratidão é vocação muito peculiar aos mineiros. Na Prefeitura de Contagem, por exemplo, o ainda cacique Newton Cardoso, hoje de baixa estatura, sempre cultivou o hábito de não pagar os empreiteiros de quem se dizia amigo, executores de obras naquela cidade.

No Paraná, o belicoso e exaltado Requião, que sobrevive combatente aguerrido, tem como estímulo de satisfação pessoal sacanear ( a palavra está nos dicionários ) os seus amigos mais chegados e a quem ele eventualmente  deve algum favor.

Assim, nesse meio lodoso e escorregadio, todos reclamam e ninguém tem razão.  A doação de campanha será sempre pequena para quem a recebe, e muito grande para quem a entrega. O doador, no seu imaginário, fará uma conta simples: para cada real que doar, ele vai querer receber 100 mil de volta. Ou seja, uma empreiteira de grande porte que doar, eventualmente, por exemplo, uns 8 milhões de reais divididos em parcelas, direto para a campanha, para a conta do Partido, pagando fornecedores de forma escamoteada e ainda ofertando algum valor em espécie, por baixo dos panos, vai querer tomar o controle das maiores estatais do Governo e executar a maioria das obras de grande porte a serem licitadas. Aliás, em se tratando de pagamento de fornecedores, as  vias mais comuns de crimes eleitorais passam  pelo pagamento feito a  gráficas ( são sempre as mesmas ), fornecedores de papel, locação de veículos, fretamento de aviões ou uso de aeronaves de empresas amigas, e agências de publicidade. Desnecessário lembrar que uma das maiores agências de publicidade do Brasil acabou se enrolando na “CPI do Mensalão” por ter recebido, em contas no Exterior,  pagamentos oriundos de campanhas políticas. As despesas com funcionários também pesam, mas parte do pessoal lotado nos comitês recebe direto de empresas alheias à campanha e a maioria sem contrato ou carteira de trabalho assinada.

Campanha, afinal, se faz com muito dinheiro e o ideal é que haja sobra. Esta, quando acontece, permite que o candidato eleito passe longo período pagando contas com dinheiro vivo e declarando, para o imposto de renda, que possui grandes somas de dinheiro vivo, em casa.

Assim, em meio dessas contradições, surge uma figura peculiar às campanhas políticas: a do intermediário entre o que doa e aquele que recebe. Existirá, sempre, nas campanhas, o elemento que se aproxima do candidato para dizer conhecer algum empresário sequioso por participar. O candidato, indisciplinado e ávido por ajuda, estará sempre pronto a liberar aquela figura para agir em prol das crescentes demandas da campanha. E, desta forma, grandes conglomerados serão abordados por pessoas sem credibilidade e, pior, por vários e diferentes intermediários, todos com “procuração” fidedigna do candidato e mediante a promessa de vigorosos e inauditos sortilégios durante o futuro governo. O estrago, nesse caso, será sempre irremediável.

Por coincidência, a revista Isto É desta semana traz, sob o título “Um tucano bom de bico”, matéria sobre “quem é e como agia o engenheiro Paulo Vieira de Souza, acusado por líderes do PSDB de ter arrecadado dinheiro de empresários em nome do partido e não entregá-lo para o caixa da campanha”. A matéria está assinada pelos jornalistas Sérgio Pardellas e Claudio Dantas Sequeira,  e diz, dentre outras informações, que : “Segundo oito dos principais líderes e parlamentares do PSDB ouvidos por Istoé, Souza, também conhecido como Paulo Preto ou Negão, teria arrecadado pelo menos R$4milhões para as campanhas eleitorais de 2010, mas os recursos não chegaram ao caixa do comitê do presidenciável José Serra. Como se trata de dinheiro sem origem declarada, o partido não tem sequer como mover um processo judicial”.

Mas, afinal, o pessoal que viu a sua doação bater asas para outros terreiros, não tem motivos para chorar. Não conheço o Serra e dele nada posso dizer. Contudo, a estória ensina, no geral, que doar pode não ser um bom negócio. Terminada a eleição a conta zera e a reaproximação com o eleito se transforma num “pau-de-sebo”. De pronto, o ex-candidato viaja para o Exterior. É claro que aquele feliz doador não estará no mesmo avião. Na belonave seguem apenas os “do peito”, ou, “do bolso”, aqueles que estão sempre a ocupar uma bocada na alta administração e fazem parte das preferências do eleito. Junto vão alguns raros empreiteiros, apenas os gigantes ( que se revezam falando com o candidato mal uns dos outros ), até mesmo para continuar a bancar algumas despesas rotineiras nessas dispendiosas viagens, o que é sempre um incômodo para quem não está acostumado a gastar o próprio dinheiro, que é ocaso do eleito e dos seus convidados..

Na volta ao Brasil o ego do eleito pode não caber no avião. Ele se enclausura para escolher o secretariado e listar, de pronto, os titulares dos cargos mais cobiçados. Dentre os escolhidos terão preferência os políticos ( ele quer se reeleger ), depois os parentes ( mesmo com a lei do nepotismo ), depois os amigos mais íntimos e finalmente os apaniguados. Isto é normal. A importância dos doadores de campanha, entretanto, está no epílogo e bem próxima do fim. O numero do telefone do eleito foi trocado a atende o aparelho um imbecil que sempre pergunta ao seu interlocutor se ele pode declinar o nome e o assunto. É nesse momento que o doador começa a perceber que a conta zerou no dia em que o candidato ganhou a eleição. O doador, então, vai ter que ralar de novo, começar outra vez, conquistar corações e mentes e, principalmente, bolsos, e ainda se esquivar da Polícia Federal com toda a sua parafernália de equipamentos de escuta, contornar o labirinto de normas do Banco Central relativas aos saques e remessas de dinheiros, dentre outras “perseguições”.  Enfim, doações, melhor não fazê-las!!!!!!!!!!!!!!!

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