16:51Nelson Tanure, o quebrador de jornais

por Norberto Staviski*

Exatamente um ano depois da Gazeta Mercantil circular com sua última edição e fechar definitivamente suas portas depois de 83 anos de existência, o empresário baiano Nelson Tanure comunicou oficialmente que o centenário
Jornal do Brasil vai deixar de circular e ficar somente com suas páginas na Web. Tanure um dia sonhou em ser um grande empresário de comunicação, mas vai é ficar marcado como o cara que mais prejudicou o setor. Especialista apenas em adquirir empresas quebradas para depois passá-las adiante, não teve talento para levantar tanto a Gazeta Mercantil como o Jornal do Brasil e contribuiu efetivamente para o seu final melancólico. Ressalve-se, no entanto, que parte da culpa da quebra de dois dos maiores e mais tradicionais veículos de comunicação do país também é da nossa legislação trabalhista que, entre multas e sentenças desenxabidas, deixou a Gazeta Mercantil com um passivo impagável de R$ 200 milhões. O total de dívidas do Jornal do Brasil ainda não se sabe, mas o desfecho destas ações todo mundo já sabe: muita pouca gente vai receber alguma coisa.


O mais triste de tudo isso é ver um exemplo do que de melhor já se produziu no jornalismo brasileiro simplesmente naufragar. O Jornal do Brasil, até a década de 80, era o nosso New York Times até na modelagem dos textos com
“lead” de no máximo cinco linhas. Independente, sem interferências dos proprietários, a Condessa Carneiro Pereira e sua família, o jornal tinha a melhor equipe e a melhor linha editorial do país. Se algum jornalista aparecia como promessa no mercado, o JB ia lá contratá-lo pagando sempre mais do que o dobro do que ele ganhava. E sempre inovava: criou o primeiro caderno de cultura do país – o Caderno B – e foi o primeiro jornal a ter uma editoria de economia, além de ter um projeto gráfico anos luz na frente de seus concorrentes como o Globo e Estadão. A Folha de São Paulo, muito atrelada ao regime militar da época, sequer existia como jornal. Problemas financeiros decorrentes de uma aventura de tentar ingressar no segmento de TV na época do governo Geisel fizeram com que o jornal começasse a soçobrar. Sua independência de certa maneira ameaçava a ditadura militar e o projeto de TV foi vetado por Geisel mas a dívida ficou. Enquanto isso, o Globo, que sempre esteve do lado da ditadura, passou a receber mais e mais ajuda e a crescer até ultrapassar o JB. Nos últimos anos, o Jornal do Brasil era apenas uma caricatura de veículo embora ainda assombrasse a mídia com alguns “furos” como o do mensalão, o qual foi o primeiro a denunciar. Mas era um jornal  meio sem cor, meio marrom e meio sério, um tipo de veículo em extinção no mundo por causa da Internet. Dizem que os jornais impressos vão desaparecer em 2043, mas aqui eles começaram a desaparecer bem antes disso por culpa de empresários como Tanure que, em realidade, não são assim tão diferentes dos Frias, Civitas, Marinho e dos Mesquita.  São empresas familiares que defendem seus interesses e seus jornalistas não defendem os fatos e sim a linha editorial proposta pelo patrão. Talvez, por isso, a circulação de jornais no Brasil tenha caído
tanto, a ponto da Folha de São Paulo ter uma tiragem de menos de 300 mil exemplares diários quando, em bons tempos de seriedade, saia com mais de 1 milhão. O leitor não é tão burro como acham os donos da mídia, me parece.
Para quem trabalhou no JB nos seus áureos tempos como eu, isso dói profundamente, mas acho que o fim de algum jornal em alguma parte do mundo será notícia corriqueira neste futuro próximo.

*Norberto Staviski é jornalista

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