de Zé da Silva
Leão
Sabia que a imagem estava lá. Sabia qual era a imagem. Lembrava até a hora que viu e fotografou. Mas, por algum motivo, a imagem ficou revelada apenas no negativo – nunca foi para o papel. Ele guardou todos os negativos numa caixa de papelão, em nas embalagens apropriadas. Trocou de casas várias vezes. Nas mudanças, levava apenas algumas roupas e a caixa. De vez em quando puxava um filme e olhava contra a luz do céu. Guardava. A modernidade digital chegou e ele guardando seu tesouro particular embaixo da cama, dentro de armário velho, enfim, guardando. Das centenas de imagens feitas, guardava apenas aquela na lembrança. Não sabia o motivo. Um dia acordou e ela lhe veio de novo à lembrança. Mandou colocar no papel. Era uma calçada com uma torneira que saía do cimento. Ao lado um pé de planta tinha a mesma altura. E flores pequenas. Embaixo, rachaduras no cimento se espraiavam. A foto era bela e árida. Aí descobriu que aquilo prenunciava sua vida.